Nunes Marques, ministro do STF (Fellipe Sampaio/SCO/STF/Divulgação)
Alessandra Azevedo
Publicado em 23 de março de 2021 às 16h03.
Última atualização em 23 de março de 2021 às 17h12.
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Nunes Marques votou contra a suspeição do ex-juiz da Lava-Jato Sergio Moro na condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no caso do triplex do Guarujá. Com o voto, lido nesta terça-feira, 23, em sessão virtual, a Segunda Turma da Corte formou maioria contra o entendimento de que Moro foi parcial nas decisões.
Três dos cinco ministros da Segunda Turma votaram contra a suspeição. Além de Nunes Marques, que desempatou o placar após duas semanas analisando o processo, Edson Fachin e Cármen Lúcia já haviam apresentado os votos contrários à tese de parcialidade do ex-juiz em dezembro de 2018, quando começou o julgamento.
Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, por outro lado, se posicionaram a favor da declaração de suspeição, defendida na ação do ex-presidente que busca anular a condenação. O placar, entretanto, ainda pode mudar. Os ministros podem alterar os votos até o fim do julgamento. Cármen Lúcia indicou que pode dar um novo voto sobre o assunto.
A análise do tema foi interrompida ainda em 2018, quando Gilmar Mendes pediu mais tempo para analisar a ação, e voltou à tona no início de março de 2021, após Fachin anular as condenações de Lula em quatro processos julgados por Moro no âmbito da Lava-Jato. Com isso, Fachin declarou extintas as ações que questionavam a parcialidade de Moro, por "perda de objeto".
Mas, como a Segunda Turma já havia começado o julgamento, Gilmar Mendes suspendeu o pedido de vista do processo, para continuar o julgamento, e apresentou voto a favor da suspeição de Moro. O ministro Ricardo Lewandowski concordou, também no início de março, e foi o segundo voto contrário ao ex-juiz.
Nunes Marques demorou duas semanas para apresentar o voto por entender que não teve oportunidade para analisar o tema até o início de março. Segundo ele, o tempo foi “extremamente curto” para que ele, ministro mais recente da Corte, pudesse se debruçar sobre o caso. Ele tomou posse em novembro de 2020.
No voto apresentado nesta terça, Nunes Marques argumentou que não há provas para declarar a suspeição de Moro. “No meu entendimento, todos esses fatos já foram objeto de analise em todas as instancias do Poder Judiciário. É inviável a reanálise de três fundamentos nesta via eleita. Na hipótese de suspeição, é preciso provas”, defendeu.
O ministro afirmou que parte das evidências apresentadas pela defesa de Lula, obtidas por meio de mensagens vazadas entre autoridades da Lava-Jato, não devem ser aceitas. “Se hackeamento fosse tolerável para meio de obtenção de provas ninguém mais estaria seguro de sua intimidade, tudo seria permitido”, afirmou. "Tenho que são absolutamente inaceitáveis tais prova, por serem obtidos diretamente de crimes. Seria forma transversa de legalizar atividade hacker no Brasil”, continuou.
Segundo Nunes Marques, as mensagens obtidas podem ter sido alteradas. “A inclusão de uma simples palavra pode mudar todo o seu significado. Como confiar em provas fornecidas por criminosos? Será que uma perícia poderia testar que as conversas interceptadas são autênticas, sem a supressão de qualquer palavra? Isso sequer foi feito. Não houve perícia”, apontou.
O ministro Gilmar Mendes rebateu os argumentos de Nunes Marques. "Não se trata de áudios ou hackers, mas ao que está no processo. As provas estão nos autos. É isso que precisa ser examinado”, disse Gilmar. “Realmente me choca tudo aquilo que se revela, e a defesa que se faz. ‘Ah, pode ter havido inserções, manipulações?’. Eu já disse aqui, ou o hacker é um ficcionista ou nós estamos diante de um grande escândalo", continuou o ministro.
“Juiz e promotor combinando ações em nome de uma suposta legalidade. É disto que se cuida”, apontou Gilmar. Segundo ele, "não importa o resultado deste julgamento, a desmoralização da Justiça já ocorreu". "O tribunal de Curitiba é conhecido mundialmente como um tribunal de exceção”, afirmou. Contrário ao argumento de que não seria possível usar como provas as conversas vazadas, Gilmar afirmou que "é indecência falar em garantismo".
A defesa de Lula argumenta, no habeas corpus, que Moro agiu de forma parcial na ação que resultou na condenação do petista pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do tríplex do Guarujá e também nos outros processos dos quais ele é alvo em Curitiba.
Os advogados afirmam que a motivação política por trás das condenações ficou clara após o ex-juiz ter aceitado convite para integrar o governo Bolsonaro como ministro da Justiça, logo depois de julgar Lula, o principal adversário político dele. Segundo os advogados, Moro agiu com "manifestas ilegalidades e arbitrariedades" com o objetivo de prejudicar a imagem do ex-presidente.