Brasil

Perfis de paródia se organizam em apoio a Bolsonaro e contra a imprensa

Organizadas por uma central que ganhou força após a exclusão de contas pelo Twitter, sátiras misturam notícias tendenciosas com piadas

Twitter: a Pública analisou 90 dessas contas e descobriu quem são os responsáveis e como se organizam na rede (Dado Ruvic/Reuters)

Twitter: a Pública analisou 90 dessas contas e descobriu quem são os responsáveis e como se organizam na rede (Dado Ruvic/Reuters)

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Da Redação

Publicado em 18 de fevereiro de 2019 às 11h54.

Última atualização em 19 de fevereiro de 2019 às 15h08.

Gobo News, Mônica Bengamo, Ual notícias, Vilma Russeffi. Trocadilhos com o nome de veículos de comunicação, jornalistas e políticos são usados como títulos para usuários de paródia no Twitter.

Porém, autodeclaradas “humorísticas” ou “satíricas”, essas contas divulgam notícias falsas entre postagens irônicas e críticas à imprensa. Ao longo de um mês, a Pública analisou 90 dessas contas e descobriu quem são os responsáveis e como se organizam na rede.

Criadas em sua maioria a partir de janeiro de 2018 – das 90 analisadas, apenas 12 foram criadas antes dessa data –, as contas satíricas ganharam visibilidade no início do ano, quando a Folha de S.Paulo (a verdadeira, não a sátira) denunciou a confusão causada pelas paródias na rede, em matéria publicada no dia 5 de janeiro.

Na ocasião, uma postagem de um perfil de sátira da jornalista Mônica Bergamo precisou ser desmentida, pois usuários não haviam compreendido que se tratava de uma paródia. O post dizia o seguinte, imitando o tom sério usado pela jornalista: “O PT entrou com uma liminar pedindo a anulação do projeto do Bolsonaro com Israel para acabar com a seca no Nordeste. ‘A seca no Nordeste é cultural, quase um patrimônio, não deve ser destruída’, disse Gleisi Hoffmann”. Posteriormente, o tweet foi excluído.

A presidente do PT foi a público esclarecer que não disse tal afirmação. A jornalista satirizada também se pronunciou. “Tentam usar a credibilidade de nosso trabalho jornalístico para enganar as pessoas. Dizem ser paródia quando na verdade disseminam infos falsas”, publicou em seu perfil oficial no dia 4 de janeiro.

A confusão se deu porque a conta responsável pela postagem utilizava nome de usuário (@MonicaBengamo, com “N”), foto de perfil e texto muito parecidos aos do Twitter oficial da jornalista Mônica Bergamo.

Além disso, a sátira simulava o símbolo de perfil autenticado no Twitter, usando o emoji de um furacão. A matéria da Folha mostrou outras contas que se utilizavam de estratégias parecidas, como a @STFoficianal, que ironizava postagens oficiais do STF, entre outras.

Muitas delas se diziam filiadas a um perfil chamado “Central da Imprensa Satírica Brasileira”, ou CIS, que retuitava suas publicações.

A reação das sátiras

Após as denúncias, o Twitter excluiu mais de 20 contas de paródia. Como resposta, os perfis satíricos se uniram em torno da hashtag #SátiraNãoÉFake, criticando o que chamaram de censura do Twitter. Muitas das contas deletadas criaram novos perfis e contas reservas, se precavendo para o caso de novas exclusões.

A hashtag chegou aos Trend Topics (assuntos mais comentados) do Twitter no Brasil entre os dias 4 e 8 de janeiro. Ela foi publicada 19.400 vezes, por 11 mil usuários diferentes, conforme análise enviada pela pesquisadora digital Luiza Bandeira, da organização Atlantic Council, à Pública.

Dessas publicações, 77,4% foram retuítes, ou seja, republicações de postagens – um número um pouco acima da média para a rede, mas sem indício de robotização, segundo Bandeira.

Para a pesquisadora, o que ocorreu foi uma coordenação, não uma automação. “Ela [a repercussão da hashtag] é orgânica, mas tem alguém que fala ‘ai vamos subir isso?’ É como um comportamento de fã, tipo um fã clube de um cantor.”

O relatório de Luiza ainda mostra que o tuíte mais compartilhado que usava a #SátiraNãoÉFake foi a do cantor Lobão, artista popular entre eleitores de direita e ultradireita, que tem alavancado muitas hashtags no Twitter. A postagem teve 1.700 retuítes e foi publicada no dia 5 de janeiro, logo após a reportagem da Folha.

O terceiro post com mais interações foi do perfil @SoldadoBolsonaro, uma sátira da conta oficial do presidente, filiada à Central da Imprensa Satírica Brasileira. A publicação pedia que os seguidores “subissem” a hashtag através de retuítes.

https://twitter.com/JairCapitao2/status/1081687841401421825

Muitos dos perfis de paródia excluídos também criaram perfis no Gab, rede social de ultradireita que permite aos usuários total liberdade de expressão, inclusive para frases racistas, xingamentos a mulheres e feministas, insultos a LGBTs, como mostra reportagem da Pública. Das 90 contas analisadas, 10% possui perfil na plataforma.

Uma central para atacar a imprensa

Entre os perfis excluídos pelo Twitter estava o da CIS, um perfil que, além de publicar suas próprias sátiras, retuitava e divulgava outras contas de paródia.

Depois disso, além de abrir conta no Gab – sua única postagem foi: “Twitter é uma rede social de esquerdistas vagabundos” –, a central criou um novo perfil no Twitter com mais publicações diárias e filiados. À Pública, a CIS negou que a conta do Gab seja deles. Desde o dia 25 de janeiro também, há um portal com postagens de outras contas de sátira e uma novidade: “notícias” próprias, dessa vez sem usar do humor.

A primeira postagem da nova conta da CIS foi uma imagem listando 28 perfis de sátira que foram deletados da rede social e denunciando o Twitter.

No site, eles divulgam 12 perfis de sátira: Soldado Bolsonaro, Portal Comunista, O Protagonista, UAL notícias, Gaulo Puedes (renomeado para Jair M. Bolsoarmado), Passarinho Opressor, Revista VistoÉra, Motel? Privado, Globol, Barril 247, The Comunista e Vilma Russeffi.

O levantamento da Pública mostrou outras 12 contas de paródia que afirmam fazer parte da Central, ou são constantemente retuitadas pelo perfil da CIS. São elas: Brasil Independente, Carcada Livre, Cristiane Loba, CBFN, Estadinho, The Ecomunist, Gerson Camarada, Gobo News, Globobo News, Merdal Pereira, Instituto CIS pesquisa, e IBGtalvezÉ.

Em entrevista à Pública, os responsáveis pelo site afirmaram que são cerca de 35 a 40 perfis de sátira filiados, mas eles não divulgaram exatamente quantas são as contas. Segundo as regras e normas de conduta publicadas no site, não é permitido divulgar a lista de perfis filiados para evitar exclusões em massa.

Além disso, qualquer perfil pode se filiar à Central, desde que as contas sigam umas às outras e retuítem seus conteúdos. As contas também são incentivadas a subir hashtags consideradas importantes pelos membros, como por exemplo #LulaLivre2043 – em comemoração à segunda condenação do ex-presidente que adicionou outros 12 anos à sua prisão –, que foi utilizada por pelo menos 10 perfis de sátira.

É proibido ainda interagir com hashtags “de esquerda”. “Lembrem-se, não trabalhamos para a esquerda nem mesmo em tom irônico”, ressalta o documento.

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Mais do que produzir humor, essas contas têm como missão declarada criticar a imprensa e a esquerda. “Nosso objetivo é informar com agilidade de forma divertida trazendo a público a desinformação desnecessária e tendenciosa divulgada em outras mídias”, explicam no site.

Os responsáveis

A Central é coordenada por Alexandre Fernandes Oliveira, ou Alex Diferoli, como se apresenta no site. O domínio foi registrado em seu nome pela primeira vez no dia 14 de setembro de 2017. O site entrou no ar como um portal no dia 25 de janeiro deste ano.

“No fim de 2018 percebemos que vários perfis sátira de direita começaram a aparecer, e começamos seguir uns aos outros. Decidimos então criar um perfil que nos representasse. Este perfil cresceu e ideias diferentes para melhoria e autoajuda entre os perfis começaram a aparecer. Chegamos a dizer que éramos um “sindicato” e zoamos dizendo que isso era coisa de comunista”, disse Alexandre em entrevista à Pública.

Ele tem apenas 120 seguidores no Twitter e, apesar de ter conta desde 2009, só começou a postar ativamente no dia 10 de janeiro, poucos dias depois da exclusão das contas de sátira da plataforma. A partir de então ele replica manchetes de jornais e retuíta postagens de perfis de sátira diariamente.

No entanto, um outro perfil vinculado a ele, @arquivoxandy, publica quase diariamente um relatório de pessoas que visitaram seu perfil, intercalando com publicações anti-PT e pró- Bolsonaro. Alexandre também assina alguns dos textos no portal da CIS.

São citados como outros criadores da CIS, Marllon Dionizio, conhecido nas redes sociais como Dr. Marllão, e Sandra Lima. Cada um deles administra seu perfil pessoal e possui uma conta de sátira, embora não digam quais são essas contas. Outros perfis pertencem a pessoas anônimas.

“Por que eu amo meu Brasil e quero que ele seja o melhor lugar do mundo pra viver!! Sou Bolsonaro com muito orgulho, cada dia mais!!” Assim Sandra se apresenta em seu Twitter, com 7 mil seguidores. Em seu Instagram, ela divulga eventos em boates de São Paulo.

Recém-graduado em direito, Marllon é fundador da Aliança Conservadora Estratégica (Alice), um “movimento que visa unir e organizar pessoas com o pensamento conservador, além de propagar a defesa e divulgação dos interesses superiores da nação”.

No Twitter, o perfil criado em novembro de 2018 possui apenas 455 seguidores e segue 16 pessoas. Ele possui um canal de YouTube sem muita repercussão – apenas 918 inscritos –, onde publica vídeos sobre política e de apoio a Jair Bolsonaro.

No dia 10 de janeiro, Marllon publicou em seu canal uma entrevista com os administradores de algumas contas paródia excluídas pelo Twitter. Sem dizerem os nomes ou mostrar o rosto, os entrevistados afirmam ser independentes e que se conheceram através da rede. Mas o principal tema gira em torno do repúdio à imprensa.

“A intenção [da criação de contas de paródia] é justamente tirar sarro da grande mídia. Eles acham que a gente é bobo, fazem toda a porcaria que fazem e ainda querem que a gente pague por isso. É o que eu sempre digo, a diferença entre as histórias que a gente inventa e as que eles inventam é que pelo menos as nossas histórias são engraçadas”, diz o responsável pelo perfil GI, paródia do G1.

“O que eles não aceitam é que eles fazem a fake news e a gente faz a gozação em cima da fake news deles. E isso eles não toleram. Eles se sentem perseguidos por nosso trabalho porque de uma certa maneira a gente expõe de uma forma engraçada a porcalhada de imprensa que eles estão fazendo ultimamente”, fala a administradora do perfil “O protagonista”. “Realmente tenho que concordar com vocês, o nível do jornalismo brasileiro já foi melhor”, responde na entrevista Marllon.

https://twitter.com/Tofuemalpago/status/1092806827597795330

Alexandre admite que as sátiras geram confusão nos leitores, mas não acredita que seja responsabilidade delas. “O pessoal confundia a gente com fake news. Tínhamos nomes, biografia e logo diferente dos perfis oficiais, sem ter selo de verificação. Portanto, não podem imputar a nós a propagação de fake news se houve falta de censo crítico, e em alguns casos até de leitura, por parte dos demais usuários”, afirma.

Procurado, o Twitter não especificou quais foram as regras desrespeitadas pelos perfis de paródia deletados “devido a questões de privacidade e segurança”. Segundo sua política específica para contas de paródia, deve-se descrever claramente que se trata de uma conta satírica.

A plataforma diz não monitorar ativamente o conteúdo publicado pelas contas e só exclui caso haja denúncia de violação dos Termos de Uso. Para denunciar perfis de paródia, deve-se registrar ocorrência de falsa identidade ou marca registrada.

“No intuito de proteger a experiência e a segurança das pessoas que utilizam a plataforma, o Twitter tem que estabelecer os conteúdos e comportamentos que permitimos. Quando tomamos conhecimento de potenciais violações a essas regras, como conduta de spam ou evasão de suspensão, fazemos uma análise e adotamos as medidas cabíveis de acordo com nossas regras e termos de serviço”, disse a plataforma em nota enviada à Pública.

Os perfis de paródia, contudo, alegam não desrespeitar os termos de uso do Twitter e consideram as exclusões um ato de censura.

“Todas as contas foram orientadas a deixar bem claro essa informação de que somos perfil de paródia/sátira na bio, não foram descumpridas as regras e as alterações solicitadas pelo Twitter foram prontamente atendidas”, afirma Sandra.

Encabeçadas pela CIS, as paródias criaram uma petição online direcionada ao Superior Tribunal de Justiça. Eles pedem que o órgão determine a reintegração imediata dos perfis excluídos e a punição do Twitter, sob o argumento de que a plataforma agiu contra o princípio da liberdade de expressão garantido pelo artigo 5º da Constituição Federal, ao excluir apenas perfis ligados à direita.

Segundo os perfis que tiveram contas deletadas, o Twitter não deu explicações sobre o motivo das exclusões. “A exclusão ocorreu por conta de denúncias oriundas de perfis oficiais, jornalistas e políticos, e também de militantes de esquerda que se uniram em torno de listas que divulgamos com os perfis para serem seguidos”, defende Sandra. “Não descartamos a ideia de mover um processo, pois nos sentimos tolhidos em nossa liberdade de expressão.”

A causa anti-imprensa

Além da articulação contra a exclusão de contas do Twitter através da hashtag #SátiraNãoÉFake, as contas de paródia também se organizaram em campanhas anti-imprensa nas redes sociais. Somente em janeiro, duas hashtags críticas a jornais brasileiros chegaram aos Trending Topics do Twitter no Brasil – #GloboLixo e #EstadãoFakeNews. Ambas surgiram após os respectivos veículos publicarem reportagens que denunciavam aliados de Bolsonaro.

A #EstadãoFakeNews teve seu ápice no dia 21 de janeiro, em resposta a uma matéria do jornal que dizia que os eleitores de Bolsonaro haviam se desorganizado na rede depois da vitória nas eleições. Ofendidos, os apoiadores, e o próprio presidente, subiram essa hashtag, totalizando 247 mil menções.

De maneira parecida, #GloboLixo chegou a figurar no primeiro lugar entre os assuntos mais comentados na rede brasileira no dia 22 de janeiro, após o jornal O Globo ter publicado reportagem que traçava relação entre Flávio Bolsonaro e milicianos no Rio de Janeiro. Foram 44 mil menções à hashtag. Entre as postagens mais republicadas estão duas dele, novamente: o cantor Lobão.

Com menos visibilidade, os perfis de sátira se envolveram nesse movimento. “Quando gostamos de uma hashtag e sentimos que seja uma causa que também é nossa, participamos das ações, sim”, afirmou Sandra Lima à Pública, se referindo às hashtags #EstadãoFakeNews e #GloboLixo.

“Quando você vê as tags #EstadaoFakeNews e #GloboLixo liderando os trends do Twitter, você percebe que está do lado certo da força!”, publicou o perfil Gerson Camarada, sátira do jornalista Gerson Camarotti. A conta foi suspensa pelo Twitter posteriormente.

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Sátiras amigas de Bolsonaro

A proximidade do presidente com as sátiras não se restringe ao discurso. Em levantamento, a Pública analisou 90 contas de paródia no Twitter e concluiu que o perfil oficial de Jair Bolsonaro foi o mais seguido por elas – 82% das contas analisadas o seguiam. Entre as filiadas à CIS, todas, exceto pela conta @PassarinhoOpressor, seguem o presidente.

Em segundo lugar ficou o @Isentões, que se descreve como “a mais importante conta da plataforma bolsonarista de comunicação no Twitter”.

No dia 5 de fevereiro, a conta foi suspensa do Twitter, mas os responsáveis guardavam um perfil reserva que hoje está ativo e com mais de 240 mil seguidores.

Os filhos de Bolsonaro também estão entre os mais seguidos pelas contas satíricas. Carlos Bolsonaro ficou em 3º lugar, Eduardo em 6º e Flávio em 9º.

Nos “top 10” também estão personalidades ligadas à direita, como o humorista Danilo Gentili, em 5º lugar, seguido por 64% das contas; o músico Lobão, em 8º lugar, com 60% das contas como seguidores.

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E eles seguem de volta. Pelo menos seis, entre os seletos 320 perfis seguidos por Jair Bolsonaro, são de sátira à imprensa. Até a data de publicação desta reportagem, ele seguia a Falha de São Paulo, o Blog do Blabla, The Comunista, Barril 247, G1 (@cor0te), G1 (@fatosesquerda).

O presidente costuma replicar os conteúdos satíricos. No dia 5 de janeiro ele retuitou postagem do The Comunista que dizia “Bolsonaro começa o dia tornando ilegal qualquer coisa vinculada ao arco-íris, ursinhos carinhosos, ódio do bem e LGBT”.

Ele também mostrou solidariedade às sátiras excluídas pelo Twitter, retuitando postagem do perfil Joaquin Teixeira que ironizava a situação.

“Vamos dar boas vindas aos temidos perfis de paródia. Entraram no seleto grupo que ‘ameaça a democracia’ ao lado da tia da igreja, do tiozão do churrasco, zap-zap, piadas e feique news”, dizia o post publicado no dia 7 de janeiro.

Para especialistas, paródias confundem

Além da confusão causada pela semelhança entre os nomes de usuário e fotos dos perfis, alguns perfis de paródia misturam informações reais ou opiniões editorializadas em meio às sátiras.

A própria CIS publica em seu site matérias e artigos de opinião sem ironia. A primeira matéria foi publicada no dia 30 de janeiro e mostrava as porcentagens de seguidores robôs de alguns perfis famosos no Twitter, obtidos através do aplicativo Twitter Audit.

A matéria mostrava que os perfis considerados de esquerda tinham maior porcentagem de seguidores considerados robôs do que as páginas de direita, colocando essas páginas sob suspeita.

Contudo, o Twitter Audit não é uma maneira precisa de identificar seguidores bots, especialmente quando as contas monitoradas possuem muitos seguidores, pois ele trabalha com uma amostragem de até 5 mil seguidores, não analisando todos os perfis.

A matéria foi divulgada por muitas das contas de sátira relacionadas à CIS e teve grande repercussão, sendo curtida pela conta oficial de Jair Bolsonaro.

No dia 1º de fevereiro, o portal publicou outro texto, dessa vez de opinião. Tratava-se de um apoio à ministra Damares Alves, alvo de polêmicas na internet. O texto defende que a ministra está sofrendo perseguição por militantes da esquerda e pela mídia, e foi assinado por Sandra Lima, cofundadora da CIS.

“O intuito principal é fazer comédia através das paródias, mas eventualmente podemos, sim, propagar notícias reais. Em alguns casos, os usuários acham que até os perfis oficiais [de notícia] são paródia devido a algumas notícias sem credibilidade e importância”, explica o fundador da CIS.

Sátira ou fake?

As sátiras estão incluídas dentro do espectro de desinformação desenvolvido pela pesquisadora americana Claire Wardle, do First Draft – organização que discute a poluição informacional digital. Para ela, as paródias podem ser enganosas de duas maneiras.

A primeira é quando o conteúdo caminha pelas redes e é retirado de contexto, ele pode confundir as pessoas. A segunda é quando pessoas usam a sátira para intencionalmente disfarçar uma informação enganosa.

“Chamar um conteúdo de sátira pode ser usado como tática para confundir o leitor e também os jornalistas checadores. Afinal, não é possível checar algo que não se diz um fato.”

Algumas características indicam se o conteúdo se trata de uma sátira verdadeira ou se apenas está sendo rotulado de sátira como estratégia. Uma delas é identificar se beneficia apenas uma pessoa ou grupo.

“Verdadeiras sátiras têm como objetivo fazer piadas, tirar sarro, principalmente sobre política. Mas, se você é um humorista, você vai querer brincar com quem está na direita e também na esquerda. Você vai querer fazer humor em tudo que trouxer audiência e conteúdo. Então, se você se deparar com uma sátira que é apenas boa para um lado ou para certo assunto, é problemático.”

Mesmo em sites que não têm a intenção de propagar desinformação, a paródia pode ser mal compreendida. Segundo estudo da Universidade Estadual do Colorado, nos EUA, menos da metade das pessoas (46,5%) consegue identificar corretamente uma notícia satírica. A maioria acredita tratar-se de uma notícia séria, ou uma notícia falsa, sem entender a ironia.

“As pessoas geralmente têm sentimentos muito fortes e ruins em relação à política, e a sátira torna isso mais leve e atraente”, explica Chianna Schoentaler, uma das pesquisadoras. “Mas, com a evolução das tecnologias sociais e o surgimento das fake news, as sátiras também viraram uma forma de confundir.”

“Para mim, sátiras podem fazer até alguém ganhar uma eleição. Uma campanha inteira pode ser feita em cima de sátiras, manipulando as pessoas. Afinal, pode-se dizer qualquer coisa ironicamente, dando margem para a interpretação literal”, afirma Michelle Bedard, coautora da pesquisa.

A possibilidade de fazer sátiras online ou offline é protegida por lei através da liberdade de expressão. “A proteção à liberdade de expressão não anula a proteção à honra das pessoas, então eu posso falar o que eu quiser, mas eu sou responsável pelo que eu disser ainda que seja humor”, explica o professor Diogo Rais, professor de direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie e da Fundação Getulio Vargas (FGV).

A situação se agrava se o perfil se passar por outra pessoa, pois o dano passa a ser intencional. “Tanto o perfil de sátira quanto o perfil fake trata-se de mentiras, mas o primeiro é uma mentira sem a ideia de enganar. O que define uma fake news é um elemento que contém uma falsidade que é proposital e que causa dano a alguém. Só nesse caso o direito deve agir”, defende Rais.

Para ele, contudo, existem paródias com a intenção de enganar. “Usar a mesma marca pode ser uma evidência de indução ao erro”, exemplifica ele.

Ainda assim, deletar os conteúdos nem sempre é a melhor opção, segundo o especialista em direito digital da Artigo 19, Paulo José Lara. “Essas derrubadas instantâneas e sumárias de conteúdo não têm o efeito que se desejaria, que é a diminuição da busca pela desinformação. Pelo contrário, elas apontaram por uma coesão muito maior desses grupos e de uma intensificação do ataque à mídia.”

Para Rais, a solução também pode vir dos usuários. “Na internet nós somos curadores do conteúdo, então também temos um papel de responsabilidade”, conclui.

*Este conteúdo foi publicado originalmente no site da Agência Pública.

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