Funcionários dos Correios ficaram em greve durante 35 dias: paralisação favoreceu a privatização? (Sintect DF/Divulgação)
Carla Aranha
Publicado em 24 de setembro de 2020 às 11h44.
Pelo menos duas grandes empresas, ligadas ao setor de logística, já contrataram assessoria jurídica para participar do processo de privatização dos Correios, que caminha a passos largos. Fabio Farias, ministro da Comunicação, adiantou, na última quarta-feira, dia 16, que cinco grupos empresariais, entre elas o Magazine Luiza, a FeDex e DHL, demonstraram interesse na aquisição da estatal.
O escritório de advocacia TozziniFreire, um dos maiores do país, já começou a atender algumas das empresas interessadas na privatização dos Correios – o nome das companhias permanece sob sigilo, por enquanto.
“Para essas empresas, faz muito sentido adquirir a operação da estatal porque elas já atuam, de alguma forma, no setor de logística”, diz a advogada Claudia Elena Bonelli, sócia da área de infraestrutura do TozziniFreire. Na visão do mercado, há fortes indícios de que a privatização deve sair logo.
“O edital será publicado, sem muita sombra de dúvida, em 2021, então os interessados já estão correndo para fazer uma imersão no processo e ter mais chance de ganhar a licitação”, afirma.
O escritório participou da concorrência lançada pelo BNDES para fazer os estudos técnicos e econômicos sobre a desestatização dos Correios. Os participantes também precisaram realizar uma imersão nos modelos internacionais de sucesso de privatização de serviços postais. “Para entrar na disputa, foi preciso fazer um mergulho profundo nas características do mercado, em cases de privatização do serviço postal em outros países e na logística dos Correios”, diz Bonelli.
Em entrevista à EXAME, o presidente dos Correios, Floriano Peixoto, disse que a primeira fase dos estudos necessários para o processo de privatização, sob responsabilidade da consultoria Accenture, deverá ser finalizada até novembro. “Essa etapa dos estudos inclui, entre outras providências, o envio de proposta de projeto de lei ao Congresso. Lá, os parlamentares apreciarão questões particulares da empresa considerando seu caráter como prestadora de serviço universal”, afirmou.
Na avaliação do mercado, o processo está correndo rapidamente. O maior desafio, segundo os especialistas, é estruturar a acomodação da universalização do serviço, já que todas as cidades brasileiras precisam continuar sendo atendidas. Há a possiblidade de fatiar a operação, deixando a parte da prestação do serviço a munícipios menores, e menos atrativos do ponto de vista econômico, com os Correios.
Outra hipótese é incluir a “carne de pescoço”, a parte menos lucrativa da operação, junto com o “filé mignon”, como foi feito no pregão dos 12 aeroportos licitados em 2019, entre eles os de Recife e Cuiabá.
Os aeroportos foram divididos em três blocos, cada um com uma grande estrela (geralmente as operações nas capitais dos Estados) e satélites, em cidades menores, que também entraram no pacote. O governo arrecadou 2,37 bilhões de reais com os leilões, o que representou cerca de 2,16 bilhões de reais acima do valor mínimo definido no edital para a outorga inicial.
Conforme as regras do edital, as empresas interessadas na licitação do serviço postal também poderão formar consórcios, do mesmo modo como ocorreu em relação ao pregão dos aeroportos.
De acordo com fontes de mercado, ideias mais ousadas para a modernização do serviço, aventadas pelo Ministério da Economia, como a instalação de “totens” nas cidades para que o consumidor possa acessar um boleto “na hora, com sua digital”, sem necessidade de receber a conta em seu endereço, por enquanto não estão no centro das discussões.
“Já estamos atuando fortemente em aspectos como a assessoria para a avaliação do ativo e da participação do processo licitatório, assim como na constituição de parcerias para a eventual formação de consórcios e na celebração dos contratos”, Bonelli.
Segundo fontes ligadas ao governo, a greve dos Correios, encerrada no início desta semana, jogou a favor da privatização. A paralisação durou 35 dias e foi uma das mais longas da história da estatal. Os funcionários pleiteavam a manutenção do acordo coletivo firmado em 2019, com benefícios como a licença-maternidade de 180 dias, que ficou suspenso em função da pandemia. O Tribunal Superior do Trabalho julgou que a empresa tinha razão e convocou os trabalhadores de volta à ativa.