Belo Horizonte teve explosão de casos de coronavírus após reabrir comércio. (ALEX DE JESUS/O TEMPO/Agência Estado)
Clara Cerioni
Publicado em 4 de julho de 2020 às 08h00.
Última atualização em 4 de julho de 2020 às 13h50.
A ansiedade para sair da quarentena é natural, mas o mês de junho mostrou que na falta de controle da pandemia, uma saída precoce pode sair pela culatra. Em várias cidades de pelo menos quatro estados brasileiros, o mês foi marcado pelo recuo.
A maior parte destas localidades havia fechado, ainda em março, serviços e comércio não-essenciais em um momento quando ainda não tinham tantos casos e mortes pela covid-19. Após um mês sem grandes variações, decidiram abrir alguns setores da economia, entre o fim de abril e meados de maio.
Pouco tempo depois o que se viu foi uma explosão de casos e de mortes que passaram dos 600%. Como medida para frear o contágio, deram um passo atrás. O 'fecha, abre e fecha' gera incerteza financeira para os estabelecimentos e deixa muitos consumidores sem saber se é seguro sair de casa.
Além disso, abrir precocemente é receita para uma alta de casos, como explica Emanuel Maltempi de Souza, professor do Departamento de Bioquímica e Biologia Molecular e presidente da Comissão de Acompanhamento e Controle de Propagação do Coronavírus na Universidade Federal do Paraná (UFPR).
"Do ponto de vista da transmissão, o reflexo de abrir a economia começa a ser sentido de 10 a 12 dias depois. Ou seja, eu não posso afirmar com certeza, mas existe uma relação entre o aumento de casos e o fim do distanciamento social. O ideal seria fechar tudo e ampliar a testagem de forma rápida para saber onde estão os focos de contágio", avalia Souza.
Minas Gerais tinha 10.670 casos confirmados e 206 mortes por covid-19 no 1º de junho, quando passava pelo processo de reabertura da economia. Quase um mês depois, no dia 26 de junho, o número de infectados saltou para 38.891 e o de óbitos quadruplicou para 833. Foi quando o governo do estado decidiu fechar novamente várias regiões, incluindo a capital, Belo Horizonte.
Outro estado que também viu o número de casos crescer foi Goiás. No começo de junho a Secretaria da Saúde registrava 3.906 casos e 204 mortes pela doença.
Nesta época havia um processo de flexibilização da quarentena. Após 30 dias, o número de casos cresceu 625%, passando para 24.381. Já o número de mortes subiu para 1.374.
Para frear o avanço da doença, o governo de Goiás publicou um decreto, em vigor desde o dia 30 de junho, com uma medida inusitada: fechamento alternado dos serviços não essenciais. A norma determina que estes estabelecimentos, como shoppings, bares e restaurantes, ficam fechados por 14 dias, para depois ficarem abertos por outros 14 dias. A ver qual será o resultado.
O professor da UFPR que estuda a covid-19 destaca que o SARS-CoV-2 se comporta de uma maneira diferente do vírus da gripe. Por isso, a abertura de atividades com aglomeração requer muito cuidado.
"A transmissão ocorre de pessoa para pessoa. Então é difícil que a gente tenha de volta de forma rápida atividades com aglomerações, com jogos de futebol, por exemplo, mesmo em baixo nível de novos casos. O coronavírus afeta de forma grave uma pequena parte dos infectados, mas a mortalidade nestes pacientes graves é muito alta", diz.
Em Santa Catarina, a reabertura dos shoppings teve festa e causou aglomerações em Blumenau, no Vale do Itajaí.
No fim de abril, o estado era um dos menos afetados pela pandemia, com 1.091 casos e 28 mortes. Em pouco tempo, a situação mudou. No boletim do dia 30 de junho, o estado registrou 26.354 casos confirmados e 1.298 mortes.
A capital Florianópolis decidiu fechar novamente os serviços não essenciais após o número de casos triplicar, passando de 687, no começo de junho, para 1.122 no dia 22. Balneário Camboriú, no litoral norte do estado, decidiu estabelecer toque de recolher durante a noite.
O vizinho Paraná também passou pelo 'fecha, abre e fecha'. Desde o dia 1º de julho, só podem abrir estabelecimentos como supermercados, farmácias e postos de gasolina. Mas a regra só é válida em 134 cidades dos 399 municípios do estado, incluindo a capital, Curitiba, e Londrina, a segunda maior cidade.
No começo de junho, o Paraná tinha 4.835 casos confirmados de SARS-CoV-2 e agora tem 22.623, um crescimento de 468%. No dia 1º de junho o estado registrava 190 mortes e agora tem 636, um aumento de 335%.
Agora é torcer para que São Paulo e Rio de Janeiro, atingidos pela pandemia mais cedo, não acompanhem a mesma trajetória de outros estados em suas reaberturas incipientes. Na noite da quinta-feira, a imagem de centenas de pessoas bebendo na Praça Cazuza, no Leblon, gerou apreensão. O exemplo de outros estados mostra que não há saída fácil e o cuidado precisa ser constante e total.