"A grande maioria dos parlamentares que são candidatos à reeleição serão reeleitos", assegura Sylvio Costa, fundador do site "Congresso em Foco" (Adriano Machado/Reuters)
AFP
Publicado em 2 de outubro de 2018 às 13h35.
Última atualização em 2 de outubro de 2018 às 13h44.
O próximo presidente do Brasil deverá lidar com um Congresso tão pulverizado quanto o desprestigiado legislativo atual e fazer alianças com todo tipo de clã político para governar, apesar da Operação Lava Jato, que pretendeu desenterrar os vícios da "velha política", opinam analistas.
"A grande maioria dos parlamentares que são candidatos à reeleição serão reeleitos", assegura à AFP Sylvio Costa, fundador do site jornalístico especializado "Congresso em Foco".
"E também a chamada renovação (...) são, na verdade, pessoas ligadas a clãs familiares, ou grupos políticos tradicionais, que é uma coisa muito brasileira", acrescentou Costa, que estima em um terço dos 513 deputados e mais da metade dos 81 senadores atuais são investigados ou acusados por ações criminais.
O Congresso também estará pulverizado, com cerca de 30 partidos, e suas principais forças voltarão a ser, com toda a chance, as três que dominaram a vida política no último quarto de século: o Partido dos Trabalhadores (PT), do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva; o Movimento Democrático Brasileiro (MDB), do presidente Michel Temer; e o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
Mas em 33 anos de democracia esses partidos nunca tiveram uma maioria absoluta, dando origem a um "presidencialismo de coalizão", no qual o presidente precisa formar coalizões variadas em troca de favores, como atribuição de recursos e nomeações a cargos no Executivo.
Essa dinâmica, que em 2005 derivou no escândalo do mensalão, "não vai mudar e é o coração do problema", explica à AFP o cientista político Matías Spektor.
Os procuradores da Operação Lava Jato, que em 2014 descobriu um enorme sistema de propinas pagas por empreiteiras a políticos e partidos para obter contratos na Petrobras, pediram sanções eleitorais aos envolvidos nos escândalos.
O ano de "2018 é a batalha final da Lava Jato, porque as eleições de 2018 determinarão o futuro da luta contra a corrupção no nosso país", afirmou em novembro de 2017 o procurador Deltan Dallagnoll, de Curitiba.
Uma luta, ao que parece, perdida desse ponto de vista. E que não avançou muito na área judicial, pois praticamente nenhum dos políticos como foro privilegiado - legisladores e ministros - foi condenado pelo supremo tribunal.
Alguns desses casos, no entanto, foram tratados desde maio pela Justiça comum, que costuma trabalhar de maneira mais acelerada. "Antes, no Brasil, o risco de uma condenação judicial (para políticos do Congresso) era baixíssimo. Hoje aumentou muito", admite Costa.
As alianças serão fundamentais em uma legislatura que irá requerer muito jogo de cintura para reunir os apoios necessários e aprovar, por exemplo, a reforma da previdência, considerada pela maioria dos candidatos como fundamental para endireitar as deficitárias contas públicas.
O candidato de extrema direita Jair Bolsonaro, favorito nas pesquisas de intenção de voto para o primeiro turno, em 7 de outubro, é do Partido Social Liberal (PSL), que conta com apenas oito deputados e que dificilmente conseguirá obter mais que o dobro dos votos.
Seu provável adversário no segundo turno, Fernando Haddad, sucessor de Lula, terá que lidar com o forte 'antipetismo' do Congresso, que em 2016 destituiu a ex-presidente Dilma Rousseff.
O cientista político Thiago Vidal prevê uma "legislatura conturbada", qualquer que seja o presidente eleito.
Há quem veja em Brasília, a utópica capital criada há quase seis décadas, um símbolo da distância da elite com relação aos cidadãos.
Seu icônico Congresso - dois altos edifícios próximos a suas semiesferas brancas, uma virada para cima (Senado) e outra para baixo (Câmara dos Deputados) - se tornou há alguns anos uma das instituições nas quais os brasileiros menos confiam.
"O problema maior é provavelmente o da representação", explica Costa.
No Brasil, mais de 50% da população são mulheres e 54% da população são negros e pardos, mas no Congresso as mulheres ocupam apenas 10% das cadeiras, e os negros e pardos não chegam a 20%, lembra.
O sistema brasileiro acaba escolhendo "pessoas de um circuito muito restrito da nação, em geral pessoas ricas e brancas", lamenta.