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Prevent Senior fraudou atestado de óbito de mãe de Hang, afirma dossiê

Empresa também teria ocultado a morte do professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo Anthony Wong

Luciano Hang: dono da Havan é apoiador do presidente Jair Bolsonaro e incentivador do chamado "tratamento precoce". (Dida S/Estadão Conteúdo)

Luciano Hang: dono da Havan é apoiador do presidente Jair Bolsonaro e incentivador do chamado "tratamento precoce". (Dida S/Estadão Conteúdo)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 22 de setembro de 2021 às 14h54.

Última atualização em 22 de setembro de 2021 às 16h45.

O dossiê elaborado por 15 médicos que afirmam ter trabalhado para a operadora de saúde Prevent Senior, material que foi entregue à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, aponta que a declaração de óbito da mãe do empresário Luciano Hang, Regina Hang, "foi fraudada".

Hang é apoiador do presidente Jair Bolsonaro e incentivador do chamado "tratamento precoce", composto por medicamentos sem eficácia comprovada ou contra-indicados para tratar a doença.

Segundo os médicos, a suposta fraude na declaração de óbito de Regina Hang é um dos "inúmeros casos que não foram devidamente noticiados". O relato sobre a mãe do empresário consta do capítulo "Da suposta fraude nas declarações de óbito", do dossiê de mais de 60 páginas entregue à CPI.

As supostas irregularidades em procedimentos da Prevent Senior foram reveladas pela GloboNews. O Estadão também teve acesso ao dossiê entregue à CPI da Covid.

Prevent Senior do do Itaim em Sao Paulo SP Foto - Leandro Fonseca data - 01/09/2020

Prevent Senior do do Itaim em Sao Paulo SP (Leandro Fonseca/Exame)

O presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), afirmou nesta quarta-feira, 22, que Luciano Hang "tinha condições de levar a sua genitora para a lua, porque tem dinheiro para isso". "Mas leva para a Prevent Senior. E lá, segundo as informações, no atestado de óbito não consta que ela veio a óbito por covid", declarou Aziz.

Em vídeo publicado no Instagram, em 5 de fevereiro, Luciano Hang relatou que a mãe estava assintomática e com "quase 95% do pulmão tomado" quando foi levada ao hospital. Regina Hang foi internada no Hospital Sancta Maggiore, da rede Prevent Senior, no bairro do Morumbi, em São Paulo.

O dossiê aponta que ela foi internada em 31 de dezembro e morreu em 3 de fevereiro. No prontuário, segundo os médicos, havia informação sobre o início de sintomas, em 23 de dezembro, e adoção de tratamento precoce, com hidroxicloroquina, azitromicina e colchicina antes da entrada na Prevent Senior. Na internação, de acordo com informações dos médicos, ela teria recebido ivermectina e tratamentos experimentais.

Na legenda do vídeo, o empresário disse que "até ser diagnosticada com covid-19, eu nunca dei nenhum medicamento para prevenção a minha mãe". Luciano Hang disse que a mãe era cardíaca, tinha diabetes, insuficiência renal, sobrepeso e tomava "20 comprimidos/dia".

"Eu me questiono: será que se eu tivesse feito o tratamento preventivo, eu não teria salvado a minha mãe?", afirmou no vídeo.

De acordo com o dossiê, que cita o vídeo publicado por Hang, a alegação do empresário "não condiz com as informações do prontuário". Segundo os médicos, "o prontuário médico da sra. Regina Hang prova que ela utilizou o kit antes de ser internada e que repetiu o tratamento durante a internação, assim como registram que seu filho, sr Luciano Hang, tinha ciência dos fatos".

"Como outros tantos casos de óbitos na rede Prevent Senior decorrentes da covid-19 que não foram devidamente informadas às autoridades, a declaração de óbito da sra. Regina Hang foi fraudada ao omitir o real motivo do falecimento", diz o documento.

Procurada, a Prevent Senior reafirmou que não houve fraudes em declarações de óbitos. Diretor-executivo da empresa, Pedro Benedito Batista Junior presta depoimento à CPI nesta quarta-feira e negou que a operadora tenha cometido qualquer irregularidade.

Até a publicação desta matéria, a reportagem entrou em contato com o empresário Luciano Hang, mas sem sucesso. O espaço permanece aberto a manifestações.

Empresa teria ocultado morte de Anthony Wong

O pediatra, toxicologista e professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo Anthony Wong morreu, em 15 de janeiro deste ano, em São Paulo, após sofrer uma parada cardiorrespiratória. Aos 73 anos, ele estava internado no Hospital Sancta Maggiore, da rede Prevent Senior, desde dezembro de 2020. Em nota, a família informou que ele foi hospitalizado com queda de pressão e mal-estar e diagnosticado com úlcera gástrica e hemorragia digestiva.

O que nem a família nem o prontuário médico de mais de 2.000 páginas ou o atestado de óbito informam é que Wong foi internado com sintomas de covid-19 - tendo, inclusive, tido resultado positivo para Sars-CoV-2 durante o período em que esteve no Sancta Maggiore. A morte do médico em decorrência de reinfecção pelo coronavírus foi ocultada por 123 profissionais da rede Prevent Senior, segundo reportagem da revista Piauí. Como mostrou o Estadão, conduta semelhante foi adotada na declaração de óbito da mãe do empresário Luciano Hang, Regina Hang.

O texto, que descreve todo o tratamento recebido por Wong até sua morte, foi publicado na véspera do depoimento do diretor-executivo da Prevent Senior, Pedro Batista Jr., à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, nesta quarta-feira, 22. Aos senadores, ele negou que a operadora tenha cometido qualquer irregularidade e afirmou que não responderia a perguntas sobre seus pacientes.

Gabinete paralelo

Especialista renomado, com quase 50 anos de carreira, Wong se envolveu em polêmicas durante a pandemia ao lado de nomes como a imunologista e oncologista Nise Yamaguchi e o virologista Paolo Zanotto por defender o uso de hidroxicloroquina para covid - medicamento que já se mostrou ineficaz contra a doença e contra-indicado pela Organização Mundial de Saúde - e criticar o isolamento social. Ele também propagou informações falsas sobre vacinas.

Durante os quase dois meses em que passou internado, Wong foi tratado com o chamado kit covid (hidroxicloroquina, azitromicina e ivermectina) e outras intervenções experimentais, como a ozonioterapia retal, tratamento que até mesmo o Ministério da Saúde desaconselha. De acordo com a reportagem da Piauí, foram mais de 20 sessões. Segundo o prontuário médico, Wong autorizou ser medicado com o "kit covid".

Diferentemente dele, que optou pelo tratamento sem eficácia, reportagem da GloboNews divulgada no último dia 16, revelou por meio de áudios e mensagens de gestores da Prevent Senior, que havia a indicação de adoção do tratamento precoce em pacientes com covid sem que nada fosse dito aos familiares ou aos próprios enfermos. A reportagem também mostrou que a Prevent Senior conduzia uma pesquisa sobre a eficácia da hidroxicloroquina omitindo os dados dos pacientes que morriam durante o tratamento.

No hospital, o médico precisou ser entubado, desenvolveu insuficiência renal e foi submetido a um procedimento de traqueostomia. Antes de morrer, Wong ainda sofreu uma pneumonia bacteriana e um choque séptico após a infecção se espalhar pelo seu corpo.

Como o atestado de óbito de Wong ocultou a informação de que ele teve coronavírus, como orientam as secretarias de Saúde dos Estados, inclusive a de São Paulo, ele foi velado sem as restrições previstas no protocolo determinado às vítimas da covid-19, que ordena, por exemplo, que o caixão fique fechado.

Procurada pela Piauí, a Prevent Senior disse que não comentaria casos específicos de pacientes sem autorização da família. Carla viúva de Wong, enviou a seguinte nota à reportagem: "A família informa que não tem poder para alterar nenhuma informação no atestado de óbito e vê com incredulidade a invasão do prontuário. Informa ainda que não existe nada a ser dito e pede que respeite o nome do doutor Anthony Wong".

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