Brasil caminha em direção a inclusão social com equilíbrio fiscal
Da Redação
Publicado em 15 de julho de 2017 às 09h31.
Última atualização em 15 de julho de 2017 às 11h26.
Por algum motivo insondável, termino esta semana num clima mais otimista. O Brasil tem jeito. Caímos de vez em quando em alguns buracos na estrada – e que buracos! – mas a direção fundamental é correta, e erros são corrigidos.
Esta é, em linhas muito gerais, o espírito de um livro lançado ainda no ano passado, mas que não recebeu a devida atenção entre nós, talvez por ser escrito em inglês, ou talvez porque seu lançamento coincidiu com o período mais agudo da crise econômica e política, momento em que qualquer otimismo talvez parecesse enganador.
Agora que começamos a ver os primeiros sinais de melhora na economia (pequeno recuo do desemprego, controle da inflação, melhora da expectativa do mercado) e da política (aprovação das PECs, tudo se encaminhando para eleições normalmente me 2018, corruptos sendo condenados), talvez seja também um bom momento para revisitar Brazil in Transition: Beliefs, Leadership, and Institutional Change (“O Brasil em transição: crenças, liderança e mudança institucional”, numa tradução livre), uma coautoria de Lee J. Alston, Marcus André Melo, Bernardo Mueller e Carlos Pereira.
Na visão dos autores, o Brasil, ainda que passe por percalços, caminha desde o governo FHC numa direção muito clara: uma agenda de inclusão social com equilíbrio fiscal. Essa agenda, embora seja incompleta na minha opinião, representa avanços em dois campos inegavelmente fundamentais para o desenvolvimento sustentável do país.
E isso não é mérito voluntarista desse ou daquele governo, mas o resultado de uma transição mais profunda nas ideias que regem a sociedade.
É um alento ver análises sérias do Brasil que conseguem ir além do puro economicismo. Os autores aqui querem ir mais fundo e entender como o panorama institucional que constitui o contexto das trocas econômicas se molda.
Estão, assim, na corrente do chamado “novo institucionalismo”, próximos, por exemplo, de autores como Daron Acemoglu e James Robinson, cujo livro Por que as Nações Fracassam é outro imprescindível para entender o sucesso e o fracasso das nações. (Este livro, curiosamente, foi lançado em um momento no qual o Brasil ainda parecia um sucesso incontestável, e elogiaram nosso país talvez um pouco mais do que devessem… ossos do ofício. Aplicar uma teoria aos fatos da realidade nunca é tarefa simples.)
Por trás de instituições, estão as opiniões e crenças das pessoas. Mas não de todas as pessoas. Algumas importam mais do que outras. É aqui que entra o conceito central do livro: o de “dominant network”, ou rede dominante. Ele se refere a todas aquelas pessoas que têm influência sobre a formulação de leis e o funcionamento das instituições no Brasil. Não se confunde com a elite econômica, embora muitos de seus membros o sejam. Mas há também intelectuais, líderes sindicais, políticos, a elite do funcionalismo público, a mídia, etc.
E se olharmos para como mudaram as crenças de nossas redes dominantes nas últimas décadas, é inegável que ela mudou. Até fins dos anos 80, o pensamento dominante era o de que o papel do Estado era promover o crescimento econômico via industrialização – investimento direto, crédito barato, câmbio baixo, barreiras comerciais. O nível social melhoraria como consequência disso.
Da redemocratização para frente, outra linha de pensamento tomou a dianteira, com dois princípios básicos: o Brasil precisa incluir os menos favorecidos no processo de mercado e não pode abrir mão da sensatez econômica. A economia impõe limites que, se forem rompidos, botarão a perder as melhores intenções e os programas sociais mais ambiciosos.
O governo Dilma manteve apenas a primeira parte, mesclada, contudo, com o velho plano econômico de industrializar o Brasil por meio do Estado. Falhou e nos faliu.
Os assessores econômicos de Dilma eram, sem dúvida, cabeças da heterodoxia econômica brasileira que ainda viviam nos anos 70. Seus planos sequer são possíveis dentro das leis e das instituições macroeconômicas legadas pelos anos FHC. A correção, por parte da própria classe política, veio rapidamente (o livro foi publicado antes do governo Temer).
Instituições são o resultado de ideias. Mas a causalidade entre as duas não é imediata. Regras baseadas em crenças antigas tendem a se perpetuar no tempo.
Períodos de crise são janelas de oportunidade para que uma mudança ocorra. Mas essa mudança necessita de um líder para capitaneá-la. Foi isso que Fernando Henrique fez lá atrás. Lula teve a sabedoria de preservar suas conquistas e rebalancear o foco mais para o lado da inclusão social.
Brazil in Transition é uma boa dose de otimismo para estes tempos de incerteza. Na verdade, aponta como, justamente por vivermos em tempos de incerteza, devemos ter ainda mais otimismo. Segundo os autores, já estamos nos encaminhando para sermos um país desenvolvido. Não sei se eu iria tão longe, mas sonhar não custa nada.
Sua agenda é, na minha opinião, incompleta: falta um terceiro elemento, de liberdade econômica, que permitirá liberar a imensa energia produtiva e criativa brasileira que jaz esmagada sob instituições de gerações passadas. Isso é plenamente conciliável com um estado focado na inclusão social.
Resta saber se encontraremos o líder capaz de efetuar essas mudanças. A hora de FHC e Lula já passou. Dilma foi um retorno desastroso a um passado sombrio. Temer é tão amarrado a teias de interesse que não tem a capacidade da mudança estrutural (embora suas reformas caminhem numa direção boa).
Precisamos de algo novo para nos apontar o caminho do futuro. Daí a transição do Brasil estará completa; pelo menos até nos confrontarmos com os próximos desafios.
Brazil in Transition: Beliefs, Leadership, and Institutional Change (“O Brasil em transição: crenças, liderança e mudança institucional”, numa tradução livre).
Autores. Lee J. Alston, Marcus André Melo, Bernardo Mueller e Carlos Pereira. Editora: Princeton University Press. 267 páginas