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O que acontece agora que o STF paralisou processos por voos atrasados

O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu todos as ações relacionadas a processos judicias que tratam da responsabilização de empresas aéreas

Aeroporto: ações foram suspensas até que um julgamento colegiado ocorra (Rovena Rosa/Agência Brasil)

Aeroporto: ações foram suspensas até que um julgamento colegiado ocorra (Rovena Rosa/Agência Brasil)

André Martins
André Martins

Repórter de Brasil e Economia

Publicado em 28 de novembro de 2025 às 16h06.

O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu na quarta-feira, 26, todos os processos judiciais que tratam da responsabilização de empresas aéreas por danos decorrentes de cancelamento, alteração ou atraso de transporte em tramitação no país.

Especialistas afirmam que o Brasil registra 5 mil vezes mais processos judiciais contra companhias aéreas do que os Estados Unidos. A proporção é de uma ação para cada 227 passageiros no Brasil, enquanto nos EUA esse número é de uma para cada 1,2 milhão.

A EXAME ouviu advogados para explicar o que acontece agora com as pessoas que têm processos em andamento.

Segundo Renata Martins Belmonte, sócia do Albuquerque Melo Advogados na área de Contencioso Cível, qualquer processo na primeira instância, nos tribunais e no STJ terá que ser paralisado com a decisão monocrática.

"A partir de agora, todos os processos pendentes ficarão congelados, sem novas condenações provisórias, até que o STF defina qual legislação deve prevalecer, se o código de defesa do consumidor ou o Código Brasileiro de Aeronáutica.", afirmou Belmonte.

A advogada disse ainda que o cenário muda apenas para quem já tem uma sentença favorável. Se a decisão ainda não transitou em julgado, ou seja, ainda existia a possibilidade de recurso, o processo também fica suspenso e não há pagamento até o posicionamento final do STF.

Mas, se a decisão já transitou em julgado, a suspensão não atinge a coisa julgada. Nessas situações, o passageiro recebe normalmente, porque o título já é definitivo.

A decisão veio dentro do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1.560.244, com repercussão geral reconhecida (Tema 1.417).

O que dizem as startups que atuam em processos contra aéreas

Um dos argumentos das companhias áreas ao pedir a suspensão é que cerca de 10% dos aproximadamente 400 mil processos movidos no país foram ajuizados por apenas 20 advogados ou escritórios advocatícios.

Eles afirmam "há uma articulação clara de litigância predatória, praticada por meio do que se tem chamado de aplicativos abutres, que identificam ‘problemas’ em voos e estimulam os passageiros a ingressarem, de forma rápida, fácil e sem custos, com um processo judicial, na promessa de ganharem indenizações vultosas".

Em nota enviada a EXAME, as startups Liberfly, AirHelp e Resolvvi disseram que a suspensão é "dúbia", deixa o passageiro "totalmente prejudicado" e fere "os direitos dos passageiros".

"É fundamental uniformizar regras, mas é igualmente essencial considerar o comportamento real do consumidor: ele só judicializa quando a empresa não responde", afirmou a Resolvvi.

Liberfly afirmou ainda que processos envolvendo problemas técnicos, manutenção não programada e bagagem extraviada estão sendo suspensos indiscriminadamente

As empresas afirmam que não querem que as companhias aéreas paguem por algo que não é responsabilidade delas, mas sim que os direitos dos passageiros sejam respeitados — o que, em muitos casos, não está sendo respeitado nem pelos legisladores, nem pelos magistrados.

"Os consumidores recorrem ao Judiciário simplesmente para fazer valer os direitos que lhes são garantidos por lei", disse a AirHelp.

Por que Toffoli suspendeu os processos 

A medida atende ao pedido da Azul Linhas Aéreas, autora do recurso, e da Confederação Nacional do Transporte (CNT). Elas alegam, no processo, que o tema gera entendimentos divergentes no Poder Judiciário, com decisões que aplicam o Código de Defesa do Consumidor (CDC) e outras o Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA).

O CDC é mais duro enquanto a possíveis falhas das companhias aéreas, enquanto o CBA tem regras mais flexíveis em quanto a atrasos, que seguem orientações de organismos mundiais que regem a aviação civil. 

Toffoli definiu que, diante do cenário apresentado nos autos, a suspensão nacional de processos até o julgamento definitivo do recurso extraordinário pelo STF é uma medida “conveniente e oportuna”. Ainda não há data para o julgamento colegiado da Corte.

"O impacto dessa decisão é significativo. O Brasil é reconhecido como um dos países mais litigantes do mundo e concentra cerca de 98,5% de todas as ações judiciais envolvendo companhias aéreas no planeta, segundo dados amplamente divulgados pelo setor. Essa distorção afeta não apenas o equilíbrio das relações de consumo, mas também a previsibilidade operacional e o próprio custo do transporte aéreo", afirmou Renata Belmonte.

A especialista disse ainda que o STF cria uma oportunidade de uniformização e racionalização, permitindo que o país adote critérios alinhados ao Código Brasileiro de Aeronáutica, norma que rege o transporte aéreo e busca equilibrar direitos e deveres de passageiros e empresas.

"A tendência é que a decisão traga mais segurança jurídica, reduza as assimetrias regionais e desestimule a litigância predatória que se consolidou nos últimos anos", disse.

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