PCC: Rogério Jeremias de Simone, o Gegê do Mangue, maior liderança do Primeiro Comando da Capital (PCC) nas ruas, foi assassinado no Ceará (Reprodução/Reuters)
Estadão Conteúdo
Publicado em 3 de junho de 2018 às 17h54.
São Paulo - A morte do líder do Primeiro Comando da Capital (PCC) Rogério Jeremias de Simone, o Gegê do Mangue, desencadeou uma investigação que descobriu novos segredos da maior facção criminosa do País.
Documentos encontrados pela polícia revelaram parte da estrutura montada pelos líderes do PCC para o tráfico internacional de drogas, a lista de seus integrantes em cada região de São Paulo, nos Estados e em cinco países da América do Sul - Colômbia, Paraguai, Bolívia, Peru e Guiana.
A inteligência policial tem provas da evolução das rendas do grupo e sua ligação com o primeiro cartel de drogas chefiado por um brasileiro: Gilberto Aparecido dos Santos, o Fuminho.
Os negócios particulares dos líderes e da própria facção têm um faturamento estimado pela inteligência policial em, no mínimo, R$ 400 milhões por ano. Alguns policiais acreditam que esse número pode chegar a cerca de R$ 800 milhões, o que colocaria o PCC entre as 500 maiores empresas do País.
Seu tamanho dependeria da quantidade de drogas que o cartel liderado por Fuminho e os líderes do PCC conseguem exportar nos Portos de Santos, Itajaí, Rio e Fortaleza. Estimativas conservadoras fixam em 1 tonelada por mês, enquanto analistas policiais consideram que esse número corresponde apenas ao movimento de uma semana.
Entre as descobertas feitas pela inteligência policial estão remessas da facção para um doleiro da capital paulista. Em 9 de dezembro de 2017, um dos grupos responsáveis pelo tráfico internacional de drogas entregou R$ 1.464.118 ao doleiro. Em 16 de dezembro, foram enviados mais R$ 1.522.374 e no dia 21, R$ 1.105.651. Em duas semanas, a soma chega a mais de R$ 4 milhões. A contabilidade mostra que em uma única vez, em dezembro de 2017, o bando gastou R$ 2,5 mil para comprar malas para entregar o dinheiro.
As remessas continuaram em janeiro deste ano. Segundo as investigações, a facção entregava reais ao doleiro e recebia dólares, por meio do sistema dólar cabo, na Bolívia e no Paraguai, para pagar a produção das drogas - cocaína e maconha. O sistema de lavagem da facção inclui ainda a compra de postos de gasolina (200 deles estão nas mãos de laranjas que trabalham para um bandido conhecido como Flavinho).
Esta não foi a primeira vez que a polícia descobriu um esquema de lavagem de dinheiro da facção. Para o promotor de Justiça Lincoln Gakiya, o PCC ainda é uma organização de tipo pré-mafiosa, pois lhe falta conhecimento para fazer a lavagem de dinheiro. Essa seria a última barreira que separa o grupo das demais máfias pelo mundo. "Muitas das operações da facção são feitas em dinheiro vivo, guardado em lugares seguros", diz.
Em 2014, a polícia detectou um esquema que envolvia uma transportadora de cargas fantasma que movimentou R$ 100 milhões por meio de duas corretoras de valores, que enviavam o dinheiro do crime organizado para a China e para os Estados Unidos. As contas da transportadora eram movimentadas pela internet. Essa tarefa era executada por meio de sete IPs com base no Paraguai.
Mortos
Foi no apartamento de José Adinaldo Moura, o Nado, no Tatuapé, zona leste de São Paulo, que o Departamento Estadual de Prevenção e Repressão ao Narcotráfico (Denarc) encontrou os papéis. Nado era o braço direito de Wagner Ferreira da Silva, o Cabelo Duro. Os dois eram acusados de participar no Ceará do assassinato de Gegê do Mangue em fevereiro e acabaram mortos pela facção a mando da cúpula.
Nado morava em um apartamento de cobertura e teria sido executado um dia antes do assassinato de Cabelo Duro, em 22 de fevereiro. No dia 15 de maio, a polícia achou um corpo que seria de Nado. Ele estava enterrado de ponta-cabeça e amarrado em um terreno na região de Americanópolis, zona sul da capital.
Nado e Cabelo Duro trabalhariam para Fuminho, que era apontado como sócio do líder do PCC, Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola. Gegê do Mangue, que havia saído da cadeia em 2017, teria descoberto que eles usavam a logística montada pelo PCC para traficar drogas sem pagar à facção.
Gegê começou a cobrar um pedágio de Fuminho e usou o dinheiro para comprar imóveis no Ceará, em vez de entregá-lo para o caixa do grupo. Ao descobrirem o desvio, Gegê teve o destino selado. Fuminho mandou assassiná-lo. A cúpula reagiu e decidiu matar os envolvidos na execução. Só depois de Fuminho apresentar as provas de que Gegê estava roubando o grupo é que a cúpula decidiu perdoá-lo. Os pontos de varejo de drogas dominados por ele em São Paulo - região da Avenida Presidente Wilson e na Favela de Heliópolis -, que haviam sido tomados pela facção, foram devolvidos recentemente pelo PCC.
Sucesso
O sucesso de Fuminho no tráfico atraiu outros bandidos para a atividade. "Grupos de ladrões de carga, de carro-forte e de banco passaram a se juntar para investir no tráfico internacional de drogas", disse o delegado Ruy Ferraz Fontes, diretor do Denarc. Para conseguir grandes quantidades da droga e enviá-la para a Europa - os Estados Unidos são um mercado cativo dos cartéis mexicanos -, os bandidos aproveitam a logística do PCC. Os ladrões se unem em grupos e compram a cocaína para montar um carregamento e embarcá-la em contêiner. Esse movimento começou a tirar o espaço no Brasil da máfia nigeriana no tráfico.
Em 18 de abril, policiais civis que vigiavam um galpão no Guarujá surpreenderam uma dessas partidas. A droga chegou em picape S-10. Uma hora depois, o portão se abriu e saíram a picape, um Fiorino e um caminhão que transportaria um contêiner. Quando o grupo foi abordado pelos policiais, a escolta do caminhão reagiu a tiros de fuzil, ferindo um investigador. Sete acusados foram presos e 213 quilos de cocaína apreendidos - outros três bandidos fugiram, deixando para trás um fuzil e uma pistola calibre 45.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.