Presidente Lula: Executivo aposta em duas frentes para ocupar e tentar dominar narrativa pública sobre segurança no país (Lula Marques/Agência Brasil)
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Publicado em 3 de novembro de 2025 às 19h46.
A repercussão da megaoperação policial do Rio de Janeiro e a reorganização da direita em torno da pauta do combate à criminalidade preocupou o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que definiu duas estratégias para enfrentar a oposição e não deixar aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) vencerem a disputa da opinião pública na área da segurança pública.
A primeira diretriz visa evitar o discurso mais voltado aos direitos humanos de que os mortos são vítimas da sociedade aliado a uma tentativa de emplacar a narrativa de que o combate às organizações criminosas exige mais inteligência na busca dos líderes das facções do que troca de tiros em comunidades carentes.
Os ministérios da Justiça e da Casa Civil, a Secretaria de Comunicação e os articuladores políticos do governo participaram nos últimos dias de diversos encontros para definir a resposta do Executivo no debate sobre o tema, de acordo com fontes ouvidas pela EXAME que participaram das reuniões.
A ideia é manter encontros periódicos, uma vez que há entre governistas o temor de que os vídeos da operação no Rio de Janeiro e os números de pessoas com passagem pela Justiça entre os mortos deem ainda mais tração ao discurso da direita.
No escopo da primeira estratégia estão os elogios à Operação Carbono Oculto, que ocorreu em agosto e alcançou o núcleo financeiro do Primeiro Comando da Capital (PCC) sem precisar de troca de tiros. A esperança no Palácio do Planalto é de que a Polícia Federal (PF) desencadeie outras ações desta natureza para fortalecer o argumento de que o crime deve ser combatido com ações de inteligência sem confrontos diretos que possam colocar inocentes em risco.
O líder do PT no governo, Lindbergh Farias (PT-RJ), evidenciou a linha de pensamento do Executivo em publicação nas redes sociais nesta segunda-feira, 3.
“Cláudio Castro tá (sic) se achando o valentão, após aquela operação no Alemão. Tem muito ainda por vir. O Rio vai ser alvo de grandes operações contra o crime organizado com Polícia Federal, Receita Federal. Vamos pegar os cabeças do Comando Vermelho, das milícias”, escreveu.
A segunda estratégia é trabalhar para aprovar uma pauta contundente no Congresso que possa ser usada nas eleições do ano que vem como prova de que Lula atuou para mitigar os índices de criminalidade.
O desafio, no entanto, é conseguir maioria no parlamento para aprovação de leis e mudanças constitucionais com a marca do governo, evitando derrotas para oposição na negociação do texto a ser votado.
Em relação à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança Pública, por exemplo, a articulação política do governo já precificou que sofrerá derrotas, mas trabalha para que a aprovação final ainda possa ser usada em favor do Executivo. A proposta é a principal aposta de Lula no Congresso e visa ampliar os poderes federais no combate à criminalidade.
O relator, deputado Mendonça Filho (União Brasil-PE), deverá manter a criação de mecanismos para aperfeiçoar o trabalho da União, mas já avisou que irá retirar qualquer trecho do texto que afete o trabalho dos estados na área. A previsão é que a matéria seja aprovada na Câmara até o fim do ano.
Em outra frente, Lula enviou ao Congresso, três dias após a operação do RJ, um projeto para endurecer a legislação no enfrentamento às facções. Do ponto de vista político, a ideia é pedir urgência na apreciação da proposta e trabalhar em busca de apoio do presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), para viabilizar uma aprovação célere do texto.
Entre as medidas, a proposta institui o tipo penal de "organização criminosa qualificada", com pena que pode chegar a 30 anos de prisão; estabelece pena de reclusão de 12 a 30 anos para homicídio executado por ordem de facção; aumenta penalização para organização criminosa simples de 3 a 8 anos para 5 a 10 anos de prisão; permite apreensão e perda de bens mesmo sem condenação penal; entre outras mudanças legais.
Os líderes do governo no Congresso, porém, reconhecem que o trabalho não será simples. Além de fazer passar as duas propostas, outro desafio é desidratar o projeto que classifica como terroristas facções como o Comando Vermelho, que foi alvo no Rio de Janeiro semana passada, e o PCC, que esteve no centro da operação da PF de agosto.
Há no Executivo uma compreensão de que a classificação colocaria em risco a soberania nacional e daria brecha para atuação dos Estados Unidos em solo brasileiro. No entanto, o discurso para enfrentar o tema no Legislativo é delicado. Como mostrou uma pesquisa Genial/Quaest divulgada nesta semana, 72% dos moradores do Rio de Janeiro são a favor da medida.