Nesta terça-feira, viaturas da PM fluminense entregaram, em delegacias da Polícia Civil, cartazes convocando para a assembleia do dia 9, às 18h (Marcello Casal Jr./ABr)
Da Redação
Publicado em 8 de fevereiro de 2012 às 20h39.
Rio de Janeiro - No momento em que a greve em Salvador atinge sua tensão máxima, policiais e bombeiros do Rio de Janeiro ameaçam cruzar os braços na próxima sexta-feira – a uma semana do carnaval e em um período em que a cidade está repleta de turistas. Assim como na Bahia, o que está em jogo no Rio é um impasse nas negociações sobre reajuste de salários. Representantes de três categorias estão em contato permanente para articular os próximos passos da manifestação. Bombeiros e policiais civis e militares definirão na quinta-feira, em uma assembleia na Cinelândia, no Centro do Rio, se entrarão em greve- apesar de isso já ser dado como certo pelas lideranças. O objetivo dos manifestantes será o de levar 100 mil pessoas à praça, usando, para isso, famílias dos servidores.
Nesta terça-feira, viaturas da PM fluminense entregaram, em delegacias da Polícia Civil, cartazes impressos em papel tamanho A4 convocando para a assembleia do dia 9, às 18h. "Juntos somos fortes", diz o cartaz, que tem, nesta frase, as letras "O" substituídas por emblemas das três instituições (bombeiros, PM e Polícia Civil).
Uma comitiva com bombeiros e policiais civis viajou nesta terça-feira para a Bahia com o objetivo de encontrar com os manifestantes de Salvador. Entre os líderes do Rio, desembarcou em Salvador o cabo Benevenuto Daciolo, do Corpo de Bombeiros, principal autor da série de protestos ocorrida em 2011. A onda vermelha no estado teve como seu primeiro ato a invasão ao Quartel General. A partir daí, ocuparam as escadarias da Alerj, onde passou a ser um ponto de resistência. “Eles (policiais baianos) nos ligam todos os dias”, diz cabo Laércio Soares, do Grupamento Marítimo dos Bombeiros, que também esteve à frente dos movimentos da corporação por aumento salarial, em 2011. A garantia dada pelas lideranças fluminenses é de que ninguém pegará em armas e não serão repetidas ações como a invasão de prédios públicos – como houve no ano passado. “Somos mansos, pacíficos e ordeiros. Não iremos buscar confronto, mas dignidade”, afirma Laércio.
A rede de comunicação entre os militares ultrapassa a rota Rio-Bahia. Espírito Santo, Brasília e Ceará também fazem parte da teia de apoio. E às lideranças do Rio de Janeiro chegou a informação de que os brasilienses também pensam em entrar em greve ainda esta semana. O que une os policiais em interesse, mas ainda não em um movimento efetivo de reivindicação, é a PEC 300, que prevê equiparação salarial com os militares de Brasília - o maior valor do Brasil. Os manifestantes já cogitam a articulação de uma entidade nacional para expandir os protestos.
Bombeiros reuniram-se com o Batalhão de Operações Especiais e com o Batalhão de Choque da PM para tratar da greve. A informação passada pelos organizadores da greve é de que as duas forças especiais estão preparadas para aderir ao movimento. “Serviços essenciais serão mantidos. Mas não garanto os 30% (do efetivo). Acredito em 90% em greve e só com serviço essenciais”, afirma Laércio. Já o presidente do Sindicato dos Policiais Civis do Rio (Sinpol), Fernando Bandeira, assegura que os 30% do efetivo serão mantidos durante a greve. As atenções da polícia estarão voltadas, sobretudo, para casos mais graves, como flagrantes, sequestro e investigações de homicídios. “Não queremos a greve pela greve. Queremos que o governo venha coversar conosco”, afirma Bandeira.
O secretário de Segurança Pública do Rio, José Mariano Beltrame, afirmou nesta terça-feira que receberá as reivindicações dos policiais. “Minha postura sempre foi de receber até porque sou um policial”, afirmou em entrevista coletiva. No caso dos bombeiros, o comando fica sob o controle do secretário de Defesa Civil, Sérgio Simões, que deverá cuidar das mesmas reivindicações. No ano passado, o governador Sérgio Cabral não recebeu as lideranças do movimento, o que gerou uma onda de revolta ainda maior.
“Tenho o maior respeito pela instituição policial, mas a maneira de se conseguir as coisas na vida parte da ordem e do diálogo”, disse Beltrame. O secretário lembrou que em 2012 e 2013 os policiais receberão aumento de mais de 36%. “De janeiro de 2007 até 2013 (gestão de Cabral) o aumento passará de 100%. O problema talvez não se dê pelos percentuais. Tem que perceber que existe um hiato grande na capacidade de compra dos policiais”, argumentou. Para Beltrame, se o aumento tivesse começado a ser dado há mais anos, essa situação de greve iminente não estaria acontecendo.
Para acalmar a população, o secretário afirmou haver mais de um plano de contingência para o caso de os policiais cruzarem os braços na sexta. “O compromisso da secretaria de Segurança é o interesse público, a paz e a manutenção da ordem. Que a sociedade fique tranquila porque temos mecanismos para prover o que é nossa obrigação”, assegurou.
Os bombeiros reivindicam aumento do piso salarial de 1.265,55 (valor que ganha um soldado sem dependentes) para 3.500 reais, elevação do vale-transporte de 100 reais para 350, auxilio alimentação e estabelecimento da carga de 40 horas de serviço por semana. “A questão salarial na segurança pública é um problema nacional”, argumenta Laércio. Os policiais militares querem 60% de reposição salarial para começar as negociações. “Enquanto ficar na lenga-lenga de oferecer 5% ou 10%, não atingirá nossa meta. O estado ficou muito tempo sem mexer no salário. Conta de luz e alimentação aumentaram. Só o salário da PM que não”, diz o presidente do Clube dos Cabos e Soldados da Polícia Militar, Jorge Lobão.
A Polícia Civil pede vinculação do salário dos servidores ao do delegado, plano de saúde, incorporação da gratificação ao salário e redução das parcelas do reajuste, que seria escalonado até 2014, pelo plano de recomposição salarial dos bombeiros. “Quem trabalha nas delegacias legais recebe gratificação de 850 reais. Se o policial sair de lá, perde esse bônus. Hoje, cerca de 40% dos policiais civis recebem essa gratificação e não quer se aposentar para não perdê-la. Há policiais que se aposentam e vão fazer bico aos 70 anos”, argumenta Bandeira.
A aproximação da data marcada pelos sindicatos para a paralisação dos policiais pôs a cúpula da segurança e o próprio governador Sérgio Cabral em alerta. Ao longo da semana, Cabral expôs, em suas aparições públicas e por sua assessoria, os números do reajuste de salário de policiais desde que assumiu o Palácio Guanabara, em 2007. Considerando os aumentos previstos em 2012 (12%, já antecipado pelo governo do estado) e 2013 (24%), o governo do estado chega a um reajuste total de 107% desde o início da era Cabral. O Palácio Guanabara também expõe as despesas com pessoal na PM fluminense, que eram de 916 milhões de reais/ano em 2006 e chegam a 2012 com 2,3 bilhões de reais – aumento de 158%. É preciso considerar, no entanto, que o número de PMS também cresceu, repartindo o bolo.
Gratificações – Para elevar os vencimentos dos policiais, o governo do estado do Rio tem recorrido a gratificações. Com isso, economiza tanto por evitar o inchaço da folha de pagamento como com a possibilidade de colaboração de outros entes públicos. Os policiais que integram as Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), por exemplo, recebem 500 reais de gratificação – 1.000 reais para o comandante de cara unidade. Este dinheiro é um compromisso da prefeitura com o estado, ou melhor: do prefeito Eduardo Paes com o governador Sérgio Cabral, aliados de primeira hora. Os soldados da PM têm ainda a opção de incluir 350 reais ao salário final, com a gratificação disponível para quem se inscreve em cursos de qualificação.
Assim, o salário de ingresso de ingresso na PM fluminense, que é de 1.669,33 reais, pode passar a 2.169,33 reais. O complicador é que as gratificações não atingem toda a corporação: são restritas a quem atua na atividade fim (policiamento e cargos em batalhões operacionais) e excluem os inativos.