Marun passou a ser formalmente investigado por suspeita de corrupção, lavagem de dinheiro e associação criminosa (Wilson Dias/Agência Brasil)
Estadão Conteúdo
Publicado em 4 de setembro de 2018 às 14h54.
Brasília - Implicado por um delator no escândalo de fraudes em registros sindicais no Ministério do Trabalho, o ministro-chefe da Secretaria de Governo da Presidência da República, Carlos Marun (MDB), passou a ser formalmente investigado por suspeita de corrupção, lavagem de dinheiro e associação criminosa no âmbito da Operação Registro Espúrio. Este é um dos três inquéritos que o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, mandou abrir a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) para a continuidade das investigações - cinco deputados e dois senadores também são alvo. A PGR denunciou 26 pessoas no dia 27 de agosto por organização criminosa.
Um dos novos inquéritos foi aberto para apurar suspeitas de corrupção e lavagem de dinheiro envolvendo os senadores Dalírio Beber (PSDB-SC) e Cidinho Santos (PR-MT) identificadas ao longo da operação, que teve três fases. Num terceiro inquérito, PGR e a Polícia Federal vão apurar suspeita de crimes de corrupção passiva, corrupção ativa e lavagem de dinheiro por parte dos deputados federais Jovair Arantes (PTB-GO), Cristiane Brasil (PTB-RJ), Paulinho da Força Sindical (SD-SP), Wilson Santiago Filho (PTB-PB) e Nelson Marquezelli (PTB-SP) - os cinco denunciados no fim de agosto por supostamente integrarem organização criminosa. Fachin deu 15 dias para que as defesas dos parlamentares apresentem resposta à denúncia.
Também por decisão de Fachin, os outros 21 denunciados por organização criminosa, incluídos o ex-ministro do Trabalho Helton Yomura e o presidente nacional do PTB, Roberto Jefferson, tiveram a acusação formal desmembrada e encaminhada à 10ª Vara Criminal da Justiça Federal do Distrito Federal, por não terem prerrogativa de foro no Supremo. A pedido da procuradora-geral da República, Raquel Dodge, os investigados que não chegaram a ser denunciados junto com os 26 também continuarão sob a mira do Ministério Público, agora na primeira instância, também no Distrito Federal, para aprofundamento das apurações. Entre eles está o presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah - um dos 13 nomes que, segundo a PF, faziam parte da suposta organização criminosa mas que não foram incluídos na denúncia pela PGR.
Nomeado articulador político do governo Temer no fim de dezembro, o ministro Carlos Marun teria demandado, segundo as investigações, a aprovação de registros sindicais de três entidades de Mato Grosso do Sul - o Estado pelo qual, em 2014, o advogado e engenheiro gaúcho foi eleito para seu primeiro mandato como deputado federal.
Os pedidos teriam sido repassados por intermédio de sua chefe de gabinete, Vivianne Lorenna Vieira de Mello, ao ex-coordenador de registro sindical da pasta, Renato Araújo Júnior. Preso preventivamente na primeira fase da Registro Espúrio, Araújo assinou acordo de colaboração premiada e entregou as informações que baseiam a abertura de inquérito contra o ministro.
Araújo afirmou que, em uma reunião em maio com a assessora de Marun e com Júlio "Canelinha" Bernardes - na época, chefe de gabinete do então ministro do trabalho Helton Yomura -, "Viviane repassou ao depoente uma folha de papel contendo o nome e o CNPJ de três entidades". As "demandas" se referiam ao Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário Federal e do Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul, ao Sindicato dos Trabalhadores e Servidores da Secretaria de Administração do MS e ao Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Parnaíba/MS. "Viviane disse que havia ordem direta de Carlos Marun para o deferimento do registro sindical das três entidades", acrescentou Renato, ainda sobre a reunião.
O ex-coordenador de registro sindical contou que o pedido em relação a um desses três sindicatos sequer cumpria os requisitos legais para obtenção do registro sindical. "Mesmo assim, considerando a ordem advinda de Carlos Marun, disse que era para Jéssica (funcionária) fazer a nota deferindo o registro", relatou Renato Araújo. A nota só não foi elaborada porque eclodiu a primeira fase da Registro Espúrio e tanto Renato como Jéssica foram presos.
Fotografias juntadas aos autos do inquérito da Registro Espúrio mostram a proximidade de Marun com a cúpula do Ministério do Trabalho - já denunciada. Elas registram, segundo a Polícia Federal, uma "reunião festiva, provavelmente realizada no dia de um dos jogos do Brasil na Copa do Mundo de 2018, na qual estavam presentes, dentre outras pessoas, o então ministro Helton Yomura, seu chefe de gabinete Júlio de Souza Bernardes (Canelinha) e o ministro-chefe da Secretaria de Governo da Presidência da República Carlos Marun".
A PF cita "esforço de Renato Araújo Júnior e Julio de Souza Bernardes para atender de forma ilícita os pleitos do ministro-chefe da Secretaria de Governo, tudo realizado com a ciência e o aval do então ministro Helton Yomura". "Dentro desse contexto, Renato, em depoimento prestado em Sede Policial, foi categórico ao afirmar que 'o chefe de gabinete do Ministério do Trabalho, Julio de Souza Bernardes, conhecido como Canelinha, determinou ao depoente que atendesse sem questionar as demandas advindas do Planalto e de Carlos Marun", disse a PF.
Edson Fachin decidiu deixar também para a análise da 10ª Vara os pedidos de liberdade feitos por presos preventivos na Operação Registro Espúrio. Considerando que assinou acordo de colaboração premiada, a PGR havia se posicionado a favor do relaxamento da prisão de Renato Araújo Júnior e a conversão para um regime de prisão domiciliar noturna com o uso de tornozeleira eletrônica durante o dia.
Além de Renato, outros seis membros do núcleo administrativo da organização criminosa, segundo denúncia apresentada pela PGR, ainda estão presos e também passam à jurisdição da 10ª Vara Criminal da Justiça Federal do DF: Carlos Cavalcante Lacerda, ex-secretário de Relações do Trabalho do Ministério do Trabalho; Leonardo Cabral Dias, ex-coordenador de registro sindical do ministério; Renata Frias Pimentel, ex-chefe de divisão na Secretaria de Relações do Trabalho; Jéssica Mattos Rosetti Capeletti, ex-servidora do ministério; Leonardo José Arantes, ex-número 2 do Ministério do Trabalho; e Rogério Papalardo Arantes, ex-diretor do Incra que teria buscado influenciar processos no Ministério do Trabalho. Os dois últimos são sobrinhos do deputado Jovair Arantes.
Em relação a informação vazada ao Jornal O GLOBO de que foi autorizada pelo ministro Fachin a abertura de inquérito contra mim, a recebi com a tranquilidade de quem nada deve e portanto nada teme. Nada fiz que extrapole as minhas funções previstas no ordenamento jurídico e não recebi nenhuma vantagem, devida ou indevida, pelas ações que desenvolvi em prol de Sindicatos de MS. Estou consciente de que o constrangimento que me impõe com esta medida é real e lamento o fato de que ao final não poderei buscar a reparação destes danos, haja visto que os que me acusam não serão sequer investigados.
Afirmo também a minha confiança nas atitudes de minha assessora Dra Vivianne Lorenna Vieira e lamento o constrangimento que ela está passando em função desta tendenciosa acusação que tem por objetivo me atingir e intimidar. Sei que sou alvo de uma intimidação sob a forma de inquérito, mas desde já reafirmo todas as críticas que fiz a atitudes e decisões indevidas e ilegais que estão sendo tomadas por autoridades que deveriam zelar pelo estrito cumprimento da lei. Por fim destaco a necessidade da aprovação de legislação que permita a punição de Abusos de Autoridade, para que pessoas indevidamente constrangidas possam ser indenizadas e eventuais culpados punidos.
"A Polícia Federal e o Ministério Público tornaram-se assassinos de reputações. Sem provas, acusam a esmo. É o que ocorre agora com o relatório final da Operação Registro Espúrio, preparado pela Polícia Federal e endossado pelo Ministério Público para criar um fato político contra políticos. Apesar de as investigações transcorrerem no período de um ano, utilizam a troca de mensagens de 17 dias (entre 13 de maio e 30 de maio deste ano) entre a deputada Cristiane Brasil e um ex-funcionário do ministério para firmar convicção de que ela integra uma organização criminosa. A Polícia Federal e o Ministério Público insistem em tratar pedidos políticos _ comuns a todos os parlamentares, de todos os partidos, em todos os ministérios _ em crime. Crime é acusar sem provas, como fazem a PF e o Ministério Público, com objetivos puramente político-paritários. A deputada provará sua inocência mais uma vez, como já o fez em outras ocasiões, com a consciência tranquila de que nada fez de errado", disse Luiz Gustavo Pereira da Cunha, advogado.