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Onyx Lorenzoni, do DEM: O Brasil é a nova Itália

O deputado Onyx Lorenzoni não acredita que as mudanças serão revertidas no Senado. "Quem pode, em sã consciência, ter esperança no Renan Calheiros?", afirma

Onyx Lorenzoni: Comitê pode solicitar ao ministro extraordinário a exoneração do assessor da equipe (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Onyx Lorenzoni: Comitê pode solicitar ao ministro extraordinário a exoneração do assessor da equipe (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Raphael Martins

Raphael Martins

Publicado em 30 de novembro de 2016 às 19h29.

Última atualização em 31 de outubro de 2018 às 12h14.

Quase dois anos de estudos e mobilização do Ministério Público Federal foram postos à prova na noite da terça 29, quando as 10 Medidas contra a Corrupção foram desfiguradas pelo plenário da Câmara. Do texto original, chancelado por 2 milhões de assinaturas de populares, só quatro medidas foram mantidas, com modificações por emendas. A Câmara ainda incluiu uma polêmica emenda que prevê que juízes e membros do Ministério Público podem responder por abuso de autoridade, com penas de até dois anos de prisão.  

Na tarde desta quarta-feira, procuradores da força tarefa da Operação Lava-Jato ameaçaram renunciar à investigação caso o novo pacote seja aprovado. Se há alguém decepcionado pelo resultado é o deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), relator do projeto das 10 Medidas na comissão especial da Casa. Para ele, depois de inúmeras audiências públicas para tratar a questão e da aprovação por unanimidade do relatório, o resultado final é de enfraquecimento do Judiciário.

“O que houve ontem foi uma vendeta do Parlamento contra o Ministério Público”, diz, em entrevista a EXAME Hoje. “Na Itália houve fragilização dos controles, o que tornou o país ainda mais corrupto do que antes da Mãos Limpas. (...) Depois da noite de ontem, é exatamente o que vai acontecer. O Brasil vai repetir a Itália, 20 anos depois”.

Perguntado se ainda tem esperanças de que o Congresso vote favoravelmente à questão, é categórico: “Quem pode, em sã consciência, ter esperança no Renan Calheiros? Já passei da época de acreditar em Papai Noel”. Ele concedeu a seguinte entrevista a EXAME Hoje.

O que aconteceu na Câmara na madrugada de quarta-feira? Por que o senhor acredita que houve tamanha desfiguração das medidas?
O que houve ontem foi uma vendeta do Parlamento contra o Ministério Público. As grandes operações, como foi o caso da Mãos Limpas na Itália e a Lava-Jato aqui, quando confrontam o poder político há retaliação. Lamentavelmente, na Itália houve fragilização dos controles, que tornou o país ainda mais corrupto do que antes da Mãos Limpas. O resultado é que há duas décadas remanesce uma crise institucional entre o poder político italiano e Judiciário. As 10 Medidas eram um instrumento para que o mesmo não acontecesse no Brasil. Depois da noite de ontem, é exatamente o que vai acontecer. O Brasil vai repetir a Itália, 20 anos depois.

Com o texto atual haverá fragilização das leis?
É preciso ter clareza de que a Lava-Jato é um ponto fora da curva. Não é o comum nem padrão no Brasil, mas uma rara conjugação de um juiz muito preparado com um conjunto de delegados de Polícia Federal e procuradores de Justiça que tem uma especial expertise no combate à lavagem de dinheiro e corrupção. As penas são brandas. Mas o pior é quando tiraram da cartola o projeto de abuso de autoridade em relação a juízes e promotores se cria no Brasil uma tipologia muito ampla à condição de que o investigado possa atacar judicialmente o investigador e juiz. O mecanismo é o mesmo, de ameaçar, intimidar e, se possível, impedir investigações no Brasil.

O senhor esperava uma retaliação tão forte? Qual era sua expectativa?
Ontem foi o dia da vingança. Só isso explica pegar aquelas 10 medidas e fazer um picadinho delas depois de aprovar por unanimidade as 10 na comissão especial. A Câmara dos Deputados tinha ontem uma chance de se reconciliar com a sociedade. Tinha uma chance de caminhar ao lado de milhões de brasileiros que depositaram a sua esperança em um Brasil onde pudéssemos combater de maneira eficiente a impunidade e corrupção. É uma infeliz episódio onde se divorcia a vontade da sociedade do posicionamento da Câmara, que é irreconciliável nos próximos dois anos. Nesta legislatura não adianta mais. Talvez na próxima. É muito grave o que aconteceu.

O presidente Rodrigo Maia (DEM-RJ) declarou que a Câmara “continuará ouvindo a sociedade”. O que o senhor achou dessa declaração?
O problema que é depois da noite de ontem não sei se sociedade quer falar com a Câmara. Talvez a Câmara fique falando sozinha, para seu próprio umbigo como resolveu fazer ontem à noite. É isso.

O senhor se sente pessoalmente atacado? Teme ficar isolado ou perder expressão na Câmara? Acha que houve corporativismo por parte dos deputados?
Eu? Não! Tenho 20 anos de mandato. Oito anos de [deputado] estadual e 12 de federal. Isso não me atrapalha em nada. Foi tudo uma estratégia. Escalaram um fanfarrão para me tirar do sério. Não tiraram. Tentaram de tudo, desde me desestabilizar até usar mentiras. Fizeram o que podiam e não podiam para tirar os defensores da medida do sério. Nos mantivemos firmes e serenos, mas é do jogo democrático. A vida é feita de escolhas. Uma parte do Congresso escolheu apoiar as 10 Medidas e ficar sintonizada com a população e outra escolheu contrariar a população e agredir os investigadores. Cada um vai pagar a conta, na rua e na vida. A gente sempre paga pelas escolhas que faz.

Foram realizadas inúmeras audiências públicas sobre o assunto. Foi trabalho inútil?
O trabalho foi feito em respeito à vontade popular e à causa de tentar transformar o Brasil em um país menos corrupto. Tudo valia a pena. Se a Câmara resolveu destruir tudo, é um direito que a maioria tem.

O que acontece daqui para frente? Há como reverter a situação?
Quem pode, em sã consciência, ter esperança no Renan Calheiros? Já passei da época de acreditar em Papai Noel. A única alternativa é não tratar disso agora. A pauta do poder executivo deve ficar em voga no final do ano legislativo e empurrar o assunto para ser tratado pelo novo presidente. Temos que contar com grande mobilização das entidades ligadas ao MPF e Judiciário, além de movimentos de rua, em cima do Senado para tentar dar tratamento mais equilibrado à questão. Mais a favor do Brasil, menos dos interesses corporativos do Parlamento.

Com a expressão do grupo que desmontou as medidas, dá para ter esperança na classe política?
Eu não tenho esperanças, mas milagres acontecem.

Para ler esta reportagem antecipadamente, assine EXAME Hoje.

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