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O que o mistério de Tia Eron tem a ensinar sobre política

Tia Eron detém em suas mãos o voto que decidirá se Cunha mantém seu mandato; peso da decisão se resume a um duelo: apoio partidário versus opinião pública

Deputada federal Tia Eron (PRB-BA) (Lucio Bernardo Junior/Câmara dos Deputados)

Deputada federal Tia Eron (PRB-BA) (Lucio Bernardo Junior/Câmara dos Deputados)

Raphael Martins

Raphael Martins

Publicado em 14 de junho de 2016 às 18h14.

Última atualização em 1 de agosto de 2017 às 13h27.

São Paulo – Enfim deve acontecer nesta terça-feira (14) a votação do parecer que pede a cassação do presidente afastado da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB). O processo é o mais longo do Conselho de Ética da Casa, com sete meses de duração.

Nem a enorme repercussão, a ampla cobertura dos veículos de comunicação ou o detalhado relatório redigido por Marcos Rogério (DEM-RO) fez com que a deputada federal Tia Eron (PRB-BA) mostrasse uma firme decisão sobre a matéria até o momento.

A parlamentar baiana detém em suas mãos o voto que decidirá se Cunha mantém seu mandato, com o arquivamento dos trabalhos, ou se a votação segue para plenário. A estimativa no Conselho é que Cunha tenha, excluindo o tento da deputada, 10 votos a seu favor e nove contra.

Mesmo não abrindo seu voto, o presidente do Conselho de Ética, José Carlos Araújo (PR-BA), responsável pelo voto de minerva em caso de empate, dá a entender que votaria pela cassação. Em entrevista a EXAME.com, o parlamentar disse que um retorno de Cunha faria o “teto do plenário cair”.

Mas depois de sete meses de processo, que dúvida poderia restar a Tia Eron para abrir seu voto como fizeram outros parlamentares?

DUELO ÉTICO

Segundo especialistas consultados por EXAME.com, o peso dessa decisão se concentra em um duelo: apoio partidário versus opinião pública.

“Os políticos dependem do partido e do contato com as lideranças para ter uma atuação efetiva no Congresso. Sem cobertura partidária, os deputados mais novatos, como ela, não conseguem fazer nada”, afirma Ricardo Ribeiro, analista político da MCM Consultores. “O caso é mais sensível por estar no fogo cruzado entre partido e opinião pública. É preciso avaliar qual a importância de cada um para a eleição dela”.

É isso que norteia as disputas eleitorais, pois o político só consegue votos com apoio financeiro de partidos e entidades. Tia Eron foi eleita com pouco mais que 116 mil, pouco abaixo do quociente eleitoral para deputados federais na Bahia. Influenciaram o dinheiro do PRB e a impulsão dada pela Igreja Universal do Reino de Deus.

Esse perfil da bancada evangélica mostra uma base relativamente sólida de votação, com capacidade de reeleição. Ao mesmo tempo, a rejeição a Cunha faz com que a parlamentar repense seu respeito ao partido.

“O fato de ela alimentar essa dúvida, faz parecer que ela não teme a opinião publica, caso contrário teria se decidido a votar contra”, diz Ribeiro. “Um candidato que tem dependência de voto por opinião pública tem um perfil diferente, não teria dúvida de que postura adotar. Deputados 'menores', que têm a seu favor uma estrutura para obtenção de voto, como a igreja evangélica, sentem-se mais independentes em relação a isso”.

A observação não vale para Fausto Pinato (ex-PRB-SP), a quem Tia Eron substitui no Conselho. Apesar de o deputado ter obtido pouco mais de 22 mil votos e o PRB ter apoiado Cunha em sua eleição à presidência da Câmara, Pinato não demonstrou ser influenciável no processo de cassação em seu papel como relator.

Em tese, o parlamentar deveria trabalhar a serviço do PRB por ter alta dependência do partido, já que necessitou de que um nome bastante popular da legenda — no caso, Celso Russomanno (PRB-SP) — para que fosse puxado para a Câmara. Ele optou em sair com bom status com a opinião pública e desembarcou do partido assim que pode, rumando para o PP.

“O caso da Tia Eron é capaz de indicar um importante elemento da cultura política brasileira: a visualização da ação política constituída de um embate, muitas vezes, entre os bons e os maus”, afirma Rodrigo Prando, cientista político e professor de sociologia da Universidade Presbiteriana Mackenzie. “Empatando o placar, ela entra no rol das pessoas de bem; caso contrário, estará, sobretudo para a opinião pública, dentro do grupo dos traidores, oportunistas e poucos afeitos à ética”.

Para Prando, por conta da visibilidade do processo contra Cunha, Tia Eron pode ganhar capital político ou perder credibilidade entre seus eleitores, assim como aconteceu com seu antigo colega Fausto Pinato. “Tenho a impressão que ela ficará junto à opinião pública”.

Ribeiro concorda: “Na situação que se encontra Cunha, é questão de tempo até que seja preso. Se for essa a avaliação corrente, pode ser que ela acabe votando pela cassação.”

Independente do curso tomado pelo processo, serão levados recursos à Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara, todo um novo capítulo nessa novela. Caso seja aceita sua continuidade, o processo passa para a Mesa Diretora, travando a pauta e obrigando o plenário a deliberar.

Com apoio de maioria simples de 257 dos 513 deputados ao relatório final, Cunha perde o mandato.

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