Cabral: ex-governador acumula quase 190 anos de condenações (Wikimedia Commons/Creative Commons)
Agência Brasil
Publicado em 20 de março de 2019 às 20h56.
Após a 29ª denúncia do Ministério Público Federal do Rio de Janeiro (MPF-RJ) contra o ex-governador Sergio Cabral, a procuradora da República Fabiana Schneider detalhou hoje (20) as investigações em torno do caso e a surpresa da descoberta de recibos de pagamentos de propinas. Ela esclareceu que a ação foi motivada pela descoberta de que o ex-secretário da Casa Civil Régis Fichtner manteve as operações de lavagem do dinheiro, mesmo após a prisão em 2017 e posterior liberação no mesmo ano.
A exemplo de Cabral, Fichtner e o coronel da Polícia Militar Fernando França foram denunciados nesta quarta-feira. O ex-governador e o ex-secretário foram denunciados por lavagem de dinheiro e corrupção passiva, enquanto o coronel é apontado por envolvimento com organização criminosa. A procuradora ressaltou que havia um modo de atuar dos envolvidos, incluindo ofertas de dinheiro em malas e diálogos por telefone.
Para Fabiana Schneider, Fichtner mantinha contatos frequentes com Fernando França, que era o "mala", termo para designar o operador financeiro do ex-secretário. O fato provocou a segunda prisão dos dois no dia 15 de fevereiro, no âmbito da Operação Consigliere, um desdobramento da Lava Jato no Rio de Janeiro.
A procuradora mencionou a existência do depoimento de uma pessoa que trabalhou com Fichtner e Fernando França e que logo após a primeira prisão em 2017, foi procurada por um grupo oferecendo dinheiro. Segundo Fabiana Schneider, a oferta de dinheiro era em espécie e estava em uma mala.
"[A pessoa] recusou esse valor que não sabe quantificar. Demonstra que a organização estava preocupada, tanto Fichtner quanto França, com a possibilidade de pessoas que trabalharam com eles falarem a respeito das atividades desenvolvidas", disse a procuradora.
Fabiana Schneider, afirmou que durante o período em que trabalhou para os dois, França pediu a essa pessoa que abrisse uma conta bancária para os saques e depósitos em espécie. Porém, a sugestão não foi aceita, e a pessoa foi trabalhar em outro lugar.
Segundo a procuradora, há uma preocupação com a segurança dessa pessoa "Ela, neste momento, não está se sentindo ameaçada, mas é óbvio que estamos atentos e se tiver qualquer movimento ela tem todo direito de pedir proteção."
Nos celulares apreendidos de Fichtner e França foram encontradas mais informações que ajudaram a compor a denúncia. "Deu para perceber que os dois continuavam conversando e juntos, o que mostra a perpetuação da organização criminosa e o ato que a gente imputa agora na denúncia que é lavagem de dinheiro na modalidade ocultação. Até a véspera da prisão eles continuavam conversando", afirmou.
Segundo a procuradora, a denúncia aponta o pagamento de vantagem indevida, ou seja, propina de R$ 4 milhões 897 mil. Ela disse que a forma como a propina foi entregue, utilizando doleiros, pessoa interposta, sempre dinheiro em espécie, em locais desvinculados do titular, no caso Régis Fichtner, gera a imputação de ato de lavagem.
"São 21 atos de corrupção e 21 atos de lavagem de dinheiro. Além disso, o França que o mala, o operador financeiro de Fichtner, foi denunciado por integrar a organização criminosa. Sergio Cabral que prestou depoimento frente ao Ministério Público Federal confirmando o pagamento de propina a Regis fica também foi denunciado porque anuiu com esses pagamentos", informou.
De acordo com Fabiana Schneider, na época da prisão de Fichtner em novembro de 2017, o MPF identificou o pagamento de propina de pouco mais de R$ 1,5 milhão, mas pelas informações obtidas por meio de colaborações e pelo cargo que ele ocupava havia um potencial de maiores valores das propinas.
A continuidade das investigações indicou um depósito, não revelado pela procuradora, onde havia um volume grande de caixas com documentos da Trans Expert, empresa de transporte de valores, inclusive no mercado paralelo de moedas estrangeiras.
Para a procuradora, os documentos encontrados no local não deixam dúvidas das operações para a lavagem e ocultação de dinheiro proveniente de propinas. Segundo ela, as caixas estavam identificadas com a palavra Insider, que era o codinome usado pelos doleiros Vinícius Claret, conhecido como Juca Bala e Cláudio Barboza, como Tony e ainda com o nome da corretora de valores Hoya, também usada por doleiros.
"Quando abrimos as caixas já tínhamos de cara os recibos de entrega. A gente sempre fala que propina não tem recibo de entrega. Nesse caso tinha. E a gente começou a ver que havia muitos endereços que já sabíamos que eram endereços de entrega de propina. Identificamos vários recibos com nomes Fernando a mando de Regis", disse.
De acordo com a procuradora, as provas identificadas pelas investigações são independentes e complementam-se. Segundo ela, indicam que houve um "efetivo pagamento de propina". "Pegamos esses documentos que estavam com o nome Insider e pensamos que os nomes também estariam no Bank Drop [sistema que envolve empresas offshores em diversos países], que era o sistema onde eles guardavam informações. De fato, na mesma data e endereço com recibo de entrega a mesma informação para Fernando a mando de Régis com o mesmo valor. São provas completamente independentes que se complementam e comprovam que houve efetivo pagamento da propina."
Cabral foi condenado a 198 anos e 6 meses de prisão na operação "lava jato". Ele está preso preventivamente desde novembro de 2016.
Fichtner e França estão em prisão preventiva no Complexo Penitenciário de Gericinó (Bangu), mesmo local onde Cabral está cumprindo pena.