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Lei estabelece "Programa de Resgate de Valores Morais"

Segundo a lei, programa deve envolver escolas, famílias, empresas, meios de comunicação e outros em revisão de valores


	Rio de Janeiro: segundo a Secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos, a lei ainda precisa ser regulamentada por um decreto que aponte como deve ser executada
 (Wikimedia Commons/ Klaus)

Rio de Janeiro: segundo a Secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos, a lei ainda precisa ser regulamentada por um decreto que aponte como deve ser executada (Wikimedia Commons/ Klaus)

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Da Redação

Publicado em 18 de janeiro de 2013 às 20h31.

Rio de Janeiro - Agora é lei: o projeto que institui no Estado do Rio o nebuloso "Programa de Resgate de Valores Morais, Sociais, Éticos e Espirituais" foi sancionado na quinta-feira (17) pelo governador Sérgio Cabral (PMDB). A responsável pela iniciativa é a deputada Myrian Rios (PSD), atriz e missionária católica do movimento de renovação carismática.

Nesta sexta-feira, a chamada "lei dos bons costumes" foi um dos assuntos mais comentados - e criticados - no Twitter entre usuários brasileiros. A finalidade do programa não está clara. Na justificativa do projeto apresentada à assembleia e divulgada nesta sexta pela deputada em redes sociais, ela afirma que a sociedade "vem cada dia mais se desvencilhando dos valores morais, sociais, éticos e espirituais", acrescentando que, sem eles, "tudo é permitido, se perde o conceito do bom e ruim, do certo e errado".

"Perde-se o critério do que se pode e deve fazer ou o que não se pode. Estamos vivendo em um mundo onde o egoísmo e a ganância são predominantes", diz Myrian.

O texto da lei estabelece que o programa deverá envolver "diretamente a comunidade escolar, a família, lideranças comunitárias, empresas públicas e privadas, meios de comunicação, autoridades locais e estaduais, organizações não governamentais e comunidades religiosas" na chamada revisão dos valores.

Após uma chuva de críticas, a deputada escreveu no Twitter que "em momento algum se faz discriminação contra qualquer religião ou sexualidade". Um dos críticos escreveu para ela que "a discriminação é clara, evidente, preconceituosa e ilegal; em especial contra gays e ateus".

Eleita em 2010, Myrian já declarou no plenário da assembleia: "Ora, se somos todos iguais, com os mesmos direitos, eu também tenho que ter o direito de não querer um funcionário homossexual, se for da minha vontade." No mesmo discurso, ela insinuou que a luta contra a homofobia estimularia a pedofilia, depois disse que foi mal interpretada e pediu desculpas.


Em entrevista nesta sexta, a deputada disse que o projeto trata do "resgate de valores da vida". Perguntada sobre como a questão do aborto seria abordada no programa, ela declarou: "Sou completamente contra. Isso é um valor moral." Segundo Myrian, a definição das prioridades será uma atribuição do governo estadual. "A sugestão que estamos dando é que se crie grupos de voluntários para fazer campanhas dentro das escolas, com palestras." Estão previstos convênios com prefeituras e ONGs.

Indicada como órgão gestor, a Secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos foi procurada pela reportagem, mas divulgou apenas uma nota, informando que a lei "ainda precisa de um decreto regulamentando-a e indicando os critérios de execução". "Ao publicá-la, o governador entende que se trata de um programa importante, mas não é uma lei auto aplicável", acrescentou. O secretário Zaqueu Teixeira (PT) não quis dar entrevista.

Segundo Myrian, que posou nua para revistas masculinas na década de 1970, quando foi casada com o cantor Roberto Carlos, o objetivo principal é "conscientizar e reinserir valores para construir um futuro melhor". "Ao longo da vida a gente vai amadurecendo e aprendendo. Estou disposta a ajudar." Professora da Faculdade de Educação da UFRJ, Tania Zagury avalia que seria muito mais válido o governo investir na qualificação do magistério. "Cidadania e valores éticos não surgem por meio de decretos ou leis", diz. "É quase uma volta da moral e cívica, com o risco de se misturar questões religiosas. O Estado deve ser laico, não pode interferir nisso."

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