Thomas Ludewigs: Para o especialista, atrair o mercado para a a Amazônia de forma consciente é bom para a floresta, para o Estado e para as empresas (Acervo pessoal/Divulgação)
EXAME Hoje
Publicado em 26 de setembro de 2017 às 17h28.
O governo federal decidiu revogar o decreto que permitia a exploração da Reserva Nacional de Cobre e Associados (Renca), na região Amazônica, após pressão de movimentos ambientalistas e outros grupos. E essa não foi a primeira controvérsia do governo de Michel Temer em relação à pauta ambiental. Após polêmica Medida Provisória que permitia a exploração da Floresta Nacional do Jamanxim, também revogada, tramita agora no Congresso um projeto de lei que trata da regularização de antigos posseiros na região, num processo que é visto como transferência de terras públicas para proprietários privados, inclusive favorecendo a atuação de grileiros.
A discussão sobre a exploração econômica da floresta está longe de terminar — e bem longe de ser consensual também. Mas mesmo ambientalistas concordam que negócios sustentáveis, com estímulo ao desenvolvimento de comunidades locais, parece chave para conseguir manter a floresta viva e saudável. Para Thomas Ludewigs, doutor em Ciências Ambientais e membro do Centro de Desenvolvimento Sustentável (CDS) da Unb, é necessário, porém, discutir o modo de pensar na economia florestal antes de explorá-la.
Podemos utilizar o conceito de economia sustentável na floresta amazônica?
Historicamente, a floresta passou por ciclos de exploração sem que houvesse investimento. O ciclo do ouro e da borracha, por exemplo, não contribuíram com o desenvolvimento da região, e deixaram bolsões de pobreza. Com isso, a Amazônia tem sido sistematicamente objeto de saques. A população mais pobre e mais afastada das capitais não tem participação no planejamento do Estado. Parece que há um resquício do colonialismo, e que não existe democracia. O Brasil como instituição não consegue chegar nessas regiões, porque é muito sujeito a pressões locais. E a população local é muito vulnerável, e às vezes muito acomodada com a situação.
É apropriado atrair capital estrangeiro para a exploração da floresta amazônica?
Vamos a um breve exemplo de uma experiência realizada no Acre. Eu participei da avaliação do programa REM (REDD – Redução de Emissões provenientes de Desmatamento e Degradação Florestal – Early Movers). O programa é gerido pelo governo estadual do Acre e pelo banco alemão KFW, e é uma experiência piloto. Ele contabiliza o desmatamento e remunera o esforço de mitigação das mudanças climáticas. Há um incentivo para cada tonelada de carbono que deixar de ser emitida na região. Utilizando uma metodologia de contagem, pudemos ver que de 2005 para 2014, houve uma redução de quase 70% na emissão de gás carbônico. Com isso, o governo ganhou cerca de 60 milhões de dólares. E este valor corresponde a apenas uma fração de tudo que o Acre ainda pode diminuir de desmatamento. Esse exemplo nos mostra que, com incentivos do governo e de empresas privadas, o mercado pode manter taxas de desmatamento sob controle. É uma oportunidade para manter a floresta em pé.
Por que o país tem tido dificuldades, então, de conter o desmatamento da floresta?
Temos observado um desmonte total das políticas públicas de meio ambiente. E isso mostra a agenda do governo, que é a agenda de conseguir se manter no poder, e, para isso, tem que agradar a bancada ruralista. Daí vêm a falta de investimento em políticas públicas, decretos como o da Renca, mudanças em licenciamentos ambientais, etc.
É possível pensar um modelo de desenvolvimento sustentável governamental na floresta amazônica?
Como nos encontramos hoje, é impossível. O governo tem que modificar uma série de ações. Começando pela transparência e passando por escutar a população e ver a questão distributiva de orçamento. Além disso, o Estado, atualmente, não tem capacidade de monitorar a região da floresta. Para iniciar uma área de mineração, por exemplo, o governo tem que discutir e planejar a questão da organização. Porque não é só a mineração que causa o desmatamento. Existem os chamados impactos indiretos, como a circulação de pessoas no local e a abertura da mata para construir residências e fazendas.
E é possível pensar em mineração numa economia sustentável?
Estabelecendo uma política sustentável, é possível fazer exploração mineral. Tudo que possa facilitar o desenvolvimento do mercado é interessante. E existem diversos projetos que já contribuem para isso. O Desafio Natura Amazônica, por exemplo, ou o projeto Reca (da Associação dos Pequenos Agrossilvicultores), em Rondônia, ou a cooperativa agroextrativista do Xapuri, no Acre. Todos esses são exemplos de como a agrofloresta pode contribuir para o desenvolvimento sustentável da floresta.