Marco Aurélio Mello: "a atuação conjunta, a cooperação entre órgãos de investigação e de persecução penal, é de relevância maior" (Antônio Cruz/Agência Brasil)
Estadão Conteúdo
Publicado em 13 de dezembro de 2017 às 12h54.
Brasília - O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou nesta quarta-feira (13) a favor do direito de a Polícia Federal (PF) firmar acordos de delação premiada, no âmbito da ação da Procuradoria-Geral da União (PGR) que questiona a possibilidade de delegados de polícia usarem o instrumento.
Marco Aurélio, relator do caso, avaliou que a capacidade da PF realizar os acordos tem como objetivo o equilíbrio entre os Poderes e acrescentou que a concentração de poder é "perniciosa" e "prejudicial ao bom funcionamento do estado democrático de direito".
"A atuação conjunta, a cooperação entre órgãos de investigação e de persecução penal, é de relevância maior. É nefasta qualquer 'queda de braço' como a examinada (entre PF e MPF)", destacou o ministro.
Primeiro a votar, Marco Aurélio Mello disse entender que, pelo fato de o delegado de polícia ser o agente em contato direto com a investigação criminal, cabe a ele a requisição de dados que interessem à apuração de fatos e busca de provas, incluindo dessa forma o acordo de delação premiada.
"A regra é ter-se a delação na fase embrionária das investigações perante a autoridade policial. Para isso existe o inquérito que é capitaneado pela autoridade policial. Mediante, sim, acompanhamento fiscalizatório do Ministério Público", ressaltou. "Não encontra amparo constitucional o argumento de que só cabe ao Ministério Público negociar acordos de colaboração", adicionou o ministro.
Para Marco Aurélio, a delação premiada "nada mais é que depoimento revelador de indícios de autoria e materialidade criminosa, o que por si só não serve à condenação de quem quer que seja". "É como o depoimento comum no processo", afirmou.
Na avaliação do ministro, o questionamento da lei que legitima os acordos da PF enfraquece o esquema de persecução penal. "A lei é clara sobre o momento que pode ocorrer a delação, que se abre na fase de investigações", destacou, ressaltando que o debate não pode ser pautado por interesses corporativos.
"O acordo não é definitivo, porque não se sabe a priori o proveito da fala do delator. O Ministério Público é o titular exclusivo da ação penal pública", afirmou Marco Aurélio, acrescentando que a representação pelo perdão judicial feita pelo delegado de polícia não é "causa impeditiva do oferecimento da denúncia pelo órgão acusador". "Quem pune não é o Ministério Público, não é a Polícia muito menos, quem pune é o Estado julgador", disse o ministro.
Durante a leitura do voto, Marco Aurélio ressaltou que a ação da PGR foi ajuizada em abril do ano passado pelo então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, antecessor de Raquel Dodge. "Não me canso de render homenagens a Janot pelos bons serviços prestados à República", observou.
O ministro ainda reclamou que o Judiciário é alvo de protestos em função da demora das investigações, e que, no entanto, em muitas casos, o tribunal está esperando a conclusão das diligências tocadas no âmbito da PGR e da PF. "Nesse vai e vem dos autos do inquérito, levamos a culpa pela morosidade nas investigações", pontuou.
A presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, interrompeu a fala do colega nesse momento para destacar que há muitos casos de inquéritos que sofreram prorrogações dos prazos para a conclusão das diligências. "Apenas pra dizer que todos nós temos de assumir nossas responsabilidades. Muitas vezes não é atraso do relator, do Supremo, há uma diligência", explicou.
Cármen Lúcia prometeu apresentar um relatório sobre o tema para esclarecer à sociedade sobre o andamento das investigações na Corte.