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Lula pode mudar regras do Banco Central? Veja como são escolhidos os diretores

Desde fevereiro de 2021, o presidente e os diretores do BC têm mandatos fixos de quatro anos, que não coincidem com o mandato de presidente da República

Prédio do Banco Central em Brasília (Adriano Machado/Reuters)

Prédio do Banco Central em Brasília (Adriano Machado/Reuters)

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Alessandra Azevedo

Publicado em 7 de fevereiro de 2023 às 19h41.

As críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre a atuação do Banco Central na definição da taxa de juros geraram discussões, nos últimos dias, sobre o nível de independência da autoridade monetária em relação ao governo. Desde fevereiro de 2021, o presidente e os diretores do BC têm mandatos fixos de quatro anos, que não coincidem com o mandato de presidente da República.

Pela lei aprovada durante o governo Bolsonaro, Lula só poderá substituir o atual presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, em 2025. O mandato dele vai até 31 de dezembro de 2024. Até lá, o governo poderá fazer mudanças em algumas diretorias, mas de forma gradual. A legislação criada com o objetivo de dar mais autonomia ao BC também especifica em que situações os dirigentes podem ser demitidos. 

Nos próximos dias, Lula escolherá dois diretores, que ficarão quatro anos nos cargos. Em 28 de fevereiro, terminam os mandatos de Bruno Serra Fernandes à frente da Diretoria de Política Monetária e de Paulo Souza na Diretoria de Fiscalização. A primeira é considerada essencial na definição da taxa Selic, enquanto a segunda tem atribuições mais técnicas.

Todos os oito diretores do BC têm direito a voto no Comitê de Política Monetária (Copom), que a cada 45 dias se reúne para decidir os rumos da taxa Selic. Por isso, as indicações de Lula -- em especial para a Diretoria de Política Monetária -- serão vistas como importante sinalização sobre como o governo pretende conduzir a relação com o BC. 

Lula pode escolher substitutos do mercado financeiro, da academia ou servidores de carreira, por exemplo. A nomeação, no entanto, não é automática. Para que possam assumir as diretorias, os indicados precisam ser aprovados pelo Senado. Se receberem o aval dos senadores, os dois novos diretores assumem em 1º de março de 2023. Em janeiro de 2024, Lula substituirá mais dois diretores. 

Como são escolhidos os diretores do BC?

O presidente da República é responsável por indicar os integrantes da Diretoria Colegiada do Banco Central, composta pelo presidente da autarquia e por oito diretores. Lula escolherá o presidente do BC que assumirá em 2025 e ficará no cargo até o fim de 2029.

Os nomes passam por sabatina no Senado e, em seguida, precisam ser aprovados pelo plenário da Casa. Pela lei, para ser diretor ou presidente do BC, é preciso ser “brasileiro idôneo, de reputação ilibada e de notória capacidade em assuntos econômico-financeiros ou com comprovados conhecimentos que os qualifiquem para a função”. 

O presidente e os diretores do Banco Central têm mandatos fixos de quatro anos, que não devem coincidir com o mandato do presidente da República. A regra foi criada para evitar trocas arbitrárias durante o governo, por motivos políticos. Eles podem ser reconduzidos apenas uma vez, por mais quatro anos. 

Pela lei, o presidente do BC assume o cargo em 1º de janeiro do terceiro mandato do presidente da República. Os diretores são substituídos de forma escalonada, de dois em dois. As próximas trocas acontecerão nas seguintes datas:

  • Março de 2023:
    • Diretoria de Fiscalização
    • Diretoria de Política Monetária
  • Janeiro de 2024:
    • Diretoria de Assuntos Internacionais e Gestão de Riscos Corporativos
    • Diretoria de Relacionamento, Cidadania e Supervisão de Conduta
  • Janeiro de 2025:
    • Diretoria de Administração
    • Diretoria de Regulação
  • Janeiro de 2026:
    • Diretoria de Organização do Sistema Financeiro e de Resolução
    • Diretoria de Política Econômica

    É possível exonerar o presidente do BC?

    O presidente do BC e os diretores só podem ser demitidos em situações específicas previstas em lei, como a pedido ou em casos de condenação por improbidade administrativa ou crime que tenha como consequência a proibição de acesso a cargos públicos.

    O presidente da República pode pedir a exoneração dos dirigentes, incluindo o presidente do BC, mas não sem motivos claros. O pedido, nesse caso, precisará ser justificado ao Conselho Monetário Nacional (CMN) e aprovado pelo Senado por maioria absoluta -- ou seja, 41 dos 81 senadores, pelo menos.

    A lei permite a exoneração em apenas quatro situações:

    • A pedido: quando o presidente ou diretor decide deixar o cargo;
    • Por doença incapacitante: se o presidente ou diretor tiver alguma enfermidade que o incapacite para exercício do cargo;
    • Condenação: se o presidente ou diretor for condenado por prática de ato de improbidade administrativa ou crime cuja pena acarrete, ainda que temporariamente, a proibição de cargos públicos. A decisão deve ter transitado em julgado ou ter sido proferida por órgão colegiado;
    • Desempenho: se o presidente ou diretor apresentar “comprovado e recorrente desempenho insuficiente para o alcance dos objetivos do Banco Central”.

    Em caso de exoneração, o presidente da República indica o substituto, que precisa ser aprovado pelo Senado. Até a posse do novo presidente do BC, o cargo seria exercido interinamente pelo diretor mais antigo.

    Governo pode mudar regras do BC?

    Motivados pelas críticas recentes de Lula sobre a independência do BC, parlamentares governistas contrários aos mandatos fixos de dirigentes da autarquia voltaram a questionar a lei aprovada em 2021.

    Na semana passada, em entrevista à RedeTV!, Lula disse que esperaria o fim do mandato de Campos Neto para "fazer uma avaliação do que significou o Banco Central independente". Nesta terça-feira, 7, a bancada do PSol na Câmara anunciou que apresentará um projeto para revogar a lei de autonomia do BC.

    Mudanças nas regras de mandato e demissão de dirigentes do Banco Central só podem ser tratadas por projeto de lei complementar, como prevê a Constituição. Para aprovar esse tipo de proposta, são necessários 41 votos no Senado e 257 na Câmara. O assunto não pode ser discutido em projeto de lei ordinária, que precisa de maioria simples.

    A lei de autonomia do BC foi aprovada por 56 senadores -- 12 votaram contra. Na Câmara, foram 339 votos a favor e 114 contrários. Rever uma lei aprovada com placar tão favorável exigiria muito engajamento do Executivo e poderia gerar desgaste na relação entre o governo e o BC.

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