Brasil

Procurador denuncia 9 por cartel de trens em São Paulo

Eles foram denunciados por lavagem de dinheiro de propina de ao menos R$ 26,3 mi referente ao contrato de sistema de transporte sobre trilhos da Linha 5

Linha 5: a denúncia ocorre mais de dois anos depois de a Polícia Federal concluir o inquérito sobre o caso e indiciar 33 pessoas (Diogo Moreira/A2 Fotografia/Divulgação)

Linha 5: a denúncia ocorre mais de dois anos depois de a Polícia Federal concluir o inquérito sobre o caso e indiciar 33 pessoas (Diogo Moreira/A2 Fotografia/Divulgação)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 10 de fevereiro de 2017 às 21h14.

O procurador da República em São Paulo Rodrigo De Grandis denunciou nesta sexta-feira, 10, os ex-diretores da CPTM Ademir Venâncio de Araújo e João Roberto Zaniboni, seis executivos de multinacionais e um lobista por lavagem de dinheiro de propina de ao menos R$ 26,3 milhões referente ao contrato de fornecimento de sistema de transporte sobre trilhos da Linha 5 do Metrô de São Paulo, em 2000.

A acusação criminal é a primeira contra ex-dirigentes da estatal de trens paulista e faz parte da principal investigação do esquema revelado com base na colaboração da Siemens, que em acordo de leniência fechado em maio de 2013 com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) admitiu ter cometido fraudes em licitações do metrô em São Paulo, entre 1998 e 2008 (governos do PSDB Mário Covas, José Serra e Geraldo Alckmin), e em Brasília.

A denúncia contra cartel e fraude a licitações envolvendo esta licitação ficou a cargo do Ministério Público estadual e deu origem a uma ação penal na Justiça estadual em São Paulo apenas contra os executivos das empresas suspeitas de participar das fraudes.

A denúncia ocorre mais de dois anos depois de a Polícia Federal concluir o inquérito sobre o caso e indiciar 33 pessoas.

Neste período, a Procuradoria da República em São Paulo dependia de documentos sobre as contas de lobistas do esquema no exterior obtidas com a colaboração com o Uruguai e que chegaram ao MPF em São Paulo apenas em novembro do ano passado.

Na denúncia, que conta com informações de colaborações internacionais com a Alemanha, Inglaterra, Luxemburgo e Uruguai além da colaboração premiada de dois executivos da Siemens, o procurador acusa os dois ex-diretores de atuarem para ajudar a formação do cartel que fraudava licitações no sistema metroferroviário paulista, "fornecendo às empresas acesso prévio a documentos sigilosos da CPTM".

Para De Grandis, a formação do cartel "também era de interesse de ex-diretores da CPTM, como Ademir e João, pois ele viabilizava a conclusão mais célere do procedimento licitatório".

Apesar de acusar os dois ex-dirigentes de corrupção, estes crimes prescreveram no primeiro semestre de 2016, por isso a denúncia de De Grandis se restringiu aos crimes de lavagem, que podem levar à penas que variam de 4 a 16 anos de prisão.

O valor da propina (R$ 26,3 milhões) corresponde a 5% do contrato de R$ 527 milhões firmado em 2000 entre a CPTM e o Consórcio Sistrem - formado por Alstom, Alstom Transport, Siemens, Siemens AG e outras duas empresas - após a licitação fraudada, segundo as investigações e a colaboração de executivos da multinacional alemã, que admitiram participação no cartel do setor metroferroviário.

Inicialmente, a licitação da CPTM previa a instalação do sistema de transporte sobre trilhos para a implementação da Ligação Capão Redondo - Largo Treze, então chamada Linha G da CPTM, mas que posteriormente acabou se tornando Linha 5 do Metrô.

Consultorias de fachada. Segundo a denúncia, os dois ex-diretores da CPTM receberam as propinas por meio de contratos de consultoria de fachada firmados pelas empresas do cartel com ao menos cinco companhias do lobista Arthur Teixeira no Brasil e no Uruguai (Procint, Constech, Leraway, Gantown e GHT, além de outras ainda não identificadas).

A investigação identificou ainda que alguns dos contratos de consultoria foram feitos por sucursais da Alstom e da Siemens na Europa com as empresas de fachada.

Destas empresas de consultoria, os valores eram repassados a João Zaniboni e Ademir Venâncio. No caso de Zaniboni, as investigações da Procuradoria da República, com a colaboração internacional de outros países, identificaram que ele mantinha, desde 22 de outubro de 1998 uma conta no banco Credit Suisse, em Zurique, chamada Milmar e que estava em nome de suas filhas Mariana e Milena.

Segundo o procurador De Grandis, essa conta foi utilizada para o "recebimento e ocultação"de propina relacionada às obras da Linha 5 do Metrô paulista.

As investigações identificaram dois depósitos de offshores de Arthur Teixeira e Sérgio Teixeira (morto em 2011) na conta Milmar que somaram US$ 213 mil em 2000, além de remessas de dinheiro via operação dólar-cabo que totalizaram US$ 464 mil entre outubro de 1999 e julho de 2001.

Alguns anos depois, US$ 181,1 mil que foram para a conta de Zaniboni foram internalizados no Brasil supostamente por meio do doleiro Marco Cursini, que recebeu a quantia de Zaniboni em uma conta na Suíça e entregou o valor em dinheiro em espécie para o ex-dirigente no Brasil.

Além disso, tanto Ademir quanto Zanoboni receberam valores da Alstom por meio de contratos da multinacional com a empresa de consultoria Focco, que tinha os dois ex-dirigentes como sócios (Zaniboni deixou a empresa em 2013).

De acordo com a denúncia, de 16 de abril de 2004 a 24 de maio de 2006 a Alstom transferiu R$ 2 milhões para a Focco, desta quantia, ao menos R$ 265 mil foram transferidos para uma conta pessoal de Zaniboni entre 2009 e 2011.

Ao longo da investigação do cartel, a Justiça decretou o sequestro de R$ 2 milhões nas contas da empresa, que acabou sendo revogado em julho de 2014 por determinação da própria Justiça Federal de São Paulo.

Segundo a procuradoria, estes R$ 26,3 milhões também foram pagos ao ex-diretor da CPTM Oliver Hossepian (cuja acusação de lavagem e corrupção prescreveu) e outros funcionários públicos ainda não identificados no esquema do cartel dos trens em São Paulo.

Defesa

Em nota, a CPTM afirmou que companhia e o Metrô são "os maiores interessados na apuração dos fatos, com intuito de que os responsáveis sejam punidos na forma da lei e que haja restituição dos prejuízos aos cofres públicos.

Ambas as empresas estão à disposição e vem colaborando com a Justiça sempre que solicitado".

O criminalista Luiz Fernando Pacheco, que representa João Zaniboni e Ademir Venâncio afirmou que "tanto o sr. João Zaniboni como Ademir Venâncio repudiam veementemente a prática de quaisquer crimes, inclusive o de lavagem de dinheiro imputado a eles.

Ambos veem no oferecimento da denúncia o início de um processo e a oportunidade para demonstrar sua inocência e encerrar de vez essa matéria que remete ao fim dos anos 90, começo dos anos 2000".

O criminalista Eduardo Carnelós, defensor de Arthur Teixeira, disse ter ficado surpreso com a denúncia porque o procurador da República tinha manifestado interesse em ouvir seu cliente, com o que o advogado havia concordado, "condicionando a ter vista a documentos que vieram do exterior".

"Documentos solicitados via cooperação", relatou.Carnelós disse estar "perplexo" com a informação de queseu cliente foi denunciado.

"É uma precipitação. O sr. Arthur jamais recebeu propinas ou lavou dinheiro. Ele é um consultor consagrado e respeitado nessa área de transportes metroviários com larga experiência e com uma carreira reconhecida", afirmou.

Acompanhe tudo sobre:CorrupçãoSão Paulo capitalGeraldo AlckminSiemensCPTM

Mais de Brasil

Paraná tem maior redução de homicídios dolosos desde 2007

PEC da Segurança deve ser votada em dezembro por comissão, diz Motta

Provas anteriores do Enem: onde baixar e como usá-las para uma revisão eficaz

Governo poderá mirar no piso da meta fiscal após ajuda do Congresso