Candidatos à presidência no debate eleitoral da Band (REUTERS/Paulo Whitaker)
Da Redação
Publicado em 14 de setembro de 2014 às 10h43.
São Paulo - O próximo presidente da República terá condições de ver aprovadas pelo Congresso partes de reformas estruturais, como a tributária e política, desde que eleja pontos específicos mais urgentes, pois propostas muito abrangentes têm risco de não prosperar, avaliam acadêmicos e especialistas ouvidos pelo Broadcast, serviço de notícias em tempo real da Agência Estado, durante esta semana. Por exemplo: em vez de dedicar muita energia para viabilizar o Imposto sobre Valor Agregado (IVA) em 2015, ano em que a economia terá também muitas dificuldades para crescer, uma alternativa seria a simplificação da legislação, incluindo o ICMS e IPI, por exemplo.
Na avaliação de Marcos Troyjo, diplomata e professor da Universidade de Columbia, caso Dilma Rousseff (PT) consiga se reeleger, ela não promoveria grandes reformas, pois não as fez no primeiro mandato e não dá sinais de querer fazê-las entre 2015 e 2018. No caso de Marina Silva (PSB), ele aponta que podem surgir problemas políticos.
A defesa da reforma trabalhista, por exemplo, poderia ser interpretada por muitos como uma espécie de "traição à classe trabalhadora". E isso poderia motivar o PT a unir-se com sindicatos para compor uma base de resistência ao seu governo. Entretanto, uma vitória expressiva no segundo turno de Marina poderia dar à candidata do PSB grande capital popular, com o qual teria melhores condições para avançar nesse projeto.
Ele acredita que Aécio Neves (PSDB) reúne as melhores condições para promover as reformas estruturais, já que tem bons diagnósticos sobre os problemas, vontade política, um plano de voo e capacidade de execução.
Troyjo explica que a ineficiência do Estado é um dos principais elementos que levam à elevada carga tributária e ao engessamento da legislação trabalhista, o que gera um "efeito multiplicador de ineficiência". Ele acredita que a complexidade e abrangência das reformas são tamanhas que geram a necessidade de um novo pacto federativo, o que consumiria muita força política do governante.
Mas, para o professor de Economia da USP Simão Davi Silber, não se pode falar em reformas tributária e administrativa no Brasil enquanto o governo não fizer um ajuste importante para que as despesas cresçam, no máximo, no mesmo ritmo do Produto Interno Bruto (PIB).
Na avaliação do diretor do Instituto de Economia da Unicamp, Fernando Sarti, o próximo presidente terá muitas dificuldades para conseguir a aprovação da revisão do sistema tributário e talvez uma estratégia factível seria defender junto ao Congresso leis mais simples para alguns impostos mais relevantes, como o ICMS e IPI.
Para ele, a reforma só seria aprovada em 2016, com algum otimismo. Isso porque 2015 será um ano duro para o crescimento, dadas as medidas que o próximo governo deverá adotar para corrigir distorções da política macroeconômica, sobretudo nas contas públicas. "Com uma expansão baixa do PIB e da arrecadação para o Tesouro Nacional, isso reduzirá o interesse da União, Estados e municípios de negociar mudanças nesta área, pois temerão perder receitas em tempos difíceis", comenta.
Ele também duvida que a reforma tributária contará com o Imposto sobre Valor Agregado (IVA), independente de quem chegar ao Palácio do Planalto, por causa das divergências entre os entes da Federação e a dificuldade de viabilizá-lo no Parlamento. Sarti acredita que Dilma defenderia uma proposta mais pesada sobre o setor financeiro, com impostos sobre os lucros e IOF. "Aécio é uma grande incógnita, pois ele namora o lado financeiro e quer ao mesmo tempo melhorar o ambiente de negócios", diz. "Marina está mais presa à agenda do setor financeiro, portanto seria mais flexível para este segmento."
Reforma política
No caso da reforma política, José Márcio Camargo, professor da PUC-RJ e economista-chefe da Opus Gestão de Recursos, aponta que Marina, eleita, poderia propor a possibilidade de candidaturas avulsas, de pessoas que não são vinculadas a partidos. O acadêmico também acredita que ela vai sugerir ao Congresso o fim do voto de coligação em eleições proporcionais. "Isso acabaria com diversos pequenos partidos que não têm representatividade no Parlamento", comentou.
Em relação a Dilma, Camargo acredita que ela proporia manter o voto proporcional, mas numa lista de candidatos de cada partido nos Estados. Uma outra sugestão que ela defenderia seria o financiamento público de campanha, com recursos do Estado, com o objetivo de coibir excessos de poder econômico no processo eleitoral. Quanto a Aécio, o acadêmico acredita que ele defenderia o voto distrital misto, uma ideia há muito tempo encampada por vários líderes do PSDB.
Na opinião de Camargo, contudo, dois fatores são essenciais para que o Brasil possa adotar uma reforma política densa. "Uma delas seria a cláusula de barreira. Se um partido não conseguir 5% das cadeiras no Congresso, não há razão para estar no Parlamento", diz. Ele também defende o Orçamento Federal impositivo.
Isso significa que, depois de debates entre os parlamentares sobre as receitas e despesas da União, o que for aprovado pelo Congresso tem de ser cumprido em detalhes e não pode ser alterado. Esta é uma prática que ocorre em vários países, entre eles os Estados Unidos. "Hoje, o Orçamento é autorizativo. Isto dá margem de manobra para ocorrerem negociações políticas entre o governo e segmentos de parlamentares para a aprovação de projetos do Poder Executivo em troca de liberações de verbas", explica.
Sobre a reforma previdenciária, na avaliação de Silber, uma alteração importante que ajudaria a tornar as contas mais sustentáveis seria retirar o BCP-Loas (Benefício de Prestação Continuada, regulamentado pela Lei Orgânica de Assistência Social), um benefício assistencial destinado aos idosos, em especial trabalhadores rurais, do guarda-chuva do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). De acordo com Silber, trata-se de uma política de renda mínima e por isso deveria estar incluída no Orçamento do governo federal. O economista ressalta também que o nível atual de benefícios trabalhistas no Brasil é insustentável, com um sistema bastante suscetível a fraudes, como mostra o crescimento exponencial dos gastos com o auxílio-doença nos últimos anos.
Além das fraudes, o governo também economizaria muito dinheiro com um combate mais sério à corrupção. O professor da USP reconhece que foram feitos avanços institucionais na administração do PT, como o maior papel da Controladoria Geral da União (CGU) e a aprovação da lei que pune também o corruptor, mas diz que existe uma "regime de impunidade" que acaba incentivando a corrupção.