Brasil

Polícia sofre com baixos salários e vestígios da ditadura

Segundo o jurista Walter Maiorevitch, a polícia não é 'educada para a democracia, continua sendo um produto da ditadura militar'

Soldados da Força Nacional na Bahia: greve mostra os problemas da polícia, dizem analistas (Christophe Simon/AFP)

Soldados da Força Nacional na Bahia: greve mostra os problemas da polícia, dizem analistas (Christophe Simon/AFP)

DR

Da Redação

Publicado em 8 de fevereiro de 2012 às 12h58.

Rio de Janeiro - A greve dos policiais na Bahia reflete o mal-estar de uma corporação historicamente mal paga e coloca em evidência a necessidade de modernizar esta força que ainda utiliza métodos herdados da ditadura militar (1964-1985), segundo analistas.

Na terça-feira, as negociações para pôr fim à greve fracassaram, em meio ao cerco militar aos cerca de 200 policiais entrincheirados há uma semana no Assembleia de Salvador.

A paralisação da Polícia Militar gerou uma onda de saques, incêndios e mais de 120 assassinatos em nove dias, mais do que o dobro da semana anterior, o que obrigou o governo brasileiro a enviar tropas para garantir a segurança do estado.

Estes policiais militares armados (a PM) prometeram "resistir" se forem desalojados à força. Mais de mil soldados cercam a Assembleia desde domingo.

O Brasil tem uma das maiores taxas de homicídios do mundo - cerca de 40 mil por ano, segundo o Ministério da Justiça -, dois terços cometidos com armas de fogo. A esta violência soma-se a impunidade dos criminosos e a corrupção policial.

"No Brasil, o policial é mal pago e isto abre caminho para a corrupção. Está mal preparado e é violento e isso gera muito medo na população. Não foi educado para a democracia, continua sendo um produto da ditadura militar", disse à AFP Walter Maiorevitch, ex-secretário nacional antidrogas.

"O Brasil não pode ainda garantir a segurança pública em um Estado federal. São 27 estados dotados de seus próprios organismos policiais e judiciais que não se comunicam entre eles", acrescentou Maiorevitch.

Existem três tipos de forças de segurança no Brasil: a Polícia Federal (PF) - com melhor formação e mais bem remunerada - e as polícias Civil e Militar de cada um dos 27 estados.

Um projeto de unificação das polícias Civil e Militar aguarda há anos na Câmara.


"Temos um problema histórico de baixa remuneração. Houve promessas feitas durante a campanha eleitoral e depois Dilma Rousseff retrocedeu. Isto gerou insatisfação na polícia", disse à AFP Sandro Costa, da ONG Viva Rio, que milita pela paz e pelo desenvolvimento social.

Segundo Costa, "a tendência é que as reivindicações dos policiais aumentem" porque nos últimos meses a PM dos estados de Minas Gerais, Santa Catarina, Ceará e São Paulo já fizeram greve e obtiveram promessas de reajustes salariais até 2015.

"Agora o Rio se prepara; uma convocação de greve foi lançada para sexta-feira", acrescentou Costa, informando que Brasília é que possui os melhores salários, enquanto as do Rio estão entre as de salários mais baixos, 1.200 reais iniciais.

"O Congresso Nacional deve mudar a lei para reformular o treinamento e o monitoramento dos policiais", declarou o deputado estadual pelo Rio de Janeiro Marcelo Freixo, presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito sobre as milícias em 2008 e ameaçado de morte desde então.

"A PM responde a um código que data da ditadura militar. Além disso, não há representante do setor. Não fizemos uma transição democrática neste setor", disse.

Para a especialista em violência Alba Zaluar, da Universidade do Estado do Rio, "é evidente que a estrutura militar da PM e dos bombeiros não funciona mais".

"Sua formação é para a guerra, não para proteger o cidadão. Devem ter outra formação, com um plano de carreira. São militares, não podem se sindicalizar e sua situação salarial é complicada", completou.

Acompanhe tudo sobre:América LatinaDados de BrasilGrevesseguranca-digitalViolência urbana

Mais de Brasil

Ações isoladas ganham gravidade em contexto de plano de golpe, afirma professor da USP

Governos preparam contratos de PPPs para enfrentar eventos climáticos extremos

Há espaço na política para uma mulher de voz mansa e que leva as coisas a sério, diz Tabata Amaral

Quais são os impactos políticos e jurídicos que o PL pode sofrer após indiciamento de Valdemar