Brumadinho: Moradora observa a lama da janela de sua casa (Ana Graziela Aguiar/Agência Brasil)
Agência Brasil
Publicado em 2 de fevereiro de 2019 às 18h06.
Moradores da comunidade de Parque das Cachoeiras, em Brumadinho (MG), afirmam que nunca receberam orientações da Vale com relação a possíveis riscos da barragem instalada no município ou planos de fuga e de evacuação em caso de acidentes.
No último dia 25, a barragem Mina Córrego do Feijão, da mineradora Vale, se rompeu. Até o momento, as autoridades contabilizam 121 mortos, com 93 corpos identificados. Há ainda 226 desaparecidos e 395 pessoas localizadas.
De acordo com o programador e empresário Mário Lúcio Fontes Pato, 64 anos, em nenhum momento houve instrução aos moradores do que fazer em caso de rompimento.
"Absolutamente nenhum tipo de informação. Se a sirene tocar, você corre pra lá, corre pra cá ou fica dentro de casa, por exemplo. Nem eu nem ninguém recebeu treinamento. Se existia um plano de contingência era no papel, na Vale", destacou o morador.
Ele afirma que recebia, mensalmente, panfletos da mineradora explicando ações como a instalação de centros de saúde. Não houve, entretanto, informações ou treinamento para situações de emergência.
Mulher de Mário Lúcio, Sandra Maria da Costa, 59 anos, reforça a falta de instruções por parte da Vale. "O único alerta que tivemos foi quando, há alguns meses, eles vieram fazer medições. Nunca tivemos aviso sobre riscos", afirmou.
Da janela de sua casa em Brumadinho, Sandra Maria observa o local tomado pela lama - Ana Graziela Aguiar/Repórter da TV Brasil
O empresário afirma que nunca tinha se preocupado com a possibilidade de acidentes. "A Vale fez estudo de topografia da região, cadastro socioeconômico, colocou sistema de alarmes. Tudo isso leva a ter certeza de que isso [rompimento] poderia acontecer, mas nunca tinha parado para pensar nisso. Nunca deixei de dormir pensando que essa barragem ia estourar", destacou.
Em nota, a Vale informou que a barragem tinha sistema de vídeo-monitoramento e alerta por meio de sirenes e cadastramento da população à jusante. "Também foi realizado o simulado externo de emergência em 16 de junho de 2018, sob coordenação das Defesas civis e com apoio da Vale, e o treinamento interno com os funcionários em 23 de outubro de 2018".
O empresário é o dono da única casa da rua que não está interditada pelo Corpo de Bombeiros por ficar em um lugar mais alto. No fundo da casa, passava um riacho de aproximadamente 3 metros de largura que deságua no Rio Paraopeba. O mar de lama comeu praticamente tudo ao redor. Segundo ele, até o momento, cinco corpos foram resgatados na área. Do local onde a barragem estourou até a propriedade são cerca de 8 quilômetros tomados pelos rejeitos.
"Não tem maneira de restaurar o ecossistema e o que tinha aí embaixo", lamenta, apontando para o local onde viu as filhas crescer e brincar.
O casal que mora na região há 35 anos tem vários amigos desaparecidos e afirma que viu a lama tomar conta de grande parte da história de vida da família.
Sandra Maria afirma que estava em casa no momento em que a barragem estourou. Ela diz que ouviu um barulho de árvores caindo como se tivesse passando um trator e correu para a janela. "Eu vi a lama subindo em uma velocidade absurda, arrancando tudo. Pedaços enormes de barranco. Ouvi um estrondo quando, provavelmente, a lama atingiu a casa dos meus vizinhos em uma parte mais baixa da rua", conta Sandra afirmando que ficou três dias afastada do local por orientação da Defesa Civil e dos bombeiros.
Já Mário Lúcio estava voltando de Belo Horizonte com uma das filhas que tinha ido ao médico quando ficou sabendo do rompimento da barragem. Ele conta que dirigiu pelo alto da serra, desviando da estrada convencional que estava interditada.
"Foram 30, 40 minutos de terror, pensando na minha mulher, no meu neto que estavam em casa e sem saber se a lama tinha atingido o local."