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'Vamos embora': cidade de Roca Sales não suporta mais enchentes

Cidade de 12 mil habitantes foi uma das mais atingidas neste mês pelo pior desastre climático já ocorrido no Rio Grande do Sul

Enchentes no RS: Roca Sales, Rio Grande do Sul, em 15 de maio de 2024 (Nelson Almeida/AFP)

Enchentes no RS: Roca Sales, Rio Grande do Sul, em 15 de maio de 2024 (Nelson Almeida/AFP)

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Agência de notícias

Publicado em 28 de maio de 2024 às 11h45.

Última atualização em 28 de maio de 2024 às 16h58.

"A gente não consegue mais viver assim." Fabiana Alves lida com a lama em sua casa, enquanto seu companheiro carrega o carro: eles estão prestes a deixar a cidade de Roca Sales, devastada pela terceira inundação em oito meses.

A cidade, de 12 mil habitantes, foi uma das mais atingidas neste mês pelo pior desastre climático já ocorrido no Rio Grande do Sul, que deixou cerca de 170 mortos, dezenas de desaparecidos e mais de 600 mil desabrigados.

No centro da cidade, o cenário é de prédios em ruínas e lojas vazias. Nem os supermercados estão funcionado, porque a água do rio Taquari entrou com tanta força que levou tudo.

"Não tem mais como a gente permanecer no centro. A gente está reconstruindo pela terceira vez e não tem mais recursos", disse à AFP o prefeito, Amilton Fontana (MDB).

Devido à sua localização em frente ao rio, Roca Sales costumava registrar uma grande enchente a cada dez anos. Mas, recentemente, as cheias se sucedem com uma frequência que sequer permite uma recuperação.

Segundo especialistas, o aquecimento global torna os eventos climáticos mais frequentes e intensos. "O povo aqui é muito guerreiro, mas realmente essas três enchentes abalaram toda a estrutura física e também mental das pessoas", disse o prefeito, sobre uma ponte danificada pela qual o Rio Taquari transbordou.

Mudar o centro

Fontana quer deslocar o centro para três quilômetros da localização atual, a fim de que os moradores possam começar "uma vida nova num local seguro". Mas muitos querem deixar aquela que já foi uma cidade próspera, dedicada à agricultura e indústria, como Fabiana Alves, 50.

"Estou apavorada. Qualquer nuvem a gente já pensa que vai dar enchente", diz Fabiana, enquanto tira a lama do quintal de sua casa, alugada. Um dia após as enchentes, ela pediu demissão de um frigorífico e deseja se instalar com a filha, 10, e o companheiro na região de Porto Alegre, a cerca de 130 quilômetros de Roca Sales.

Fabiana não vai poder levar quase nada. Ao lado de sua casa, amontoam-se seus móveis, destruídos. Apenas o sofá é reconhecível sob a lama.

"A gente perdeu lembranças, roupas da minha filha, fotos dos meus avós. São coisas muito materiais, mas são coisas que nunca mais vou conseguir", lamenta.

Todos sofrem

Na rua principal de Roca Sales, alguns moradores caminham cabisbaixos em direção a um ponto de doação de alimentos. "A realidade é uma só: todo mundo está na sofrência", resume o garçom Gelson Moraes Lopes, 48, que recebe de um voluntário pratos quentes de macarrão.

Nascido no Paraná, Lopes e a mulher foram atraídos pela qualidade de vida em Roca Sales, onde a renda per capita é 16% maior do que a média do país, de quase 50 mil reais, segundo dados oficiais de 2021.

Lopes chegou dias antes da primeira enchente, em setembro, e perdeu sua mudança. "A fatalidade veio de novo no dia 18 de novembro" e, agora, seu apartamento foi invadido por um metro de lama, conta. "Voltamos para o Paraná."

 Alerta da ONU

Jania Delay Silva, 60, e o marido, João Carlos Vargas, 61, dizem que, devido à sua idade, não lhes resta alternativa, a não ser ficar. "Temos que continuar aqui, não conseguimos sobreviver de outro jeito", diz ela na rua principal, enxugando as lágrimas.

O casal de aposentados vive nos arredores de Roca Sales. A casa deles foi destruída em novembro, e eles construíam uma segunda residência em um ponto mais alto e seguro, perto de suas plantações.

A nova inundação, no entanto, aconteceu antes de eles acabarem a obra. O casal vive agora em uma casa emprestada, sem porta nem eletricidade, conta Jania.

A Agência das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur) descreveu na última sexta-feira a situação no Rio Grande do Sul como "muito preocupante" e alertou para a necessidade de ajudar a população a se preparar e se recuperar, diante das mudanças climáticas. Caso contrário, aqueles que perderam seus lares "correm o risco de se tornarem deslocados", acrescentou um porta-voz em Genebra.

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