Brasileiros que não votam nem em Bolsonado, nem em Lula. (Arquivo pessoal / Arte/Exame)
Gilson Garrett Jr
Publicado em 13 de março de 2021 às 07h30.
Mariana Costa Araújo, de 31 anos, é professora de libras, mãe, e vive em Fortaleza, no Ceará. Fez o seu título de eleitor aos 16 anos, mesmo não sendo obrigada, porque queria participar da vida política do país. Votou sempre em partidos com ideologia mais à esquerda, mas em 2022 gostaria de ver outro candidato que não fosse o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), nem o presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
“Eu me sinto encurralada. No atual momento não tem outro candidato que consiga rivalizar com o Bolsonaro, e eu não gostaria de votar em Lula. Não me sinto arrependida de ter votado no Fernando Haddad, em 2018, eu votei apenas para tentar evitar o Bolsonaro na presidência. Gostaria que fosse outro cenário. Nunca votei nulo ou branco. Por mais que doa na mente, tem de haver uma escolha”, desabafa.
Ela é apenas um dos 38% dos brasileiros que não querem nem o petista, nem o atual presidente no comando do Brasil a partir de 2023. O dado é da mais recente pesquisa EXAME/IDEIA é projeto que une Exame Invest Pro, braço de análise de investimentos da EXAME, e o IDEIA, instituto de pesquisa especializado em opinião pública. O levantamento ouviu 1.000 pessoas entre os dias 10 e 11 de março. A margem de erro é de três pontos percentuais para mais ou para menos. Clique aqui para ler o relatório completo.
O descontentamento desses brasileiros com o ex-presidente Lula passa principalmente pelos escândalos de corrupção, que o levaram a ser preso. Mais recentemente o ministro do Supremo Tribunal Federal, Edson Fachin, anulou as condenações, não por considerá-lo inocente, mas por entender que a competência para julgar os processos não era da 13ª Vara Federal em Curitiba, e sim em Brasília.
No caso de Bolsonaro, a principal crítica é referente ao enfrentamento da pandemia de covid-19. O Brasil é o segundo com o maior número de mortes causadas pela doença no mundo, com mais de 270 mil. Neste momento vivemos o pior cenário, com mais de 2 mil vítimas todos os dias, e hospitais de todo o país em colapso.
Maurício Moura, fundador do IDEIA, instituto especializado em opinião pública, explica que há uma demanda generalizada por um novo nome na política nacional e que rivalize tanto com Bolsonaro quanto com Lula.
“O mais curioso é que esse grupo dos ‘nem Lula nem Bolsonaro’ é mais concentrado na classe alta [43% das classes A e B] e nas regiões Centro-Oeste (49%), Norte (47%), e Sudeste (41%), ou seja, é uma parcela relevante de votos no Brasil”, explica
É no Centro-Oeste, mais especificamente em Cuiabá, no Mato Grosso, onde mora o gerente Gustavo Careaga, de 35 anos. Ele diz que suas escolhas políticas sempre são feitas olhando as propostas dos candidatos, independentemente do partido. Ajudou a reeleger o ex-presidente Lula, em 2006, e depois votou em Dilma Rousseff nas duas eleições seguintes. Em 2018 optou por João Amoedo (Novo), no primeiro turno, e por Bolsonaro, no segundo turno.
“Não me arrependo do voto porque acredito que no momento era o certo a se fazer. O cenário político era um círculo vicioso. Na próxima eleição eu não vou anular, mas farei uma escolha. Eu gostaria de ter um candidato com pulso e que respeite as pessoas. Eles chegam no poder e mudam muito, sofrem muita influência interna e externa”, diz.
Por ter votado tanto em Lula quanto em Bolsonaro, Gustavo Careaga faz uma avaliação dos pontos que o fizeram se decepcionar com ambos.
"No discurso da semana passada, o Lula não respondeu as perguntas de corrupção. Quando estava no poder, não faz as reformas necessárias. Com o Bolsonaro há um descaso muito grande com a covid-19, e com as pessoas que morreram, em não entender que não é apenas uma gripezinha. Como um líder de uma nação, ele tem de dar apoio, não fugir", afirma.
A vendedora Ana Paula Campos Magalhães, de 45 anos, prefere anular o voto, ou nem ir até o local de votação, em um cenário de segundo turno com Bolsonaro e Lula. A moradora de Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, diz que em 2018 votou em Álvaro Dias (Podemos) no primeiro turno, e que no segundo turno optou por Bolsonaro.
"Eu gostaria que estivesse na disputa de 2022 o Álvaro Dias ou o Sergio Moro. Eles sabem e entendem os problemas do Brasil. A gente tentou renovação e não podemos perder a esperança. Precisamos de um candidato que tenha faculdade, estudos, não é colocar qualquer pessoa", afirma.
A escolha de não votar tende a ser o caminho de muitos eleitores. O fenômeno da abstenção cresce a cada eleição. No pleito de 2020, em que foram eleitos prefeitos e vereadores, o não comparecimento às urnas bateu recorde e chegou a 23,14% no primeiro turno. O efeito da pandemia nas urnas em 2022, claro, ainda é uma incógnita.
Na avaliação de Maurício Moura, até 2018 o debate presidencial se encontrava na polaridade entre PT e PSDB. Bolsonaro representou um novo caminho para o Brasil, mas decepcionou grande parte do eleitorado.
Nas eleições de 2014, Marina Silva, então do PSB, conseguiu pouco mais de 21% dos votos no primeiro turno, e era uma terceira via frente a ex-presidente Dilma e o deputado federal Aécio Neves (PSDB). Já em 2018, o terceiro colocado foi Ciro Gomes (PDT), que conseguiu conquistar 12% do eleitorado.
Para 2022, o cenário ainda é incerto. Alguns nomes podem rivalizar contra o presidente Bolsonaro. O apresentador Luciano Huck, por exemplo, teria 37% dos votos em um segundo turno contra Bolsonaro, que aparece com 46%. Ele é o segundo nome que mais rivaliza em um segundo turno com o presidente, atrás de Lula.
O desafio é chegar lá. No primeiro turno, Huck aparece atrás de Ciro, João Doria (PSDB), e de Sergio Moro, segundo a última pesquisa EXAME/IDEIA. Outra pergunta que precisa ser respondida é se o apresentador vai realmente concorrer. Ainda faltam muitos detalhes para serem definidos, principalmente quem serão os candidatos à presidência em 2022. Os nem-nem estão de olho.