Lava Jato: José Bumlai seria elo entre Constran, alvo agora da Lava Jato, e prefeitura de Campinas (Divulgação / Polícia Federal)
Da Redação
Publicado em 30 de janeiro de 2015 às 17h35.
São Paulo - A Justiça de São Paulo retomou o processo criminal do Caso Sanasa - esquema de fraudes e corrupção em contratos de obras de abastecimento e saneamento da empresa municipal de água de Campinas.
O escândalo envolve duas construtoras do suposto cartel que atuava na Petrobras - a Camargo Corrêa e a Constran - e pode complicar a vida do empresário e pecuarista José Carlos Bumlai, novo alvo da Operação Lava Jato.
Bumlai - o amigo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva - é citado nos autos do Caso Sanasa, apesar de não ser réu.
Uma investigação envolvendo sua atuação em favor da construtora Constran deve ser retomada pelo Gaeco, núcleo do Ministério Público que combate o crime organizado.
O pecuarista foi membro do conselho de administração da empreiteira.
As apurações podem ajudar os investigadores da Lava Jato, após o nome de Bumlai cair no radar da Polícia Federal no termo de delação premiada de Paulo Roberto Costa, o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras.
Costa apontou Bumlai como alguém "muito ligado ao PT" e "muito próximo" do lobista Fernando Antonio Falcão Soares, o Fernando Baiano, suposto arrecadador e movimentador de propina para o PMDB, dentro da Petrobras - preso pela Lava Jato desde novembro de 2014.
Dois anos antes das investigações da Lava Jato chegarem ao suposto esquema comandado pelo PT que arrecadava de 1% a 3% nos grandes contratos da Petrobras, Bumlai teve a prisão temporária pedida pelos promotores do Caso Sanasa.
Propina
Segundo as acusações, Bumlai seria o elo entre a Constran - alvo agora da Lava Jato - e a prefeitura de Campinas, em um contrato milionário com a Sanasa para as obras de construção da Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) Anhumas - feita em parte com recursos federais.
O MP sustenta que por meio de fraudes e propinas, que variavam de 5% a 7%, empreiteiras - entre elas a Camargo Corrêa e a Constran - patrocinaram um esquema de mensalinho na Câmara de Campinas.
No topo da organização criminosa denunciada estaria a ex-primeira-dama de Campinas Rosely Nassim Jorge Santos. Considerado o maior escândalo político de Campinas, o Caso Sanasa levou à cassação o prefeito Hélio Oliveira Santos (PDT) e seu vice, Demétrio Vilagra (PT), em 2012.
Na época, o caso abalou o PT e fez com que o ex-ministro José Dirceu - que ainda não havia sido condenado no mensalão - desembarcasse na cidade para uma visita relâmpago para tentar apaziguar a crise política instalada.
Amigo do presidente
Em outubro de 2011, a Justiça indeferiu o pedido de prisão de Bumlai. Na decisão, o juiz da 3ª Vara Criminal de Campinas, Nélson Augusto Bernardes, apontou a necessidade de apurações mais aprofundadas sobre seu envolvimento.
O estopim do caso foram os depoimentos de Luiz Augusto Castrillon de Aquino, que presidiu a Sanasa de janeiro de 2005 a julho de 2008. Em delação premiada, em dois extensos depoimentos, Aquino detalhou o mensalinho, com recebimento de parcelas fixas da propina por servidores e citou a atuação de Bumlai.
O delator disse ter sido "coordenador estratégico da campanha de Dr. Hélio em 2004, da qual 'Bumlai participou ativamente'". "No início do primeiro mandato, o prefeito nomeou a mulher chefe de gabinete, tendo ela assumido amplos poderes na gestão", disse Aquino.
"Rosely decidiu montar esquema de arrecadação financeira clandestina na administração. Ou ingressava no esquema e propiciava a arrecadação ilícita de fundos ou era tirado do cargo que ocupava."
Segundo Aquino, a primeira-dama "estabelecia metas anuais" e citou oito contratos em que os "porcentuais (da propina) variavam de 5% a 7% sobre o valor da obra." O esquema teria atuado de 2005 a 2008 e gerado um rombo de R$ 200 milhões.
Segundo o relatório do Gaeco, "informações apontam que a participação de Bumlai no esquema investigado extrapola a simples representação dos interesses da Constran junto ao grupo de Rosely Nassim e o correlato repasse de porcentuais do contrato mantido com a Sanasa".
"Já há informações no sentido de que Bumlai teria participação ainda mais direta no esquema de corrupção, inclusive com possível ascendência sobre Rosely Nassim", diz o texto.
Lula
O nome de Bumlai foi mencionado na interceptação telefônica de um diálogo entre um advogado e o delator do Caso Sanasa. Relatório do Gaeco destaca que, em 26 de abril, Aquino conversa com o advogado após reunião com um homem chamado de Ítalo Barione.
"De acordo com Luiz Aquino, Ítalo Barione estaria colhendo informações, a pedido do próprio José Carlos Bumlai, para viabilizar a formalização, junto ao Ministério Público, de delação premiada em favor dele", informa o documento.
"Aquino relata que Bumlai teria intenção de proteger Lula." Um resumo da conversa, nos autos da promotoria: "Aquino diz que Bumlai quer fazer acordo e "o que ele puder fazer para proteger Lula, tudo bem"".
Para os promotores, "o teor do diálogo é totalmente pertinente". Eles falam das relações de Bumlai e Lula.
"O empresário talvez tivesse a preocupação de não propiciar uma exposição negativa em razão da amizade de ambos."
A possibilidade de uma delação por parte do pecuarista para "proteger Lula" integrou o pedido de prisão dos promotores. Sua defesa negou, na época, a intenção, classificada de mentira.
Conexão
Os traços comuns, como modus operandi, pessoas e empresas envolvidas nos esquemas montados na Sanasa, em Campinas, e na Petrobras serão apurados pelos investigadores da Lava Jato.
Dalton dos Santos Avancini, executivo da Camargo Corrêa preso desde 14 de novembro de 2014 no escândalo Petrobras, é um dos réus do processo do Caso Sanasa, em Campinas. O processo foi retomado e está em fase final.
A Camargo Corrêa, que foi contratada nas obras da ETE Anhumas, teria pago propina no esquema.
O juiz Nélson Augusto Bernardes chegou a decretar a prisão do executivo, em 2011, ele foi considerado foragido e acabou conseguindo a suspensão da medida.
A Constran, também investigada na Lava Jato, foi outra contratada pela Sanasa para as obras da ETE Anhumas. Hoje a Constran pertence à UTC, cujo presidente, Ricardo Pessoa, foi preso pela Lava Jato apontado como coordenador do suposto cartel que se autodenominava "clube" para fatiar obras da Petrobras.
O advogado Mario Sérgio Duarte Garcia, que representa José Carlos Bumlai, afirmou que o cliente não é "muito próximo" de Fernando Baiano. Segundo o defensor, o pecuarista apenas o conhece.
"Não é jamais foi elo entre Constran e a prefeitura de Campinas. Ele não participou (de esquema) e não se envolveu em irregularidade. Não tem cabimento fazer delação premiada, porque ele não é investigado e nem foi acusado. O nome dele foi inventado pelo Aquino."
Em nota, a UTC informou que "adquiriu participação acionária na Constran em 2010".
"A Construtora Camargo Corrêa tem prestado os esclarecimentos para demonstrar a regularidade de sua atuação neste contrato", afirmou a Camargo Corrêa.