Reforma tributária: Tributos são receitas que entram nos cofres dos entes para financiar políticas públicas, explica Maria Carolina Gontijo (Germano Lüders/Exame)
Diretora de tributos da Moore Brasil
Publicado em 19 de julho de 2023 às 11h13.
Última atualização em 19 de julho de 2023 às 11h29.
Eu queria escrever sobre a reforma tributária de uma maneira fácil de entender. Escrevi e apaguei uma dezena de vezes. Como explicar algo tão complexo, mas que ao mesmo tempo permeia o dia a dia de todos que moram aqui nesse país?
Falar de reforma é difícil. E não é porque a proposta é complexa, muito pelo contrário. Temos a primeira chance real de avançarmos em direção a um sistema mais moderno, mais transparente e, principalmente, mais simples. Então por que é tão difícil demonstrar para as pessoas o que todos ganharemos com esta reforma? A resposta é tão triste quanto simples: ninguém entende o sistema atual. Por que entenderiam a necessidade de reformá-lo?
Tributos são receitas que entram nos cofres dos entes para financiar políticas públicas. Só poderemos pensar em pagar menos quando tivermos (surpresa!) menos despesas. Então não, não adianta esperar da reforma tributária algo que ela não poderá proporcionar (a curto prazo). Cobre dos governantes uma reforma administrativa, uma reforma que racionalize os gastos do Estado. Vamos com uma analogia bem simples: suponhamos que você decidisse ganhar menos dinheiro todo mês. Mantendo as mesmas despesas, o que aconteceria? Exato. Com o Estado não é diferente.
Por inúmeros motivos, sendo o principal deles um lugar comum em todas as análises: vivemos um manicômio tributário. O bombom deixa de ser bombom pra pagar menos IPI. Aquele produto é loção embelezadora ou é desodorante? O STF em 2021 retirou a repercussão geral para sabermos se o pager (sim, o bipe) deveria pagar ISSQN ou ICMS. Fomos longe demais na loucura.
Hoje as empresas vivem um emaranhado de normas, decisões e interpretações. Tudo pode mudar (e invariavelmente muda sempre!).
Pagamos imposto sobre imposto, e o pior: sequer sabemos o que pagamos. Eu desafio qualquer um a encher um carrinho de supermercado e tentar imaginar quanto de tributo tem ali dentro. Ou nas sacolas que você carrega do shopping. Eu não sei, você não sabe (e o valor que está na nota é apenas uma estimativa bem irreal). Não, ninguém sabe.
O brasileiro ouve “Guerra Fiscal” e imagina ser algo bom. Porque vamos pensar juntos: é uma concorrência entre Estados! É saudável! Cada Estado deve fazer seu máximo para reduzir tributos e atrair empresas. Pena que não funciona assim na vida real. A Guerra Fiscal arrastou o país para um vale tudo na renúncia tributária. Em nome de um suposto desenvolvimento social, geração de empregos, sacrificamos nossa racionalidade.
Sim, eles passeiam simplesmente por passear. Empresas resolvem se instalar bem longe de seus fornecedores e clientes em uma região sem vocação para seu negócio. Nosso sistema tributário, recheado de jeitinhos, remendos e interpretações nos empurraram para total e completa falta de lógica econômica.
Não pensem vocês que toda essa loucura vem sem preço. As disputas judiciais envolvendo temas tributários já respondem por 75% do nosso PIB. Empresas enfrentam autos de infração decorrentes de interpretações das autoridades e passam anos e anos aguardando um desfecho. Tudo isso, todo este custo Brasil, tudo está no preço que pagamos ao final. Os gastos com contadores, com as inúmeras obrigações acessórias, advogados tributaristas, tudo.
Uma alíquota padrão, única, aplicável a bens e serviços. Lógico, teremos exceções, estamos no Brasil. E lógico, elas serão em número muito maior que o necessário, afinal estamos no Brasil. Só precisamos fazer um alerta ao país da meia entrada: não há 50% de desconto. Alguém sempre está pagando a outra metade. Então, se quisermos uma alíquota justa para nossa nova tributação, devemos pressionar e ficar de olho na discussão no Senado.
Existe um compromisso do Governo e Congresso para que a carga tributária não seja aumentada com a reforma. Honestamente, não sabemos exatamente o que esperar. Mas me parece um enorme contrassenso optar pela permanência na total ignorância em que nos encontramos hoje, em detrimento da possibilidade de, finalmente, sabermos o quanto pagamos na tributação sobre o consumo. Temos mais a ganhar com a reforma do que sem ela. Afinal, perdendo, todos nós já estamos hoje.
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