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"O que menos sobra é foco no índio", diz presidente demitido da Funai

Em entrevista, Franklimberg de Freitas também criticou bancada ruralista e diz que foi tratado com indiferença pelo presidente Jair Bolsonaro

Franklimberg de Freitas diz que foi alvo de mentiras e conluio da bancada ruralista e do secretário especial de Assuntos Fundiários do governo, Luiz Antônio Nabhan Garcia (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Franklimberg de Freitas diz que foi alvo de mentiras e conluio da bancada ruralista e do secretário especial de Assuntos Fundiários do governo, Luiz Antônio Nabhan Garcia (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 1 de julho de 2019 às 13h18.

Última atualização em 1 de julho de 2019 às 14h05.

Brasília — Duas semanas depois de deixar a presidência da Fundação Nacional do Índio (Funai), Franklimberg de Freitas diz que foi alvo de mentiras e conluio da bancada ruralista e do secretário especial de Assuntos Fundiários do governo, Luiz Antônio Nabhan Garcia. Ao jornal O Estado de S. Paulo, disse que, em um encontro, em março, com o presidente Jair Bolsonaro para tratar da pauta indígena, foi recebido "com indiferença". Segundo ele, a política indigenista tem sido feita apenas dentro do Palácio do Planalto e "o que menos sobra é o foco no índio. "A Funai praticamente não tem conhecimento de nada." A seguir os principais trechos da entrevista:

Nabhan Garcia disse que o sr. foi demitido porque não teve competência para ficar no cargo. O que o sr. tem a dizer sobre isso?

Olha, o Exército me designou para comandar uma tropa de paraquedistas em Moçambique, e para atuar como oficial no Estado do Kansas, nos Estados Unidos, por dois anos. Comandei uma brigada em Boa Vista (RR). Fui chefe do comando militar do Amazonas. Acho que o Exército não teria feito tudo isso comigo se eu fosse incompetente. O que vejo é que determinados deveres de casa não foram feitos por essa pessoa, para apoiar o presidente. O que está acontecendo na área indígena é fruto desse assessoramento, este sim, muito incompetente.

O sr. deixou a Funai dizendo que Nabhan "saliva ódio contra os povos indígenas". Por quê?

Usei essa expressão porque se trata de alguém que vem prestando informações erradas ao presidente Bolsonaro. É alguém que não tem conhecimento suficiente para assessorar nas questões indígenas. Tudo o que ele disse é mentira. A Funai, enquanto isso, segue isolada, com dificuldades para realizar seu trabalho, que é cuidar do índio.

Como o sr. vê a mobilização da bancada ruralista para cuidar da demarcação de terras indígenas?

É preocupante. Grande parte das nossas demarcações ocorreu em processos de litígio com o segmento rural. Da última vez que eu estive na presidência da Funai, um ano e meio atrás, tínhamos 19 processos de demarcação judicializados. Hoje, há 59. Como ainda há outras 119 terras em fase de estudo, a tendência é que esse volume aumente. Por isso, vemos toda essa pressão do segmento rural. É um assunto que envolve políticos e grandes proprietários que vão direto ao presidente. Por isso, fica um vácuo nesse diálogo.

O sr. não estava na Funai para que o vácuo deixasse de existir?

Sim, mas a verdade é que a política indigenista tem sido feita apenas dentro do Palácio do Planalto. A Funai praticamente não tem conhecimento de nada. Quem assessora o presidente são essas pessoas. Levam para o presidente a informação de que sou um ongueiro, golpista, bolivariano. Jamais me identificaria com essas afirmações, mas me parece que o presidente acreditou.

O sr. esteve com Bolsonaro em março. Como foi recebido?

O presidente foi indiferente. Falei sobre todas as questões e necessidades, mas observei certa indiferença do presidente, provavelmente já acreditando nessas mentiras passadas a ele por representantes da bancada ruralista.

Quais representantes?

Vamos ser claros. Me colocaram no alvo quando, em julho de 2017, o deputado Alceu Moreira (MDB-RS), presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, entrou no nosso gabinete na Funai e desrespeitou todos os nossos servidores durante uma reunião.

O que ocorreu?

Ele chegou, jogou um DVD em cima da mesa e disse que ali estava o que fazíamos de falcatruas. Tive que me posicionar, me contrapor. Então, pediram a minha cabeça. Como fiquei no cargo por mais um tempo, criou essa animosidade.

Em abril, o presidente recebeu indígenas ao lado de Nabhan. O senhor não foi convidado?

Claro que não, porque aquilo foi uma cena montada. Não foi sequer a Funai que pagou a passagem daqueles índios para irem a Brasília e gravar com o presidente. Esses índios não representavam suas comunidades. Foram plantados ali para reclamarem de tudo.

O ex-ministro Santos Cruz, que te indicou para a Funai, disse que o governo é um "show de besteiras". Como o senhor vê a gestão da área indígena?

É só o que vejo na área indígena. O que menos sobra é foco no índio. Grande parte do tempo se gasta para resolver essas interferências, essas mentiras e a pressão dessa bancada. Veja o aconteceu com a medida provisória que tirava a demarcação da Funai. O governo foi derrotado, mas disseram que fui eu que não consegui garantir a aprovação. Espera aí. Quem estava trabalhando nisso o tempo todo não era eu, mas a bancada ruralista, com seus 247 membros. Quem deixou de atuar? Eu é que sou o incompetente? Meu trabalho era com o índio.

O sr. voltaria a atuar neste governo?

Acredito que, em razão dessa oposição que existe da bancada ruralista, seria contraproducente qualquer tipo de ação minha nesse caminho. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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