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PF coloca Michel Temer na berlinda — de novo

Prisão do núcleo de amigos do presidente na Operação Skala, deflagrada nesta quinta, gera ameaça de terceira denúncia e nova paralisia do governo

Temer: receio no Planalto é que PF e a PGR tenham reunido indícios suficientemente fortes para comprometer o presidente (Cristiano Mariz/VEJA)

Temer: receio no Planalto é que PF e a PGR tenham reunido indícios suficientemente fortes para comprometer o presidente (Cristiano Mariz/VEJA)

Raphael Martins

Raphael Martins

Publicado em 29 de março de 2018 às 18h09.

Última atualização em 29 de março de 2018 às 19h15.

Depois de duas denúncias criminais, por corrupção passiva, obstrução de Justiça e organização criminosa, o presidente Michel Temer é atingido em novo escândalo. A prisão nesta quinta-feira do ex-coronel da Polícia Militar de São Paulo João Batista Lima Filho, de seu amigo e ex-assessor especial José Yunes e do ex-ministro da Agricultura Wagner Rossi (MDB-SP) coloca praticamente todos os homens de confiança do presidente que não têm foro privilegiado na cadeia, ao menos temporariamente.

Estão detidos também o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (MDB-RJ), a quem Temer disse que confiava a resolução de todos os seus problemas, Henrique Eduardo Alves (MDB-RN), seu ex-ministro do Turismo e parceiro dos tempos de Câmara, e Rodrigo Rocha Loures (MDB-PR), também ex-assessor de Temer que foi flagrado com uma mala de 500.000 reais em dinheiro vivo que aliados garantem que nada tem a ver com o presidente. Ainda neste grupo, há Geddel Vieira Lima (MDB-BA), ex-ministro-chefe da Secretaria de Governo, a quem se atribui a responsabilidade por 51 milhões de reais em dinheiro vivo encontrados em um apartamento em Salvador no ano passado.Livres estão Temer, o ministro da Secretaria da Presidência, Moreira Franco (MDB-RJ), e o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha (MDB-RS).

Nesta quinta, o inquérito dos portos deu mais um passo em direção à possível culpa do presidente. EXAME conversou com parlamentares da base e consultores políticos de Brasília para entender os efeitos. Todos pediram anonimato, pois estão ainda formulando suas análises oficiais. O temor no Planalto é que Polícia Federal e a Procuradoria-Geral da República, ao prender um núcleo extremamente próximo do presidente, tenham reunido indícios suficientemente fortes para a chegada de uma terceira denúncia. A extensão da operação é incerta, pois as investigações estão sendo conduzidas em sigilo de Justiça pela PF e PGR. Tudo indica que o ex-diretor-geral da Polícia Federal Fernando Segóvia estava errado quando disse que a PF já teria apresentado denúncia contra o presidente se houvesse provas. As prisões e os mandados de prisão têm por objetivo juntar mais documentos para comprovar o envolvimento dos suspeitos. No limite, uma terceira denúncia por corrupção pode surgir contra Michel Temer.

A Procuradoria-Geral da República informou em nota à imprensa que os mandados foram pedidos ao Supremo pela procuradora-geral, Raquel Dodge, no inquérito dos portos. A autorização para as prisões foi dada pelo relator do caso, ministro Luís Roberto Barroso, por indícios de corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Temer e a trupe são investigados por recebimento de propina na edição do decreto em troca de benefícios a empresas do setor portuário em Santos, porto que é zona de influência de Temer há anos. Foi preso também Antônio Celso Grecco, dono da Rodrimar, empresa que está no centro da negociação do decreto.

É com pouca informação que a Casa Civil se reuniu nesta quinta para medir o ânimo dos parlamentares para cumprir as agendas que o governo manda ao Congresso. O custo político das delações e ações controladas dos sócios do grupo J&F, em maio do ano passado, atrasou de forma determinante a tramitação da reforma da Previdência. Parlamentares venderam caro o apoio para salvar o mandato do presidente e viraram as costas quando a Previdência voltou para a pauta. Com a nova operação, o mesmo pode acontecer neste ano com a agenda de reformas microeconômicas e de privatizações propostas pelo governo.

Sem votos para aprovar a reforma das aposentadorias e precisando de popularidade, o Planalto convocou a intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro. Em pesquisas internas, quatro de cada cinco brasileiros indicaram apoiar a medida. Calcado nessa agenda popular e em pautas como a privatização da Eletrobras, Temer passou a sinalizar que poderia ser candidato à reeleição em 2018 se as medidas dessem certo.

A intervenção já enfrenta dificuldades. O general Walter Souza Braga Netto, escolhido como chefe da operação, recebeu um terço do dinheiro que avaliou necessário para colocar o policiamento do Rio em ordem, cerca de 1 bilhão de reais. Nesta semana, foi anunciado que o exército ajudaria no patrulhamento apenas durante o dia — justamente quando há menos índice de perigo. A sensação de segurança dos cariocas da periferia mudou pouco.

Agora, a ameaça se estende ao Congresso. Com as eleições próximas, o custo de barganha dos parlamentares para aprovar reformas difíceis sobe pela iminência de se associarem a pautas de um governo enterrado em corrupção. Ainda que o constrangimento não seja da magnitude das denúncias do ano passado, será mais difícil que parlamentares comprem a briga do governo em votações mais controversas como a reoneração da folha de pagamentos. “Tão perto das eleições, um parlamentar não vai se indispor com setores produtivos da economia se não tiver pretensões de uma aliança no futuro. Com o MDB tão embrenhado em casos de corrupção, essa vontade se dissipa”, diz um analista de Congresso. A análise geral é de que Temer perde força como possível candidato.

A tendência, portanto, é que parlamentares prefiram a agenda de segurança pública, uma das principais preocupações do eleitorado para este ano, em ações localizadas em seus currais eleitorais. Da agenda de medidas do governo, a privatização da Eletrobras deverá ter preferência, uma vez que para ela ocorrer é preciso apenas uma aprovação por maioria simples no Congresso. O risco da privatização afundar fez as ações da estatal fecharem o dia em queda de 0,52%.Uma nova denúncia, contudo, enterrraria todos os planos e colocaria o governo em um custoso banho-maria, sem força para nada, até o fim do mandato.

A articulação política já começou: o ministro Carlos Marun (MDB-MS) apressou-se em dizer que o presidente “não tem nada a ver com isso”. Ontem, o ministro dos Transportes, Portos e Aviação Civil, Maurício Quintella, disse que a área da Rodrimar seria relicitada. “Não haverá prorrogação [da concessão] em relação à área da Rodrimar”, disse Quintella. A tentativa de tirar importância da pauta não adiantou. Menos de uma semana após Temer dizer à revista Istoé que quer ser candidato em outubro, os esquemas voltam a explodir em seu colo.

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