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Governo de SP diz que fez sua parte na crise da água. Será?

Em artigo, subsecretário de Comunicação de Alckmin ataca imprensa e afirma que governo fez de tudo para evitar a torneira seca. Especialistas discordam

Menina segura uma garrafa vazia (Thinkstock)

Menina segura uma garrafa vazia (Thinkstock)

Vanessa Barbosa

Vanessa Barbosa

Publicado em 29 de janeiro de 2015 às 16h51.

São Paulo – O Estado de São Paulo caminha para um colapso hídrico. E todo mundo tem culpa nesse cartório, incluindo aí o mau humor de São Pedro. As exceções são o governo paulista e a Sabesp, certo? Ao que parece, essa é a opinião das autoridades paulistas sobre a crise de água que ameaça a maior economia do país e promete submeter milhões de pessoas à restrições severas.

Em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo, nesta quinta-feira (29), o subsecretário de Comunicação do governo do Estado de São Paulo, Márcio Aith, afirma que o “governo está fazendo a sua parte” e acusa abertamente a imprensa (a qual chama de “cínica e covarde”) de  fazer intriga contra o governo de São Paulo, juntamente com outros entes federativos.

Seu principal argumento em defesa do estado é o de que a população tem sido devidamente alertada da crise, por meio de uma série de campanhas que a Sabesp promove desde janeiro de 2014. Para reforçar sua tese, Aith também faz referência aos programas de bônus e ônus que o governo adotou (“antes de qualquer Estado”) e algumas das obras para aumentar a disponibilidade de água.

Segundo ele, a imprensa deliberadamente ignora esses “fatos” e prefere colocar a culpa no governo pela falta de água por simples pensamento comodista ou “rabo preso”.

Segundo especialistas ouvidos por EXAME.com, o governo de São Paulo não está fazendo a sua parte para conservar os recursos hídricos, nem na atual crise, nem antes dela.

O Sudeste vive sob constante estresse hídrico. Isto é um fato. A região dispõe, apenas, de 6% dos recursos hídricos do país para abastecer mais de 40% da população brasileira.

Além disso, o risco de colapso do Cantareira já era velho conhecido da Sabesp e do próprio governo do estado. Apesar disso, as obras necessárias para reduzir a dependência do principal sistema de abastecimento paulista não foram feitas.

Outro fato pouco abordado é que tão importante quanto ter água em quantidade é ter água de boa qualidade. Em pleno século 21, São Paulo deixa de tratar quase 57% dos esgotos gerados, segundo dados do Sistema Nacional de Informações de Saneamento Básico do Ministério das Cidades. Toda essa água suja ameaça as reservas limpas e encarece os custos de tratamento no futuro.

Além de descuidar da saúde dos recursos hídricos, o governo paulista também parece ignorar a importância das matas ciliares e das áreas verdes na preservação dos mananciais. Conforme mostrou levantamento da ONG SOS Mata Atlântica, a região da Cantareira tem hoje apenas 20% de sua vegetação original

A verdade é que São Paulo não vive uma situação confortável em relação à água há muito tempo. É de causar surpresa, por tanto, que os alertas para a população tenham ocorrido tão tardiamente.

“Essa crise se desenha desde o segundo semestre de 2013. Medidas necessárias já deveriam ter sido tomadas naquele momento. Já deveríamos ter começado o racionamento. Acredito que essas campanhas não foram suficientes e nem são suficientes. Elas deveríam ter sido intensificadas para apresentar a gravidade do problema”, diz Roberta Baptista Rodrigues, doutora em recursos hídricos e professora dos cursos de Engenharia Ambiental e Sanitária e de Engenharia Civil da Universidade Anhembi Morumbi.

“Por outro lado, tínhamos o governador Geraldo Alckmin dizendo, repetidas vezes, que não está faltando água e que não faltará água. É uma afirmação completamente contraditória. Fica difícil querer conscientizar a população desse jeito”, afirma a especialista.

Para Roberta, a crise poderia ter sido aproveitada num contexto mais educativo se o governo tivesse decretado racionamento há mais tempo. “Você pode avisar a população sobre o problema, mas a percepção é muito maior a partir do corte efetivo”, afirma.

Reinaldo Dias, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie Campinas, mestre em Ciência Política e doutor em Ciências Sociais pela Unicamp, diz que o governo não está preparado para lidar com os extremos do clima e tampouco prepara de forma adequada a população.

“Campanhas pontuais de conscientização quando a crise já está instalada não adiantam de nada. É necessário um programa educativo de fôlego e longo prazo para gerar consciência”, afirma Dias.

Para ele, a estrutura curricular das escolas está longe de abarcar satisfatoriamente os grandes desafios ambientais da atualidade, sendo a escassez da água um deles. Ele defende, ainda, que não se pode transferir para a imprensa as responsabilidades que são do governo e que, apesar disso, os meios de comunicação estão contribuindo, em muito, para a mudança de posturas.

“Existem três tipos de educação ambiental: a educação formal que se dá por ações e programas promovidos pelos governos (como a definição de grades curriculares que abordem o meio ambiente); um segundo tipo, que envolve a participação voluntária do educador (quando, por exemplo, um professor resolve levar um artigo de jornal para discutir em sala de aula); e o terceiro tipo, a chamada educação informal, que é promovida pelas informações veiculadas na imprensa. De todos os três tipos, a imprensa é que atua com mais força. Agora, a estrutura curricular, que é obrigação do estado, essa não ocorre”.

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