PAULO REMY, DA WTORRE: país precisa de uma reforma na constituição / GERMANO LÜDERS
Letícia Toledo
Publicado em 19 de abril de 2016 às 12h18.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h50.
A construtora WTorre enfrenta dificuldades como tantas outras companhias de seu setor. Mas uma preocupação ela não tem: ver cair o preço de suas ações na bolsa. Quando a BM&F Bovespa vivia uma ótima fase, a WTorre planejou abrir o capital por duas vezes, em 2007 e 2010. Em ambas as ocasiões, desistiu nos últimos instantes, enquanto as concorrentes realizavam IPOs faraônicos. Diante da crise atual, a empresa já demitiu 27% de seus funcionários em dois anos. E começou a se desfazer de ativos. No ano passado, vendeu 50% do WT Morumbi, um prédio de escritórios em São Paulo, por um preço estimado em 530 milhões de reais. E se concentrou em entretenimento — em março inaugurou o teatro Santander, em São Paulo. Em entrevista a EXAME, o presidente da empresa, Paulo Remy, conversou sobre os desafios da WTorre e do país.
A WTorre planejou abrir o capital duas vezes, em 2007 e em 2010. Boa parte das construtoras abertas viu suas ações derreter. Hoje é uma vantagem não estar na bolsa?
O fato de não termos ido para a bolsa nos beneficia muito na situação de hoje. Nós decidimos não fazer IPO por questões de preço e uma visão de negócios. Quando todo mundo estava indo bem, fomos bastante criticados, mas não quer dizer que hoje eu estou feliz por não ter feito IPO e ver todo mundo derrotado. O negócio mudou, nossa empresa também mudou, a gente saiu da área de prédios comerciais e da área residencial, que são os focos das empresas listadas na bolsa.
A WTorre também enfrenta dificuldades nesta crise. A dívida da empresa está em 900 milhões de reais e o mercado não tem muito espaço para mais lançamentos. Como estão lidando com a crise?
Nossa dívida é consciente. Existe porque temos muitos empreendimentos. A dívida me preocupa? Lógico, ainda mais no Brasil. Mas temos negócios que geram caixa. A WTorre entregou três projetos próprios entre 2015 e começo de 2016. No fim de 2015, vendemos 50% do WT Morumbi, o que ajudou bastante o caixa. Em 2016 estamos enxugando custos e podemos vender ativos, mas ainda assim este ano tende a ser mais positivo.
Vocês também enfrentam dificuldades para pagar as contas do Allianz Parque. No ano passado, vários protestos foram registrados contra a WTorre por falta de pagamento a fornecedores. Como estão trabalhando para resolver esse problema?
As dívidas estão sendo negociadas e pagas. O Allianz é um grande sucesso, um projeto sem recursos públicos, sem nenhuma isenção fiscal. Exigiu um investimento de quase 700 milhões de reais, fomos surpreendidos com o aumento da taxa de juro no meio do caminho. Mas, do ponto de vista financeiro, o retorno está próximo do projetado. Temos atraído grandes shows para o Allianz e vamos continuar mobilizados nisso.
Além do Allianz Parque, a WTorre inaugurou, no fim de março, o teatro Santander. O investimento foi de mais de 100 milhões de reais. O foco da companhia agora é entretenimento?
Essa unidade de negócios é o nosso grande foco, vamos continuar investindo nela. A meta em 2016 é garantir o segundo ano estável para o Allianz Parque e estabilizar a operação do teatro. Quem sabe em 2017 não construímos um novo teatro em São Paulo? Mas, agora, com a situação no país… já ouviu aquela música “Quero paz no meu coração”?
Por onde começar as reformas no Brasil?
Ninguém tem a fórmula. O que temos são alguns caminhos, algumas posições. Se o impeachment fosse a solução de todos os nossos problemas, o mundo seria fácil. Para resolver nosso problema, não basta trocar a presidente da República ou o ministro da Fazenda. Nosso problema é político, econômico, financeiro e, acima de tudo, um problema de Estado. Precisamos definir que Estado nós queremos, não se trata mais se queremos o governo do PT ou o do PSDB. Precisamos de reformas.
Que tipo de reforma?
Estamos vivendo num Estado onde todo mundo quer receber uma parte, só que ninguém quer contribuir. A gente quer fazer reforma tributária, mas nenhum Estado quer ceder. Temos Bolsa Família, Pronatec, Fies. Todo mundo acha que o Estado tem de dar tudo, mas nós, brasileiros, precisamos definir o que nós queremos. A gente tem de ceder em alguma coisa, o Estado tem de ceder, a Constituição brasileira precisa ser reformulada. Se a gente não fizer isso, não vamos ter uma solução para nossos problemas. É preciso mudar a Constituição, mesmo que isso fira os interesses de alguns. Se todo mundo quiser ganhar, a conta não vai fechar.
Você diz que precisamos de uma reforma no Estado. Por outro lado, a WTorre está dependendo cada vez mais do estado – focando em obras de infraestrutura como o leilão de iluminação de São Paulo. Isso não é contraditório?
Não vemos assim. Passamos para o patamar de investidores em infraestrutura. Não estamos fazendo obras para o governo e sim participando de concorrências na área de infraestrutura. Além do potencial de negócio, antes de entrar em um novo projeto nesta área, também analisamos se o mercado em questão é regulado. Portanto, não vemos contradição pois não estamos fazendo obras públicas com dinheiro público. Estamos participando de concessões, em setores regulados, com investimentos privados.
(Letícia Toledo)