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Moraes e Dino votam para condenar Bolsonaro e mais 7 réus: o que aconteceu no 3º dia de julgamento

O relator detalhou 13 atos que, em na sua análise, configuraram a tentativa de golpe, enquanto Dino iniciou a discussão sobre a dosimetria da pena para os réus

Julgamento do Bolsonaro: julgamento está em semana decisiva, com o voto dos ministros (Gustavo Moreno/STF/Flickr)

Julgamento do Bolsonaro: julgamento está em semana decisiva, com o voto dos ministros (Gustavo Moreno/STF/Flickr)

André Martins
André Martins

Repórter de Brasil e Economia

Publicado em 9 de setembro de 2025 às 18h17.

Última atualização em 9 de setembro de 2025 às 18h34.

O terceiro dia do julgamento da denúncia do ex-presidente Jair Bolsonaro e outros sete réus acusados de tentativa de golpe de Estado em 2022 teve os primeiros votos dos ministros.

O relator, ministro Alexandre de Moraes, e o ministro Flávio Dino votaram pela condenação dos acusados.

Além dos votos, o dia trouxe algumas sinalizações, como a de Moraes, que leu um voto longo de 5 horas, no qual listou os 13 atos executórios da organização criminosa que tentou dar um golpe de Estado.

No caso de Dino, o ministro afirmou que qualquer anistia para os crimes apontados pela PGR é “insuscetível”, ou seja, inconstitucional.

Além disso, o magistrado adiantou que deve votar por uma dosimetria diferenciada de penas para cada acusado, de acordo com a intensidade de sua participação na trama.

A análise da ação será retomada na manhã de quarta-feira, 10, com o voto do ministro Luiz Fux.

Moraes aponta 13 atos que justificam a condenação dos réus

Em seu voto, Moraes indicou que todos os réus cometeram os crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça, e deterioração de patrimônio tombado.

Além disso, Moraes recusou todas as questões preliminares levantadas pelas defesas de Bolsonaro e dos demais acusados, como pedidos de nulidade da delação premiada de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens e um dos réus, alegações de cerceamento de defesa, pedidos para retirar o caso do STF, além das solicitações de absolvição.

Foram mais de 5 horas de leitura.

No caso de Alexandre Ramagem, as duas últimas imputações foram suspensas por decisão da Câmara dos Deputados, já que os crimes foram cometidos após a diplomação dele como parlamentar, prerrogativa que a Constituição dá ao Congresso.

O relator disse que "não há dúvida de que houve tentativa de golpe" e que a organização criminosa praticou vários atos executórios, com divisão de tarefas de forma hierarquizada.

No Direito Penal, atos executórios são as ações praticadas que dão início à agressão, transformando a intenção do criminoso em uma conduta típica, antijurídica e, portanto, punível.

Moraes lê o seu voto durante o julgamento do núcleo 1

Moraes disse que o golpe apenas não foi consumado em virtude da "reação dura e constitucional do comandante do Exército e da Força Aérea".

"Tudo estava preparado, mas não houve adesão dos comandantes. O que já vinha sendo produzido, com os quartéis, com atos violentos, com o discurso violento e grave ameaça ao Judiciário, isso foi consumado no dia 8 de janeiro", afirmou.

O ministro reforçou em mais de uma oportunidade durante o seu voto que Bolsonaro é o líder da organização e que os atos executórios foram "violentíssimos". O ministro disse também que os autos do processo estão "cheios de prova".

"Jair Messias Bolsonaro exerceu a função de líder da estrutura criminosa e recebeu ampla contribuição de integrantes do governo federal e das Forças Armadas, utilizando-se da estrutura do Estado brasileiro para a implementação de seu projeto autoritário de poder, conforme fartamente demonstrado nos aulas", disse. 

Ao argumentar pela condenação dos acusados, Moraes listou em uma apresentação 13 atos sequenciais que, na sua avaliação, demonstram a "interligação da organização para a concepção de seus objetivos".

São os atos, segundo Moraes:

  1. Utilização de órgãos Públicos pela organização criminosa para o monitoramento de adversários políticos e a execução da estratégia de atentar contra o Poder Judiciário, desacreditando a Justiça Eleitoral, o resultado das eleições de 2022 e a própria Democracia.
  2. Atos executórios públicos com graves ameaças em relação a Justiça eleitoral: live do dia 29 de julho de 2021, a entrevista do dia 3 de agosto de 2021, e a live do dia 4 de agosto de 2021
  3. Tentativa, com emprego de grave ameaça, de restringir o exercício do Poder Judiciário, em 7 de setembro de 2021
  4. A reunião ministerial de 5 de julho de 2022
  5. A reunião com os embaixadores de 18 de julho de 2022
  6. A utilização indevida da estrutura da PRF no segundo turno das eleições
  7. Utilização indevida da estrutura das Forças Armadas para produção do relatório sobre as urnas eletrônicas
  8. Atos executórios praticados após o segundo turno das eleições: live realizada em 4 de novembro de 2022, ações de monitoramento de autoridades em novembro de 2022, representação eleitoral para verificação extraordinária, reunião dos oficiais de Forças Especiais, os kids pretos, e elaboração da Carta ao Comandante
  9. Planejamento das operações Punhal Verde e Amarelo e Copa 2022
  10. Atos executórios seguintes ao planejamento do "Punhal Verde e Amarelo"; monitoramento do presidente eleito, "Operação Luneta", "Operação 142", e "Discurso Pós-Golpe"
  11. A minuta de Golpe de Estado e apresentação aos Comandantes das Forças Armadas
  12. A tentativa de golpe de Estado em 8 de janeiro de 2023
  13. O gabinete de crise após a consumação do golpe de Estado

Dino acompanha Moraes, fala sobre anistia e dosimetria da pena

O ministro Flávio Dino acompanhou o voto do relator e afirmou que os autos do processo deixam claro que os acusados não realizaram apenas preparação ou cogitação de tentativa de golpe, mas sim atos executórios.

"Seja porque houve materialmente o início da execução do núcleo, na forma de tentativa. Não existe tentativa de crime de empreendimento. Porque houve esse risco sobre todas as condutas", disse.

Para além da argumentação pela condenação, Dino destacou dois pontos durante a sua fala de um pouco mais de uma hora.

O primeiro foi sobre a proposta de anistia aos envolvidos na suposta trama golpista discutido no Congresso.

O ministro afirmou que a Constituição não perdoa os crimes de tortura, terrorismo, tráfico de drogas e que os crimes contra o Estado Democrático são “imprescritíveis e inafiançáveis”.

"Esses crimes já foram declarados pelo plenário do Supremo como insuscetíveis de indulto ou anistia. Portanto, dessas condutas políticas de afastamento ou extinção da punibilidade", afirmou.

Dino detalha o seu voto durante o julgamento do Núcleo 1 (Sophia Santos/STF/Flickr)

Dino reforçou que, apesar de vários episódios de anistia na história do país, nunca houve o uso desse instrumento para altos escalões do poder.

"Jamais houve anistia a quem exercia o poder dominante. O plenário já mostrou o descabimento da anistia", afirmou.

Sobre um possível alívio da pena de alguns dos acusados, Dino adiantou uma discussão que era esperada que ocorresse apenas na sexta-feira, em caso de condenação, ou pelo ministro Luiz Fux, que indicou que vai abrir divergência de alguns pontos com o relator.

Dino afirmou não haver duvidas sobre o alto grau de culpabilidade de Bolsonaro e do general Braga Netto na trama, mas que a sua avaliação é que os outros acusados têm participação menor. Ele exemplificou ao detalhar o papel de Augusto Heleno, Paulo Sérgio Nogueira e Alexandre Ramagem nos crimes apontados pela PGR.

"Ramagem, por exemplo, saiu do governo em março de 2022. Ele tem uma menor eficiência causal. Eu considerei a participação dele de menor importância", disse.

O que vai acontecer no quarto dia de julgamento de Bolsonaro?

O quarto dia do julgamento está marcado para começar às 9h desta quarta-feira, 10, com o voto do ministro Luiz Fux. A Corte reservou apenas uma sessão, por isso, o julgamento será suspenso às 12h.

Quais os dias e horários do julgamento de Bolsonaro?

Onde assistir o julgamento do Bolsonaro ao vivo?

O julgamento de Bolsonaro e outros sete réus será transmitido ao vivo pela TV Justiça e no canal do STF do YouTube

Entenda a acusação contra Bolsonaro e aliados

Segundo a Procuradoria-Geral da República, uma organização estava "enraizada na própria estrutura do Estado e com forte influência de setores militares", e se "desenvolveu em ordem hierárquica e com divisão das tarefas preponderantes entre seus integrantes".

A acusação afirma que os delitos descritos não são de ocorrência instantânea, mas se desenrolam em cadeia de acontecimentos, alguns com mais marcante visibilidade do que outros, sempre articulados ao mesmo objetivo – o de a organização, tendo à frente o então presidente da República Jair Bolsonaro, não deixar o Poder, ou a ele retornar, pela força, ameaçada ou exercida, contrariando o resultado apurado da vontade popular nas urnas.

Entre os fatos revelados pelos investigadores está o plano "Punhal Verde e Amarelo", uma trama para assassinar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes.

Quais são os crimes atribuídos a Bolsonaro?

  • Organização criminosa: penas de 3 a 8 anos, com até mais 4 anos pelo majorante de emprego de arma de fogo e até mais 5 anos pelo concurso de funcionário público;
  • Abolição violenta do estado democrático de direito: penas entre 4 e 8 anos;
  • Golpe de Estado: penas entre 4 e 12 anos;
  • Dano qualificado pela violência e grave ameaça: penas de 6 meses a 3 anos;
  • Deterioração de patrimônio tombado: penas de 1 a 3 anos

Caso a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal aplique as penas máximas dos cinco crimes citados pela Procuradoria-Geral da República (PGR), Bolsonaro poderá ser condenado por até 43 anos de prisão.

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