Brasil

MPF investiga compra de R$ 20 mi em remédios para doenças raras

Apesar de a empresa manipuladora desses medicamentos ter recebido o dinheiro, pessoas vítimas das doenças têm reclamado de atrasos na entrega

Medicamentos: enquanto isso, os pacientes com doenças raras têm sido prejudicados por problemas de distribuição (Philippe Huguen/AFP/AFP)

Medicamentos: enquanto isso, os pacientes com doenças raras têm sido prejudicados por problemas de distribuição (Philippe Huguen/AFP/AFP)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 6 de março de 2018 às 08h35.

Última atualização em 6 de março de 2018 às 08h36.

São Paulo - Os contratos de compra de quatro remédios para atender pacientes com doenças raras foram colocados sob suspeita em apuração do Ministério Público Federal (MPF) e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A aquisição de três desses medicamentos envolve valores que somam quase R$ 20 milhões.

Pessoas vítimas de doenças raras têm reclamado de atrasos na entrega de remédios de alto custo desde o fim de 2017 e relatam piora em seus quadros de saúde.

O MPF do Distrito Federal investiga a compra de três remédios - Myozyme (para a doença de Pompe), Fabrazyme (doença de Fabry) e Alurayme (Mucopolissacaridose tipo 1).

As três doenças são causadas por deficiências de enzimas e afetam múltiplos órgãos. A empresa Global Gestão em Saúde venceu a licitação em outubro e não entregou os medicamentos, mesmo tendo recebido R$ 19,9 milhões do governo federal com antecedência.

A empresa também não seria, segundo o MPF, uma distribuidora autorizada pelo fabricante dos remédios, a empresa Sanofi Genzyme. O órgão afirma que 152 pacientes seriam beneficiados pela compra.

Diante disso, o MPF recomendou que o ministério convoque a segunda colocada na concorrência para que ela forneça os remédios pelo mesmo valor ou que abra novo processo de compra.

No outro caso, a Anvisa detectou problemas com os documentos de importação da empresa responsável por comprar o Soliris, indicado para quem tem a doença hemoglobinúria paroxística noturna (HPN), mutação genética que destrói os glóbulos vermelhos do sangue.

A empresa Tuttopharma LLC não apresentou documentação necessária para importar o medicamento. O fabricante do remédio também disse que a empresa não é distribuidora autorizada do produto.

Os problemas nas transações dos quatro remédios aconteceram entre janeiro e fevereiro e se referem a processos de compra feitos em 2017. O Soliris está entre os remédios que lideram o ranking de judicialização.

Sofrimento

Enquanto isso, os pacientes com doenças raras têm sido prejudicados por problemas de distribuição. Há quatro meses, eles estão sem o remédio e, segundo parentes e entidades que os apoiam, apresentam piora de seus quadros de saúde.

Ao menos sete medicamentos estão em atraso - quatro deles são os que tiveram problemas no processo de compra.

No dia 15 de dezembro, dez dias após completar 18 anos, Jucilene Pedrosa, que recebia um dos medicamentos para Mucopolissacaridose do tipo 1, não resistiu aos efeitos da doença. Segundo a família, ela ficou sem a medicação por dois meses, após tomá-la por um ano.

"Interrompeu de vez em novembro. A última infusão foi no dia 10 de outubro, depois, não chegou mais. Notei que ela estava mais cansada e com mais dificuldade para andar.

No dia do aniversário dela, 5 de dezembro, ela pediu uma festa, mas teve convulsão, parou de andar e de comer. Ficou internada e não voltou mais para casa", contou a irmã, a estudante Janaíra Pedrosa, de 22 anos.

Agora, a preocupação da família é com o outro irmão, Jucilan, de 14 anos, que tem a mesma doença e também está sem a medicação. De acordo com balanço do Instituto Vidas Raras, 15 pacientes de doenças desse tipo morreram desde outubro.

Um dos pacientes que conseguiram na Justiça o direito de receber o remédio Soliris foi o gerente administrativo Ricardo Ferreira, de 34 anos, que tem a HPN. Ele conta que, desde a metade de 2017, os problemas com a distribuição tiveram início e que ele precisou ser internado quatro vezes desde setembro. "Recebi doses emergenciais do remédio, mas já acabaram. A tortura não acaba", diz.

Aquisições emergenciais

Em nota, o Ministério da Saúde informou que aquisições dos quatro remédios foram realizadas em caráter emergencial por se tratar de uma demanda judicial e seguiu concorrência prevista na Lei de Licitações. Também afirmou que a Advocacia-Geral da União vai acompanhar o caso.

Sobre o Soliris, o diretor-presidente da Anvisa, Jarbas Barbosa, disse que a documentação faz parte das exigências básicas para importar medicamentos e é o que garante que os pacientes vão receber remédios seguros. "O objetivo é que não cheguem medicamentos falsificados."

A reportagem não conseguiu localizar a empresa Tuttopharma LLC, responsável pela compra do Soliris. A Alexion, fabricante do remédio, confirmou que a Tuttopharma não é distribuidora oficial.

Já a Global Saúde, responsável pelos outros três remédios, disse que uma de suas empresas parceiras é credenciada com a fabricante, mas que "foi surpreendida com a recusa da Sanofi Genzyme em entregar os medicamentos".

A Sanofi informou que a Global não integra o grupo de distribuidores credenciados. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Acompanhe tudo sobre:AnvisaLicitaçõesMinistério PúblicoRemédios

Mais de Brasil

Dino determina que Prefeitura de SP cobre serviço funerário com valores de antes da privatização

Incêndio atinge trem da Linha 9-Esmeralda neste domingo; veja vídeo

Ações isoladas ganham gravidade em contexto de plano de golpe, afirma professor da USP

Governos preparam contratos de PPPs para enfrentar eventos climáticos extremos