Amapá: apagão já dura duas semanas, com restabelecimento somente gradual da energia (Rudja Santos/Amazônia Real/Divulgação)
Carolina Riveira
Publicado em 19 de novembro de 2020 às 14h27.
Última atualização em 20 de novembro de 2020 às 13h31.
A Justiça decidiu afastar por 30 dias a diretoria da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) devido ao caso do apagão no Amapá.
O apagão começou em 3 de novembro, e a instabilidade continuou mesmo após o envio de geradores termelétricos ao estado como fonte alternativa de energia. A população de cidades como a capital Macapá vem sofrendo com racionamento de energia, com retomada somente gradual do abastecimento e capacidade em torno de 80%. Nos últimos dias, blecautes voltaram a ocorrer.
O afastamento foi decisão do juiz federal João Bosco Costa Soares da Silva, da 2ª Vara Cível do Amapá, e inclui também diretores do Operador Nacional do Sistema (ONS). A decisão vem após ação popular de Randolfe Rodrigues (Rede), que é senador pelo estado.
Ainda cabe recurso. A Aneel informou em nota que ainda não foi comunicada oficialmente da decisão, mas que vai recorrer "assim que for notificada" para "reverter a decisão".
O objetivo do afastamento da diretoria da Aneel, segundo a decisão judicial, é evitar interferências na apuração das responsabilidades pelo apagão.
A Aneel foi procurada pela EXAME após a decisão judicial e disse em outra nota que "todos os esforços" no momento estão concentrados "na normalização do fornecimento de energia" e que decisões como essa "acabam gerando ruído e e prejudicando os trabalhos" de retorno dos serviços (veja a nota na íntegra no fim da página).
A agência tem sido criticada por não ter garantido manutenção suficiente na subestação que pegou fogo e levou ao apagão. Cabe à Aneel como agência reguladora supervisionar a qualidade do serviço prestado pela concessionária responsável pelo fornecimento de energia no Amapá, a Linhas de Macapá Transmissora de Energia (LMTE).
A concessionária pertencia majoritariamente à Isolux Energia e Participações, subsidiária da espanhola Isolux Corsan, que entrou em recuperação judicial na Espanha. Em meio ao processo, a Isolux Energia (assim como sua participação na LMTE) foi adquirida em 2019 por fundos de investimento, passando a se chamar Gemini Energy, empresa que tem hoje a maior participação acionária na concessão amapaense.
Na decisão judicial, que foi publicada pelo senador Rodrigues no Twitter, o juíz responsável diz que o blecaute é "um autêntico 'apagão de gestão'" e que uma investigação "minuciosa" não poderá ser feita caso os diretores da Aneel permaneçam em suas funções, porque poderiam restringir o acesso ou extraviar documentos que os comprometessem.
ATENÇÃO!
O juiz federal Dr. João Bosco acabou de acatar nossa petição na Justiça Federal do AP e decidiu pelo afastamento da diretoria da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) e também da diretoria do ONS até q sejam concluídas as investigações. pic.twitter.com/E3sm3FRsHk
— Randolfe Rodrigues (@randolfeap) November 19, 2020
O apagão é decorrente de um incêndio na subestação de Macapá, e os transtornos à população devem continuar nos próximos dias. Na segunda-feira, o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, afirmou que não havia possibilidade técnica de restabelecer 100% da energia elétrica. A situação fez o Tribunal Superior Eleitoral também cancelar a eleição em Macapá por não conseguir garantir a segurança do pleito, que foi adiado para dezembro.
O diretor-geral da Aneel, André Pepitone, teve de ir ao Congresso nessa terça-feira para prestar esclarecimentos sobre as causas do apagão. Ele afirmou que o relatório de análise de perturbação, documento que aponta os motivos do apagão, ficaria pronto nos próximos dez dias.
O diretor disse na audiência pública que os responsáveis serão penalizados e que os consumidores que tiverem equipamentos queimados devido ao apagão serão ressarcidos pela Aneel se entrarem na Justiça.
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que também é do estado, defendeu neste mês que a Aneel revogasse a concessão da concessionária Linhas de Macapá Transmissora de Energia (LMTE), e que o empreendimento seja assumido pela estatal Eletronorte, que é subsidiária da Eletrobras.
O apagão deve dificultar o avanço do processo de privatização da Eletrobras, que foi classificado como prioridade do Ministério de Minas e Energia, mas já enfrenta resistência no Congresso. Parlamentares ouvidos pela EXAME trataram o apagão como "uma pá de cal" nos planos do governo.
A Gemini Energy tem a maior fatia da LMTE, concessionária no Amapá, com 85,04% de participação. Outros 14,96% são da Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam), autarquia do governo federal vinculada ao Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR).
Todos os esforços, no atual momento, estão concentrados na normalização do fornecimento de energia no Amapá. Os geradores que vão suprir emergencialmente o estado já estão em Macapá. Equipes da Aneel, inclusive, integram a comitiva do ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, ao estado nesta quinta-feira (19/11) que vai acompanhar o andamento dos trabalhos com vistas à plena normalização do atendimento.
A Aneel respeita a decisão da Justiça, mas ações como essa acabam gerando ruído e prejudicando os trabalhos em um momento em que todos os esforços deveriam estar concentrados no restabelecimento pleno do fornecimento de energia no Amapá.
(Com informações do Estadão Conteúdo)
*A reportagem afirmava anteriormente que a Isolux Corsan havia sido vendida para fundos e passado a se chamar Gemini Energy em meio ao processo de recuperação judicial na Espanha. A empresa vendida foi somente sua subsidiária, a Isolux Energia e Participações, que é a detentora da participação na concessionária do Amapá. A informação foi corrigida.