José Dirceu: ex-ministro foi preso no âmbito da Operação Lava Jato (Vagner Rosário/VEJA)
Estadão Conteúdo
Publicado em 26 de junho de 2018 às 17h47.
O julgamento do pedido de liberdade do ex-ministro José Dirceu provocou um embate exaltado de posições entre os ministros Edson Fachin e o ministro Dias Toffoli. No fim, Dirceu conseguiu se livrar provisoriamente da prisão, apesar da resistência de Fachin durante a sessão desta terça-feira, 26, que impôs diversas derrotas ao relator da Lava Jato, numa série de cinco processos analisados.
Estava na pauta da sessão da Segunda Turma uma reclamação de José Dirceu contra sua prisão, no âmbito da Operação Lava Jato. Condenado em primeira instância, ele teve sua pena aumentada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) para 30 anos e 9 meses. Com a condenação em segunda instância, o ex-ministro foi preso em maio deste ano.
Dias antes do decreto de prisão, Dirceu recorreu ao STF argumentando basicamente dois pontos: que o STF autoriza prisão em segundo grau, mas não a tornou obrigatória; e que a prisão violava decisão da Segunda Turma, que livrou o ex-ministro de uma prisão preventiva em maio de 2017. Na ocasião, o ministro relator do caso, Toffoli, negou o pedido liminar. Assim, a prisão não foi evitada e o ex-ministro foi encarcerado no Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília.
Hoje, alegando problemas na dosimetria da pena de Dirceu, Toffoli votou para rejeitar a reclamação, mas conceder uma habeas corpus "de ofício" para o ex-ministro, ou seja, libertar o petista através de um habeas corpus que nem foi apresentado pela defesa.
Para o ministro, os argumentos de Dirceu apresentados nos recursos aos tribunais superiores mostram que há uma grande chance de a pena do ex-ministro ser reduzida, o que justifica a suspensão dos efeitos de sua condenação até que o caso seja analisado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Visivelmente contrariado, Fachin pediu vista (mais tempo de análise) em seguida, o que, em tese, paralisaria o julgamento. No entanto, Toffoli continuou e propôs que a Segunda Turma votasse a liminar do habeas corpus "de ofício".
Ao votar na liminar, Fachin alegou que a posição de Toffoli contraria o entendimento do plenário do STF, aproveitando o momento para fazer uma defesa da prisão após condenação em segunda instância, como previsto na jurisprudência atual da Suprema Corte.
O clima desagradável entre os ministros se intensificou nesse momento.
Toffoli rebateu o relator da Lava Jato, ressaltando que a concessão de liberdade nada tinha a ver com prisão em segunda instância, mas sim com problemas de dosimetria da pena de José Dirceu. "Vossa Excelência está colocando no meu voto palavras que não existem", disse Toffoli.
Fachin respondeu que mesmo assim não via motivos em conceder liberdade ao ex-ministro, e que o plenário do STF não aceita que uma reclamação (classe de processo apresentada por Dirceu) seja recebida com finalidade de habeas corpus. Toffoli revidou e disse que ambos estavam falando de coisas diferentes. Fachin rebateu: "Nós dois estamos entendendo o que estamos falando".
"Reitero meus argumentos no sentido da impossibilidade de ofício e em sede cautelar. Como disse, me permito também assentar que reputo no mínimo inconveniente que essa Segunda Turma produza julgamento destonando do plenário", sustentou Fachin, que, no entanto, ficou vencido aos ministros Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes acompanharem Toffoli.
Após a decisão, Dirceu ficará em liberdade até, pelo menos, Fachin devolver a vista do processo.
O tema da prisão após condenação em segunda instância, mesmo com os esclarecimentos de Toffoli, ganhou uma discussão à parte na sessão, com uma fala contundente do ministro Ricardo Lewandowski. No meio do debate entre Fachin e Toffoli, o presidente da Segunda Turma afirmou que o tema da execução antecipada da pena "ainda está em aberto" até que as ações que tratam do tema sejam julgadas no mérito pelo plenário.
"Enquanto essas ADCs não forem julgadas, esse tema ficará em aberto e as turmas e os magistrados não estão adstritos a um julgamento específico tomado em plenário. Urge, e faço eco às palavras do ministro Marco Aurélio, já tarde o julgamento das ADCs 43 e 44", diz Lewandowski.
Fachin, por outro lado, frisou o entendimento atual da Corte e sua própria posição pessoal. "Pena deve ser cumprida em segunda instância, como entendido por essa Corte", afirmou o relator da Lava Jato.
Outro preso em segunda instância liberado pelo colegiado nesta terça foi o ex-assessor do PP João Cláudio Genu, também condenado no âmbito da Lava Jato. Ele teve a condenação confirmada pelo TRF-4 em maio, e foi preso no fim do último mês. O julgamento, realizado antes dos ministros libertaram José Dirceu, teve contornos similares ao do ex-ministro.
Depois de Toffoli argumentar que havia motivos para suspender a execução provisória da pena, Fachin pediu vista, para então Toffoli propor a votação de habeas corpus de ofício. No caso, o relator também foi acompanhado por Gilmar e Lewandowski, deixando Fachin isolado no colegiado pela quarta vez somente na manhã desta terça. O decano da Corte, Celso de Mello, não estava presente na sessão.
Nos processos julgados anteriormente, a Segunda Turma decidiu trancar uma ação penal contra o deputado Fernando Capez (PDBS), que tramita na Justiça de São Paulo, anular uma busca e apreensão no apartamento da senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) feita em 2016, em desdobramento da Lava Jato, e confirmar o habeas corpus que libertou o suposto operado do MDB, Milton Lyra preso em abril na Operação Rizoma e solto por Gilmar em maio.
Em todos os casos, Fachin ficou vencido. Levantamento feito pelo jornal O Estado de S. Paulo e publicado nesta terça-feira mostra que o relator da Lava Jato acumula uma série de derrotas na Segunda Turma em questões cruciais da operação. Nas 30 votações mais importantes no colegiado sobre casos da Lava Jato e desdobramentos, Fachin foi derrotado ao menos 13 vezes desde que assumiu a relatoria da operação, número que deve aumentar com os resultados desta terça-feira.