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Programa articula rede para inclusão produtiva 765 mil "jovens potência"

Geração atual é a última do bônus demográfico brasileiro; desperdício de potenciais talentos implica em problemas ainda maiores no futuro

 (Luciano Trindade/Divulgação)

(Luciano Trindade/Divulgação)

FS

Fabiane Stefano

Publicado em 13 de novembro de 2020 às 20h48.

Última atualização em 13 de novembro de 2020 às 20h52.

Um estudo promovido pela consultoria Accenture descobriu que a cidade de São Paulo tem mais de 765 mil "jovens potência". O termo é novo, mas a definição é bastante conhecida: são jovens de 15 a 29 anos que nem estudam, nem trabalham em empregos formais - os famosos "nem-nem".

Mas o "Global Opportunity Youth Network" (GOYN), que é liderado mundialmente pelo Instituto Aspen e chega à São Paulo no próximo dia 24, prefere vê-los como "jovens potência". Isso porque eles representam uma importante fatia da última bônus demográfico brasileiro - quando um país tem mais cidadãos economicamente ativos do que não-produtivos, como idosos e crianças. Quando a pirâmide etária começa a se inverter - o que deve acontecer por aqui já nesta década -, o país perde a oportunidade de ficar rico antes de ficar velho.

"Se não investirmos na educação e no planejamento da vida desses jovens agora, teremos muito mais adultos dependentes no futuro", explica Gabriella Bighetti, diretora executiva da United Way Brasil, instituição social articuladora do GOYN no Brasil - o programa também está presente na Colômbia, África do Sul, Quênia e Índia. "Isso impacta o mercado de trabalho também, que não vai encontrar mão de obra qualificada para atender suas demandas, o que já acontece hoje." 

Ou seja: investir no desenvolvimento pessoal e profissional desses jovens - que em 2019 eram mais de 11 milhões em todo o país, segundo o IBGE - melhora o horizonte fiscal no longo prazo e ainda colabora para um ambiente de negócios com menos deficiências. Mas promover a inclusão produtiva desse batalhão, que hoje conseguem sustento trabalhando em empregos informais, como entregadores e motoristas de aplicativos, exige a resolução de gargalos historicamente complexos.

Famílias pouco estruturadas, educação de baixa qualidade, urgência de trabalhar para colaborar com o sustento da família, a distância entre a moradia e as oportunidades de trabalho e a informalidade são pontos cruciais que levam à vulnerabilidade social e travam esses jovens numa realidade nada empolgante para eles e pouco produtiva para a sociedade: em São Paulo, a evasão escolar no Ensino Médio é de 17,7% e o desemprego afeta 36% dos jovens. Um estudo do Insper apontou que 30% dos que deixaram o ensino médio durante da pandemia não pretendem voltar à escola.

Enquanto o poder público dá passos de tartaruga para sanar esses problemas com projetos como reforma do ensino médio e o Bolsa Família, por exemplo, o setor privado também faz seus investimentos - leia mais sobre eles abaixo. Mas o problema é tão grande que até mesmo empresas gigantes, atuando sozinhas, não conseguem ter um grande impacto. E aí que entra o GOYN: mobilizando empresas, terceiro setor e governos para, com base em dados e nas necessidades dos jovens, construir uma solução integrada para eles.

Nos últimos nove meses, o programa utilizou dados públicos para mapear jovens em vulnerabilidade social em toda a capital paulista e convidou mais de 60 organizações e empresas para, junto com o poder público, identificar áreas de investimentos em que intervenções estratégicas e coletivas poderiam levar a bons resultados de inclusão produtiva. Um "Núcleo Jovem" também foi montado para que os jovens beneficiados pelo programa tivessem representação na sua construção desde o início.

Cada uma das áreas identificadas se tornam grupos de trabalho e geram protótipos de intervenção que serão testados em 2021. Um deles, por exemplo, é um projeto que vai até as periferias - onde até 55% da população é socialmente vulnerável - para chamar a atenção dos jovens às oportunidades de trabalho reunidas em um portal,, que também oferece os cursos de qualificação requisitados para aplicar às vagas. Um outro, chamado "Projeto de Vida", pretende estimular os jovens a aproveitarem a idade escolar para desenhar um plano para o futuro, levando em conta suas necessidades, aptidões e propósitos de vida.

Muitas empresas nos dizem que pagariam para formar um profissional da nova economia digital. Então há demanda, há recursos, há interesse do jovem. Mas há também um passo grande a ser dado: precisamos levar esse novo mundo para as periferias, porque a economia digital e as novas profissões ainda não chegaram lá. Sem que eles eles saibam desse universo, é difícil se interessar e construir um projeto de vida baseado nele. O jovem tem que ter poder de escolha.

Gabriella Bighetti, diretora executiva da United Way Brasil, articuladora do GOYN no Brasil

Uma das instituições que viram no GOYN uma complementariedade que amplifica o impacto dos seus projetos é a Fundação Telefônica Vivo, que com o programa Pense Grande, leva o ensino de empreendedorismo comunitário para dentro das escolas públicas, como uma optativa do novo ensino médio. Mas ainda que o aluno tenha uma ideia ou projeto promissor, ele pode acabar não concluindo o ensino médio ou até mesmo não ser bem recebido no ecossistema empreendedor, que busca projetos com um potencial de rentabilidade incompatível com a periferia.

"Nossa principal dificuldade sempre foi convencer o ecossistema de que a periferia tem seu valor, que têm pessoas lá que querem consumir produtos e serviços de qualidade", explica Américo Mattar, diretor presidente da Fundação Telefônica Vivo. Com a articulação do GOYN, a tarefa ficou mais fácil, já que o jovem que participa do Pense Grande consegue, através dos parceiros programa, encontrar novos caminhos para colocar sua ideia de negócio de pé. "O principal ganho desse programa é mostrar para o jovem que ele pode escolher", complementa Mattar.

O Instituto Coca-Cola, por sua vez, entrou para o GOYN oferecendo o poder de convocação da marca e o seu projeto de empregabilidade, um dos maiores do Brasil. Assim, os jovens impactados pelo programa têm acesso a uma ampla rede de empregadores que trabalham com a marca, da logística ao varejista, incluindo o setor de serviços. Ao mesmo tempo, outros parceiros do GOYN ajudam o jovem a seguir num processo contínuo de aprendizagem.

"Quando juntamos o jovem ao empregador, diminui-se os custos de contratação e, pelo lado social, também a desigualdade", explica Daniela Redondo, diretora executiva do Instituto Coca-Cola Brasil. "Os empregadores estão tendo um olhar mais inclusivo, por exemplo, fazendo pequenos ajustes nas escalas de trabalho, para que o jovem possa seguir estudando. Isso faz o quadro de funcionários girar menos e leva mais prosperidade para o negócio."

São questões como essa, que podem parecer pequenas para quem emprega, mas que são extremamente relevantes para quem é empregado, que são levantadas pelos integrantes do Núcleo Jovem do GOYN, como Ana Inez Eurico, 28, que hoje também é assistente de projetos do programa e líder do Comitê de Equidade de Raça, Gênero e Território.

"Não é porque os jovens são da periferia que eles são todos iguais", explica ela. "Levar esse recorte de raça, gênero e território para as empresas e executivos que ainda não têm esse olhar é importante para promover entendimentos dos dois lados."

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