(Adriano Machado/Reuters)
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Publicado em 21 de fevereiro de 2017 às 09h20.
Brasília - De perfil claramente político e pouco discreto, o ministro licenciado da Justiça Alexandre de Moraes encontrou nas suas relações partidárias fontes de polêmica e críticas da oposição, mas também credenciais que abriram o caminho para sua indicação ao Supremo Tribunal Federal (STF) pelo presidente Michel Temer.
Moraes, que já integrou o PFL (hoje DEM), PMDB, e até há pouco o PSDB --após a indicação ao Supremo, pediu sua desfiliação-- recebeu uma mão dos dois últimos, que pressionaram para que Temer o escolhesse, ainda que o presidente originalmente tivesse sinalizado preferir um nome mais discreto e técnico, como Teori Zavascki, cuja morte em um acidente aéreo abriu a vaga na corte.
A conexão política de Moraes também pesou para a sua nomeação à frente do Ministério da Justiça. Foi o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), quem sugeriu seu nome a Temer, então presidente interino da República. Integrante do PMDB, Moraes foi secretário de Segurança do tucano, época em que filiou-se ao PSDB.
O apoio tucano foi essencial para mantê-lo no comando da Justiça, após deslizes logo que assumiu a pasta.
Uma delas foi na primeira entrevista como ministro, defendendo que o presidente não precisaria indicar o nome mais votado na lista tríplice de indicados a procurador-geral da República, uma tradição estabelecida pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Temer o desmentiu em poucas horas.
Meses depois foi gravado dizendo, na saída de um comício eleitoral em Ribeirão Preto (SP), que naquela semana haveria "mais Lava Jato".
No dia seguinte, o ex-ministro petista Antonio Palocci, que tem seu reduto político na cidade paulista, foi preso, levando a suspeitas de abuso de poder.
A declaração, além de levar o então ministro e a Polícia Federal a soltarem notas negando que o Ministério da Justiça seja avisado com antecedência sobre operações, irritou o governo.
Mas foi à frente da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, antes de tornar-se ministro da Justiça, que Moraes marcou pontos na relação com Temer, garantindo a disposição do presidente, tempos depois, de indicá-lo para seu primeiro escalão, e agora para o STF.
Em abril de 2016 a primeira-dama Marcela Temer teria sido chantageada por um hacker. A notícia, à época, era a de que ele ameaçava divulgar fotos íntimas dela e de familiares.
Na ocasião, a Secretaria de Segurança Pública paulista, sob o comando de Moraes, criou uma força-tarefa para investigar o caso. O hacker foi preso e condenado por estelionato e extorsão.
O caso teve, depois outro desdobramento: o processo sobre a chantagem tornou-se público e apontou que o hacker na verdade ameaçava divulgar uma conversa entre Marcela e o irmão dela que poderia jogar o nome de Temer na "lama". Os jornais Folha de S.Paulo e O Globo, que tiveram acesso aos detalhes, foram impedidos de publicar reportagens sobre o assunto pela Justiça, em decisão posteriormente derrubada.
Mas a trajetória de Moraes não se resume às relações políticas. Sua vasta formação jurídica, aliás, é descrita no relatório de sua indicação na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, elaborado pelo senador Eduardo Braga (PMDB-AM), que também cita o apoio de diversas entidades de classe do meio jurídico à sua indicação.
Aos 49 anos, já foi promotor do Estado de São Paulo, é doutor em Direito do Estado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) onde também é professor associado, além de professor titular da Universidade Presbiteriana Mackenzie e das Escolas Superior do Ministério Público de São Paulo e Paulista da Magistratura.
Também é autor de vários livros, entre eles "Direito Constitucional" e "Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional", que tem prefácio do decano do STF, Celso de Mello, seu futuro colega na corte, caso tenha a indicação aprovada pelo Senado.
Mas foi justamente uma de suas publicações que o colocou em maus lençóis, recentemente. Reportagem da Folha de S.Paulo apontou que um livro de Direito publicado por Moraes já em sua 11ª edição reproduz, sem o devido crédito e sem informar que se trata de uma citação, trechos de obra do jurista espanhol Rubio Llorente (1930-2016), que compila decisões do tribunal do país.
Moraes informou por meio de sua assessoria ao jornal que "todas as citações do livro constam da bibliografia anexa à publicação".
Além da atuação política e jurídica, Moraes também acumulou experiência no Executivo. Antes de assumir o comando da Justiça --em um momento crítico com motins e massacres em presídios, ocasião em que coordenou o lançamento do Plano Nacional de Segurança--, já presidiu a antiga Fundação do Bem-Estar do Menor (Febem-SP), hoje Fundação Casa, e foi secretário municipal de Transportes.
Da advocacia advém outra polêmica. Moraes teria constado como advogado em uma série de processos de uma cooperativa citada em investigação sobre suposta formação de quadrilha e lavagem de dinheiro do Primeiro Comando da Capital (PCC), facção criminosa que atua principalmente em São Paulo.
Ainda secretário de Segurança Pública, Moraes afirmou em nota que renunciou a todos os processos que atuava como um dos sócios do escritório de advocacia que trabalhava. A nota acrescentava que o contrato com o escritório referia-se somente à pessoa jurídica da cooperativa e que não houve prestação de serviços advocatícios às pessoas citadas em possível envolvimento com o crime organizado.
O ministro licenciado também atuou como advogado do ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha (PMDB-RJ) por acusação de uso de documento falso, quando o peemedebista, hoje preso na operação Lava Jato, acabou absolvido.