Policiais na favela da Rocinha (Ricardo Moraes/Reuters)
AFP
Publicado em 19 de fevereiro de 2018 às 16h32.
O vídeo é tão simples quanto sintomático: três jovens negros se colocam diante da câmera para dar "dicas para sobreviver a uma abordagem indevida" das forças de segurança. O "manual", uma resposta à intervenção federal no Rio de Janeiro, viralizou em poucas horas.
"Se você é negro, presta atenção nisso que a gente vai falar", inicia o vídeo, que começou a circular nas redes sociais no sábado e já foi visto por cerca de dois milhões de pessoas.
Primeira dica: não sair de casa tarde da noite. "Infelizmente, à noite, a partir do olhar do outro, você é não somente negro, mas bandido e apresenta perigo".
Segunda dica: não sair sem documento. Terceira: não sair sem celular e gravar tudo caso seja detido. Quarta: evitar o uso de guarda-chuva porque pode ser confundido com uma arma.
Em três minutos, os três homens fazem várias recomendações práticas para saber como se proteger contra os abusos de agentes diante do temor que aumentem, especialmente agora que os militares se encarregarão de coordenar a segurança no estado do Rio.
A "medida extrema", inédita desde a restauração da democracia em 1985, foi decretada na sexta-feira pelo presidente Michel Temer baseando-se em cenas de violência registradas durante o Carnaval, em meio a uma onda crescente de assassinatos, de ajustes de contas entre facções de traficantes de drogas e de roubos de cargas.
Ainda não se sabe o alcance desta decisão, mas setores de esquerda e movimentos sociais acreditam que a medida tem fins puramente políticos, a menos de oito meses das eleições presidenciais. Temem também que possa levar a um agravamento dos confrontos entre as forças de segurança e os traficantes.
"É triste ter esse vídeo, pensar esse vídeo, publicar esse vídeo. Mas é altamente necessário porque a gente sabe bem que a partir do momento que começa a intervenção militar quem irá sofrer as consequências no final da história, é principalmente dentro das favelas. É o que a gente sempre fala quando tem incursão policial ou militar nas favelas: quem sofre é o preto, pobre e favelado", disse o repórter e ativista Edu Carvalho, um dos três protagonistas do vídeo, ao jornal O Globo.
A maior parte dos usuários das redes sociais aplaudiu a iniciativa e muitos aproveitaram para compartilhar suas experiências traumáticas com os agentes de segurança, mas houve alguns que consideraram que a gravação é vitimista e fomenta o preconceito com os negros.