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Oceanógrafo que seria transferido de Noronha para sertão se diz aliviado

Nesta quinta, a Justiça de Brasília suspendeu a transferência, alegando que os prejuízos pela mudanças poderiam ser irreversíveis

Fernando de Noronha: oceanógrafo José Martins da Silva Júnior trabalha na ilha há 30 anos (Arquivo/Agência Brasil)

Fernando de Noronha: oceanógrafo José Martins da Silva Júnior trabalha na ilha há 30 anos (Arquivo/Agência Brasil)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 23 de agosto de 2019 às 17h56.

Um alívio. Esse foi o sentimento que o servidor do Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio), o oceanógrafo José Martins da Silva Júnior, experimentou na tarde da quinta-feira (22), quando recebeu a notícia de que a Justiça Federal de Brasília havia suspendido a sua remoção da área de proteção ambiental de Fernando de Noronha, onde trabalha há 30 anos, para a Floresta Nacional de Negreiros, no sertão pernambucano.

Martins, que tem formação de mestrado e doutorado na área de oceanografia e trabalha com pesquisa e proteção de mamíferos aquáticos, foi surpreendido dias atrás com a informação de que teria de deixar Noronha.

A notificação ocorreu dias depois de o presidente Jair Bolsonaro dizer, em julho, que o preço das visitações eram caros e que as coisas tinham que mudar por ali. Bolsonaro foi avisado do preços das taxas pelo presidente da Embratur, que fez visitas ao local. O ministro do Meio Ambiente e o presidente do ICMBio também estiveram na ilha na ocasião e se reuniram com empresários.

A transferência do servidor, que realiza estudos e pesquisas há décadas sobre golfinhos, foi assinada no início deste mês pelo presidente do instituto, o coronel Homero de Giorge Cerqueira, escolhido em maio pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. Com a remoção, o oceanógrafo teria de apresentar no novo local de trabalho até o início de setembro.

Nesta quinta-feira, o cenário mudou. Em decisão liminar, a juíza da 13ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Distrito Federal, Edna Márcia Silva Medeiros Ramos, reconheceu o prejuízo que o servidor sofreria em razão da mudança para o sertão pernambucano: "Reconheço haver fundado perigo de irreversibilidade dos efeitos a serem produzidos pela medida administrativa impugnada, consubstanciado na consumação da remoção do servidor", escreveu. A suspensão terá vigência até o julgamento do mérito da questão.

Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, Martins desabafou. "Foi um alívio, mas não uma surpresa, porque todos os juristas me disseram que eu tinha muita chance de ganhar. Mas eu não vejo perdedor. Sou da estratégia dos golfinhos, que joga o jogo do ganha-ganha. Para um ganhar, o outro não precisa perder", comentou. "O que sinto é um sentimento de justiça, e que foi feito pela Justiça Federal. E isso não é coisa só minha, é uma resposta para todas as pessoas que brigam e batalham pela conservação da natureza no Brasil. Não guardo mágoa de ninguém e de nenhum processo. O importante é a gente pensar no futuro, em como cuidar melhor do país."

Martins conta que não chegou a sair da ilha. Estava aguardando o resultado do processo que moveu, na tentativa de permanecer no arquipélago, com sua família.

"Eu tinha 30 dias para me apresentar em Pernambuco, mas acreditava e tinha fé que a gente ia ter esse ganho na Justiça, ainda que preliminarmente. Então, eu não saí de Fernando de Noronha, continuei trabalhando minhas oito horas por dia aqui", comentou. "Agora, sigo trabalhando normalmente, até uma segunda decisão da Justiça venha, ou que o ICMBio entenda que a continuidade do meu trabalho em Fernando de Noronha é a melhor opção, atendendo aqui as necessidades do ICMBio."

Quando soube que seria removido para o sertão de Pernambuco, Martins tentou argumentar, por meio de um processo administrativo, que não tinha qualquer conhecimento sobre a nova unidade de conservação. Ainda assim, o presidente do ICMBio manteve a sua remoção compulsória.

"A possibilidade de ser encaminhado para o sertão de Pernambuco me surpreendeu, me deixou muito desapontado, sem dúvida nenhuma. Eu tenho toda uma formação que se baseou em escolas e universidades públicas de oceanografia. Meu conhecimento sobre essa área é público, e é algo que tenho que devolver para a sociedade. Não posso esquecer esse conhecimento e começar a trabalhar em um lugar onde não tenho nada a acrescentar", disse.

Segundo o especialistas, a decisão da Justiça Federal, mesmo que em caráter preliminar, deve ajudar no processo de mantê-lo no local onde trabalha. "Não podemos eliminar peças do jogo. Quando isso acontece, fica desequilibrado. Agora espero que o ICMBio entenda o apelo da comunidade de Fernando de Noronha e o apelo da Justiça e nos ajude no caminho da preservação, conservação do desenvolvimento sustentável oceânico."

Nas últimas semanas, o Ministério do Meio Ambiente tem feito diversas remoções de cargos e funções sem qualquer tipo de aviso prévio aos servidores, que já acusaram o ministro da Pasta, Ricardo Salles, de assédio moral coletivo.

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