Ana Carolina Dias Cáceres: ela explica que a deficiência, como retardo mental, cegueira, ocorre em outros casos também, como na rubéola (Reprodução/Facebook)
Da Redação
Publicado em 10 de fevereiro de 2016 às 19h51.
O surto de microcefalia, resultado da epidemia do zika vírus, reacendeu o debate da flexibilização do aborto no Brasil.
De um lado, ativistas ressaltam a negligência do estado e o sofrimento da gravidez, em outra frente, médicos e pessoas com a deformação no cérebro questionam a interrupção da gravidez.
O caso mais emblemático é o de Ana Carolina Cárceres, 25 anos, diagnosticada com microcefalia antes mesmo de nascer. Ela vem fazendo um apelo às mães para que não abortem. "É preciso pensar. Eu sempre falo: mães, repensem o aborto no caso de microcefalia, se informem, não tenham medo."
Ao HuffPost Brasil, ela disse que é preciso que as pessoas se informem melhor sobre a microcefalia. Na opinião dela, a partir do momento que as consequências da má formação no cérebro se tornarem conhecidas, vai diminuir esse clamor pela interrupção da gravidez.
“Em vez de aborto, informação e investimento em tratamento. Agora tem o zika, mas antes a microcefalia já existia antes. Todo mundo acha que é algo ruim, que todos os casos são graves, mas não é verdade. Isso assusta e as pessoas acabam decidindo pelo aborto. É preciso ver o outro lado da moeda, ouvir casos como o meu, de gente que vive bem."
Ana Carolina vê um lado positivo no surto associado ao zika. “Esse debate [sobre aborto em caso de microcefalia] precisava ser feito e faltam estudos.
Infelizmente, ele veio por causa da zika, mas agora vai ter mais informação. O negativo é que a falta de informação dá medo e até o medo de descobrir que não é tão assustador assim.”
A jornalista reconhece que há casos mais graves que o dela, que não sofreu lesões no cérebro e passou bem por cinco cirurgias.
“Sei que meu caso é exceção, mas não quer dizer que todos são graves ou leves."
Vice-presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia do Rio de Janeiro, Tânia Vergara corrobora os argumentos de Ana Carolina.
Ela ressalta que nem todas as mães que têm zika durante a gestação terão filhos com microcefalia.
“Procurar um aborto antes mesmo do diagnóstico é uma situação precipitada, é um pouco de desespero. Se ela tem efetivamente o diagnóstico de microcefalia, o que é possível saber na gestação, e se ela decidir fazer um aborto, depende dela, do que ela quiser. Vale lembrar que aborto é um risco, só é legalizado no caso de risco de vida para a mãe."
Tânia destaca que se a criança tem microcefalia, certamente, vai ter alguma sequela.
“Mas o grau depende, não é igual para todo mundo. Existem crianças mais e menos afetadas, depende da área, da época da gestação em que ocorreu. Não dá para generalizar nem comparar com a anencefalia [má-formação no cérebro do feto cujo aborto é permitido pela lei brasileira].”
Ela explica que a deficiência, como retardo mental, cegueira, ocorre em outros casos também, como na rubéola.
"O ideal é que a gestante reforce os cuidados e as que não estão grávidas e estão nessas áreas de maior incidência possam adiar a gravidez. As gestantes devem usar bastante repelente, roupas de mangas comprida, procurar não ir a ambientes onde sabiamente haja acúmulo de mosquito e onde está cheio de poça de água, como parques."
Flexibilização
A antropóloga Debora Diniz, representante de um grupo de ativista que vai pedir ao Supremo Tribunal Federal um pacote de medidas de saúde pública, incluindo a flexibilização do aborto, ressalta que o estado do feto não está em discussão.
"Já temos o excludente demográfico no caso de estupro, onde as condições de vida do feto não estão em jogo e na qual o estado reconhece a situação em que a mulher vive de sofrimento na gravidez. Hoje temos mulheres com um dano indevido pela não prevenção ao mosquito. Não é uma questão de conversar sobre o feto. Estamos em uma situação de epidemia e não estamos obrigando nenhuma mulher a tomar nenhuma opção, mas queremos que o estado reconheça que ela pode ter opção”, disse ao HuffPost Brasil.
Dados mais recentes do Ministério da Saúde, divulgados no último dia 23, mostram que há 270 casos confirmados de microcefalia associado ao zika vírus e outros3.448 suspeitos sendo investigados.