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Procurador que investigou Bretas também quis auxílio-moradia

Marcelo Bretas foi à Justiça para que ele e a mulher, também juíza, pudessem receber auxílio-moradia

Bretas: "É descabida a concessão do auxílio-moradia aos autores nos moldes em que pago a magistrados e membros do MP", diz a decisão (Fernando Frazão/Agência Brasil)

Bretas: "É descabida a concessão do auxílio-moradia aos autores nos moldes em que pago a magistrados e membros do MP", diz a decisão (Fernando Frazão/Agência Brasil)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 30 de janeiro de 2018 às 18h06.

São Paulo - O procurador da Advocacia-Geral da União, Carlos André Studart Pereira, que solicitou informações sobre o auxílio-moradia ao juiz federal Marcelo Bretas junto ao Tribunal Regional Federal da 2.ª Região (TRF2), foi à Justiça, em fevereiro de 2015, pedir o benefício para ele mesmo.

A informação sobre o requerimento do procurador, que mirou o magistrado da Operação Lava Jato, no Rio, foi divulgada pela Coluna do Estadão nesta terça-feira, 30.

Marcelo Bretas foi à Justiça para que ele e a mulher, também juíza, pudessem receber auxílio-moradia. Uma resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) proíbe o pagamento do benefício a casais que morem sob o mesmo teto.

Em 2014, Ação Originária nº 1.773 (AO 1.773), o ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), assegurou o auxílio-moradia aos juízes federais em atividade. O ministro entendeu que os magistrados faziam jus ao benefício, uma vez que se trata de verba de caráter indenizatório - compatível com o regime do subsídio -, previsto pela Lei Orgânica da Magistratura (Loman).

No pedido à Justiça, protocolado contra a União, Carlos André Studart Pereira foi acompanhado por outros procuradores e solicitou também uma gratificação por substituição nos moldes em que são pagas aos membros do Ministério Público da União e do Poder Judiciário Federal. Na época, os procuradores informaram que atuavam em Mossoró, no Rio Grande do Norte.

Os autores do requerimento argumentaram na Justiça que estavam lotados "numa cidade cujas condições de moradia são consideradas adversas pela Administração Pública Federal, à semelhança dos Juízes e membros do Ministério Público, o que lhes dá, com igualdade de motivos a estes últimos, direito à indenização do auxílio-moradia".

A Advocacia-Geral da União, que atua na defesa da União, contestou o pedidos dos procuradores federais durante o processo. A instituição afirmou que a solicitação era "mais uma forma de manifestação da indignação, por parte dos autores, por causa da atual defasagem (estrutural e econômica), cada vez maior, existente entre as carreiras da Advocacia-Geral da União (AGU) e as demais funções essenciais à Justiça".

"A AGU vem sofrendo um processo de grave sucateamento e desvalorização, trazendo à tona inúmeros problemas existente nas carreiras. É tratada como uma advocacia de governo quando deveria ser valorizada e tida como advocacia de Estado. Não é isso que vem acontecendo, razão pela qual é enorme o números de colegas que são aprovados em concursos melhores como o da Magistratura e do Ministério Público", afirmou o advogado da União Cássio Rêgo de Castro.

"Para tentar minimizar a crise/conflito/prejuízo, então, procuram os autores, por meios seriamente contestáveis, um aumento salarial a fim de 'equacionar e equilibrar a balança'. Essas desejadas indenizações fazem parte da cultura brasileira de querer 'dar um jeito' para obtenção de ganhos pessoais e/ou de determinados grupos, com intuito de concretizar desejos particulares em detrimento do interesse público."

Na sentença que negou o pedido de auxílio aos procuradores, o juiz Lauro Henrique Lobo Bandeira, da 10.ª Vara Federal, apontou para "diferença de regimes entre o Ministério Público da União, a Defensoria Público da União e a Advocacia-Geral da União, o que autoriza, por consequência, que cada uma delas seja tratada de forma diferenciada quanto a estruturação dos cargos, carreira, remuneração e concessão de vantagens". O magistrado condenou os procuradores "a pagar, de forma rateada, honorários advocatícios no valor de R$ 2 mil".

"É descabida a concessão do auxílio-moradia aos autores nos moldes em que pago a magistrados e membros do Ministério Público", decidiu o juiz.

A sentença, de 12 de agosto de 2015, também negou a solicitação de gratificação por substituição. O magistrado informou que, na época, estava tramitando na Câmara dos Deputados um projeto de lei que pretendia instituir a "indenização" por exercício cumulativo de funções processual, judicial e consultiva, dos membros efetivos da Advocacia-Geral da União.

"Enquanto não aprovada a lei disciplinando o seu pagamento, não há como se conceder aos autores a gratificação em alusão", afirmou o juiz.

Em setembro daquele ano, os procuradores informaram à Justiça que não entrariam com recurso contra a sentença. Na manifestação, o grupo fez "considerações finais". Os procuradores federais anotaram que buscavam "trazer o tema para uma outra instância, a fim de discutir alguns aspectos que estão sendo esquecidos na AO 1.773".

"Mais uma vez se constatou que, se a ação desse tipo não envolver membros da magistratura e do Ministério Público, dificilmente ela terá êxito. É o que, infelizmente, constatou-se aqui (daí o motivo de não mais levar adiante a causa)", afirmaram os procuradores.

"O que sinceramente se deseja é que a questão seja resolvida, de forma definitiva, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, não se permitindo que uma simples decisão liminar monocrática do Ministro Fux cause tantos problemas (efeito cascata, multiplicador etc)."

Defesa

Em nota, Carlos André Studart Pereira afirmou: "Lamento que uma mera consulta feita na qualidade de cidadão tenha tomado tamanha proporção. Em momento nenhum questionei o auxílio (duplo) recebido por Marcelo Bretas. Apenas fiz uma consulta, notadamente porque o valor correspondente a esse benefício não estava no campo apropriado (verbas indenizatórias) no Portal da Transparência.

Infelizmente essa mera consulta foi 'vazada', o que já é uma deslealdade comigo. Mas já foi...

E reitero: a AGU nada tem a ver com isso. Não sei qual a ligação da minha consulta com a instituição da qual faço parte.

Mais uma vez estão me questionando se não estaria sendo contraditório por escrever tanto sobre o auxílio-moradia e, ao mesmo tempo, ter ingressado com uma ação postulando tal benefício.

Vamos lá:

a) Primeiro: alguma pessoa em sã consciência acreditou um dia que algum juiz nessa face da terra iria acolher um pedido como esse? Tanto é verdade que o pleito foi julgado totalmente improcedente. Tratou-se de uma provocação semelhante àquela da Defensoria Pública da União, que ingressou com uma ação para obter auxílio-moradia para os moradores de rua.

b) A tese sobre o auxílio-moradia foi desenvolvida por um colega. Ela parte da premissa de que, se a verba em questão tiver mesmo natureza indenizatória (e um Ministro do STF disse que sim), ela deve ser estendida, sem a necessidade de lei, pelo menos para os demais agentes públicos que estão em patamar semelhante, como aqueles que exercem função essencial à Justiça. Enfim: partiu-se da 'verdade' criada pelo Ministro Fux. Acredito que não deveria ser eu o destinatário desse questionamento.

c) Os principais propósitos da ação eram: defender a simetria existente entre a AGU e o MPU. e saber como o juiz ia defender que a verba tem caráter indenizatório (não consigo e nunca consegui conceber isso). Lamentavelmente não consegui nada disso. O magistrado em sua sentença afirmou que não havia simetria (colocou no bolo apenas a magistratura, Ministério Público e Defensoria Pública), e não falou detalhadamente da natureza da verba (disse apenas que era indenizatória e pronto). Apesar de tudo isso, achei a sentença bem elaborada, séria e 'educada'. O magistrado prolator ganhou mais ainda o meu respeito e admiração!

d) Desejava também com a ação iniciar o efeito multiplicador mencionado no recurso da AGU (e/ou no mandado de segurança), para justificar o julgamento rápido do processo ou mesmo a reconsideração/reforma da decisão. A ideia era espalhar a inicial a depender do resultado da sentença. Queria mesmo que todos os agentes públicos ingressassem com essa mesma ação, só para 'aumentar o peso' e cair para todos! Enfim: o objetivo maior era resolver mais rapidamente a questão.

e) Para confirmar as intenções acima mencionadas, não foi interposto recurso de apelação, tendo sido apresentada apenas uma petição, como 'manifestação final', a qual corrobora tudo que foi dito aqui (e protocolizada bem antes dos questionamentos que sofri à época - ou seja, minha intenção de não levar adiante foi anterior às críticas).

f) É engraçado as pessoas ficarem se preocupando com o meu dever de ser coerente, quando na verdade deveriam se preocupar com a luta contra esses abusos. O que importa se ingressei ou não com essa ação? O que vai mudar no mundo isso? Nada! E, apesar de ter ingressado, continuo lutando contra. Incoerente seria eu, depois de ajuizar a ação, 'mudar de lado', coisa que não o fiz. Minha opinião continua a mesma: http://www.conjur.com.br/2013-dez-06/carlos-studart-auxilio-moradia-nao-verba-indenizatoria

g) Se perguntarem: você quer ganhar o auxílio-moradia ou prefere que ninguém ganhe? Você quer férias de 60 dias ou prefere que ninguém as tenha? Podem ter certeza de que fico com as segundas opções. E não me importo se acreditam nisso. Não sou político. Só tenho compromisso com minha consciência, que está muito tranquila.

h) Por fim, peço desculpas aos que sentiram ofendidos e se provoquei uma perturbação na vida de alguém. Juro que nunca foi essa a minha intenção. Ademais, o processo judicial é público, e a decisão favorável foi proferida há anos (por que só agora a polêmica?). Reitero: lamento que a questão tenha tomado esse rumo.

 

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