Minas Gerais: hospital de Belo Horizonte atende pacientes com covid-19. (Pedro Vilela/Getty Images)
Gilson Garrett Jr
Publicado em 27 de novembro de 2020 às 17h23.
Os especialistas em saúde são cautelosos ao afirmar que o Brasil está entrando em uma segunda onda de covid-19, uma vez que ainda não saímos da primeira. Apesar disso, em todo o país há um aumento significativo na taxa de ocupação de leitos de UTI dedicada a pacientes com a doença.
Levantamento feito pelo Observatório Fiocruz Covid-19 mapeou que pelo menos sete capitais brasileiras estão com a ocupação desses leitos acima de 80%, quando o ideal seria abaixo de 70%. Manaus (86%), Macapá (92,2%), Vitória (91,5%), Rio de Janeiro (92%), Curitiba (94%), Florianópolis (83%) e Porto Alegre (88,7%) estão com as mais altas taxas do país.
Também aparecem com taxas preocupantes, mas ainda abaixo da zona de alerta crítica, segundo os pesquisadores, Fortaleza (78,7%), Belém (78,3%) e Campo Grande (76,1%).
"O diagnóstico inicial da capacidade instalada no país para o atendimento de pacientes graves de covid-19 revelou grandes desigualdades entre as regiões e forte concentração de recursos voltados para o setor de saúde suplementar em áreas específicas, com gritante diferença entre a disponibilidade de leitos de UTI para atender os 75% de cidadãos brasileiros dependentes do SUS e os 25% portadores de planos de saúde", diz o boletim da Fiocruz.
Fontes ouvidas pela EXAME apontam que normalmente leitos de UTI ficam com taxa de ocupação muito próxima ao limite, mesmo sem a pandemia, devido ao alto custo de mantê-los vazios. Mas a covid-19 trouxe um fato inesperado, que é o de um aumento muito rápido de internações.
Para lidar com as oscilações bruscas, as redes tendem a remanejar leitos de outros tipos de atendimentos para a covid-19. É uma opção à lotação, embora a necessidade de ter muitos leitos voltados somente à covid possa atrapalhar o tratamento de outras emergências.
Desde a semana passada, a Secretaria da Saúde de São Paulo suspendeu o agendamento de novas cirurgias eletivas em hospitais públicos e privados do estado para abrir mais espaço a pacientes com o coronavírus. Cirurgias eletivas são aquelas não urgentes, marcadas com antecedência.
O governo do Paraná também vai suspender todas as cirurgias eletivas a partir do dia 1º de dezembro. A medida tem validade por 30 dias. A prefeitura de Curitiba vai ainda ativar mais 50 leitos de UTI em hospitais da cidade a partir da próxima semana. No Rio de Janeiro, a prefeitura descarta reativar os hospitais de campanha.
De acordo com o secretário municipal de Saúde de São Paulo, Edson Aparecido, a taxa de ocupação de leitos de UTI em hospitais municipais está em 49%. Na rede privada a taxa é de 66%, e em hospitais estaduais localizados na capital paulista é de 60%.
Ainda segundo ele, 20% de todas as internações na capital são de pessoas de fora da cidade, e estão principalmente na rede privada.
A Grande São Paulo atingiu o maior número de novas internações por covid-19 desde agosto. Dados da Secretaria da Saúde do Estado de São Paulo mostram que na quarta-feira, 25, foram 872 novos pacientes internados em leitos de UTI e de enfermaria. A média diária dos últimos sete dias está em 726.
A ocupação tem subido mesmo nos hospitais privados, embora haja mais possibilidades de remanejamento e ampliação do número de leitos nessa frente. "Estamos novamente com um grau de ocupação muito grande nos leitos privados. Mas não é nada que esgote esses leitos por ora", diz uma fonte com conhecimento da rede privada.
O Hospital Sírio-Libanês, na capital paulista, registrou o maior número de internações de pacientes com covid-19 desde o início da pandemia. Nesta sexta-feira, 27, são 131 pacientes internados, sendo 30% em UTI. O pico foi registrado em abril, quando 120 estavam internados com a doença.
De acordo com o hospital, a capacidade total de atendimento passa de 500 leitos. O Sírio-Libanês ainda informou que tem planos de contingência para acomodar mais pacientes em caso de necessidade, utilizando esses outros leitos que não são de atendimento exclusivo de covid-19.
Por outro lado, a preocupação existe de que, caso o contágio por coronavírus siga subindo, hospitais menos equipados e da rede pública possam ter problemas. Há alas de UTI na rede pública que, mesmo sem a covid, já operam no limite de vagas.
Uma dificuldade adicional é o avanço da covid-19 no interior dos estados, para além das capitais. Desta vez, ao contrário do que ocorreu no começo do ano, as diferentes regiões terão de lidar com a crise simultaneamente, disse o coordenador do InfoGripe, da Fiocruz, Marcelo Gomes, em entrevista anterior à EXAME nesta semana. “Em vez de questões localizadas, agora o desafio está disperso no território”, disse.
"Estávamos com os números de covid despencando no Brasil, mas agora voltamos a ter problema. Se isso não parar, pode ser um desastre, sobretudo nos leitos públicos ou nos privados de capacidade menor. Precisamos levar a sério o uso de máscara, distância de 1,5 metro, não encostar a mão no rosto", afirma o médico Carlos Jardim, da Associação Médica Brasileira.
A grande preocupação em todo o mundo é ter uma alta de casos tamanho que lote os leitos hospitalares, nos moldes do que aconteceu em cidades como Manaus e Rio de Janeiro e em países como a Itália.
Jardim aponta que, neste momento, os cuidados são essenciais para que novas restrições rígidas de deslocamento sejam evitadas. "Os países não têm condição econômica de fechar tudo novamente, por isso precisamos tomar os cuidados para que isso não aconteça. Talvez estejamos a pouco tempo de ter uma vacina, menos de seis meses. Não podemos perder essa oportunidade", diz.
A equipe do Centro de Contingência da Covid-19 do estado de São Paulo analisa os recentes dados de avanço da doença, sobretudo o aumento de internações em hospitais da região metropolitana da capital, e prepara um plano para frear este crescimento. A nova quarentena será anunciada na segunda-feira, 30.
Todas as opções estão na mesa e não está descartada a possibilidade de voltar a restringir a circulação e a abertura do comércio em algumas regiões do estado. Outro ponto que deve ser adotado é restringir atividades de lazer, sem a interrupção das aulas presenciais da rede de ensino, por exemplo.
(Com Carolina Riveira)