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"Não é fascismo, é rule of law": os 6 pontos centrais da coletiva de Moro

Em projeto simples mas abrangente, ministro propõe formalizar crime de caixa dois e prisão em segunda instância, endurecer regimes e introduzir acordo penal

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, durante entrevista coletiva, após reunião com governadores e secretários estaduais de Segurança Pública para apresentar o Projeto de Lei Anticrime (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, durante entrevista coletiva, após reunião com governadores e secretários estaduais de Segurança Pública para apresentar o Projeto de Lei Anticrime (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

João Pedro Caleiro

João Pedro Caleiro

Publicado em 4 de fevereiro de 2019 às 14h45.

Última atualização em 4 de fevereiro de 2019 às 21h34.

São Paulo – Sérgio Moro, ministro da Justiça e da Segurança Pública, fez nesta segunda-feira (04) uma defesa do Projeto de Lei Anticrime apresentado para governadores e secretários de segurança pública.

Em coletiva de imprensa, ele disse que este é o "carro chefe inicial" de um processo liderado pelo governo federal e que a relativa simplicidade do texto, que em 34 páginas altera 14 leis de vários códigos, do eleitoral ao penal, foi intencional.

Segundo o ministro, o projeto de lei está aberto a alterações “pois não somos donos da verdade” mas que espera ver uma aprovação do Congresso em prazo curto ou médio, sem especificar.

Sobre uma possível competição com outras agendas prioritárias do próprio governo, como a reforma da Previdência, sua posição foi que o Congresso tem capacidade de lidar com vários temas complexos ao mesmo tempo.

Ficaram de fora do projeto o tema de porte de armas, visto como prioridade pela chamada "bancada da bala", e a redução da maioridade penal, que exigiria uma emenda constitucional.

Veja alguns dos pontos tratados na coletiva:

Endurecimento de regimes

O projeto determina regime inicial de pena fechado "em caso de condenado que seja criminoso profissional, habitual, reincidente ou que integra facção. Não adianta fazer igual se fazia no passado, e aumentar o tempo de pena", disse ele.

Em caso de crime hediondo, só haveria progressão da pena após o condenado ter cumprido três quintos dela: 

"Tem que aumentar o percentual necessário em regime fechado, isso não é autoritarismo, não é fascismo. É rule of law”.

O ministro destacou que o endurecimento não é geral, pois ele sabe que "o sistema não comporta", e reconheceu os "pontos de estrangulamento" de falta de capacidade do sistema carcerário.

Excludente de licitude

Um ponto polêmico é a nova redação para o chamado "excludente de ilicitude", que permite que o policial que age para prevenir agressão ou risco de agressão a reféns seja considerado como se atuando em legítima defesa.

A nova proposta permite ao juiz reduzir a pena até a metade ou deixar de aplicá-la se o excesso decorrer de escusável medo, surpresa ou violenta emoção. As circunstâncias serão avaliadas e, se for o caso, o acusado ficará isento de pena. A crítica é que isso possa estimular a violência policial.

"O agente policial que, em situação de sequestro de refém, toma providência para salvar vítima, é evidente que atua em legítima defesa. Muitas vezes, essa situação não era assim entendido. Nós apenas deixamos claro na lei situações que são pertinentes. Não existe licença para matar", disse o ministro.

Prisão em segunda instância

Uma das propostas do projeto é tornar a prisão após condenação em segunda instância uma regra. Atualmente, a possibilidade existe com base em decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que deve tratar do tema novamente no dia 10 de abril.

Segundo Moro, a importância de esclarecer isso na lei vale "para corrupção, para crime violento e para crime organizado. Não adianta elevar pena, por exemplo, de homicídio se o processo não chega ao final".

Para evitar erros e prisões injustas, o projeto traz uma cláusula em que afirma que, excepcionalmente, o tribunal poderá deixar de autorizar a execução provisória da pena se houver uma "questão constitucional ou legal relevante".

Caixa dois

O projeto de lei apresentado hoje também tipificaria de forma clara o crime de caixa dois, a contabilização paralela de recursos eleitorais, que hoje é enquadrada no artigo 350 de falsidade ideológica.

"Esta é uma medida importante para avançar e eliminar esse fator de trapaça dentro do processo eleitoral. É uma tipificação mais adequada a esse tipo de conduta", comentou.

Não seriam afetados aqueles que cometeram o crime no passado, pois a Constituição proíbe que a lei retroaja em prejuízo ao réu, mas Moro destacou que nada impede que eles sejam enquadrados na lei atual.

Organizações criminosas

O projeto de Moro prevê que líderes e integrantes que sejam encontrados com armas iniciem o cumprimento da pena em presídios de segurança máxima e que condenados que sejam comprovadamente integrantes de organizações criminosas não terão direito a progressão de regime.

Há também uma ampliação de 1 para 3 anos o prazo de permanência de líderes de organizações criminosas em presídios federais.

Moro disse que a decisão de citar organizações específicas seria criticada mas foi inspirada no código penal italiano e no combate às máfias de lá.

Estão no texto o "Primeiro Comando da Capital, Comando Vermelho, Família do Norte, Terceiro Comando Puro, Amigo dos Amigos, Milícias, ou outras associações como localmente denominadas.e organizações específicas foram citadas".

Os jornalistas questionaram novamente o risco de superlotação dos presídios, na medida que muitos pequenos traficantes podem ser vinculados à organizações criminosas e com isso serem alvo do endurecimento.

"Um pequeno traficante que é membro de uma organização criminosa não me parece ser um pequeno traficante", rebateu Moro.

Acordo penal

No projeto está previsto, sob determinadas condições, o acordo entre Ministério Público e investigado para, mediante confissão, fixar a pena sem necessidade de abertura de uma ação penal. Crimes de corrupção e roubo por exemplo ficam de fora. O objetivo é desafogar o Judiciário.

As penas nesse tipo de acordo "poderão ser diminuídas em até a metade ou poderá ser alterado o regime de cumprimento das penas ou promovida a substituição da pena privativa por restritiva de direitos, segundo a gravidade do crime, as circunstâncias do caso e o grau de colaboração do acusado para a rápida solução do processo".

Como nas colaborações premiadas, caberia a um juiz homologar o acordo, avaliando as condições, entre elas se foi espontânea e se obedeceu aos requisitos legais. O instrumento é criticado por aumentar o risco de prisão de inocentes ao diminuir as garantias do acusado frente ao sistema judicial.

“Em qualquer instituição humana o risco de erro judiciário é presente. Isso de condenação de inocentes acontece com ou sem plea bargain. Não é a introdução disso que muda esse quadro”, disse Moro.

Veja o vídeo completo da coletiva:

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Veja o texto completo da lei:

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(Com Estadão Conteúdo)

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