Adilson Primo, ex- presidente da Siemens no Brasil: depois de perceber operações suspeitas no exterior, Justiça pede quebra de sigilo bancário de executivo (EXAME)
Da Redação
Publicado em 1 de dezembro de 2013 às 09h44.
São Paulo - Relatório de Inteligência do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) apontou "operações atípicas" em conta do ex-presidente da Siemens do Brasil Adilson Antonio Primo, logo após a saída dele da multinacional alemã. A movimentação incomum e suspeitas envolvendo uma outra conta de Primo no exterior levaram a Justiça Federal em São Paulo a decretar a quebra do sigilo bancário e fiscal do executivo por suspeita de "indícios de delitos" de crime financeiro.
A abertura dos dados bancários de Primo alcança um lapso de 10 anos, entre 2001 e 2011 - período em que ele dirigiu a empresa. Em agosto, o juiz Fabio Rubem David Müzel, da 6.ª Vara Criminal Federal, determinou ao Banco Central que encaminhe em planilha e dados tabulados "todas as informações sobre remessas e recebimentos de recursos internacionais e de operações de câmbio, além de outros recursos no exterior e declarações de bens e capitais relacionados ao sr. Adilson Primo."
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O juiz ressalta que as medidas são "pertinentes e adequadas às investigações, com o fim de averiguar se a evolução patrimonial do investigado condiz com os rendimentos percebidos nos últimos anos, bem como se eventuais recursos mantidos no exterior foram declarados às autoridades fiscais".
O afastamento do sigilo foi autorizado nos autos do inquérito da Polícia Federal que investiga o cartel dos trens - conluio de poderosas companhias para conquistar licitações milionárias no setor metroferroviário de governos do PSDB em São Paulo, entre 1998 e 2008.
A PF e a Procuradoria investigam pagamento de propinas a agentes públicos e políticos. A Siemens fechou acordo de leniência com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) para denunciar o cartel. Executivos da Siemens prestaram depoimento à PF. Nenhum deles imputa qualquer prática ilícita a Primo.
Ele foi demitido no dia 11 de outubro de 2011 após a Siemens descobrir que 6 milhões da empresa foram enviados para a conta de um banco no paraíso fiscal de Luxemburgo que tinha Primo entre seus titulares. A descoberta ocorreu em meio a uma auditoria interna da Siemens que apurou suposto esquema de corrupção em diversos países.
Ao autorizar a quebra do sigilo do executivo, a Justiça acolheu pedido da PF e manifestação da Procuradoria da República baseados no relatório de inteligência 6789 do Coaf.
O documento mostra que Primo solicitou, na semana seguinte à sua demissão, a transferência, para a mulher, Thalita Cravieri Vicente, das cotas de fundo de investimento exclusivo mantido com a Siemens no valor de R$ 1 milhão. "É de se ressaltar que as movimentações financeiras tidas como atípicas ocorreram logo após a demissão de Adilson da presidência do Grupo Siemens do Brasil, em virtude das supostas irregularidades", assinala o juiz.
Segundo o Coaf, ao ser advertido de que a transferência não poderia ser feita, Primo teria informado que faria o resgate dos investimentos e enviaria para a conta da mulher. No dia 17 de outubro, Primo zerou o fundo e transferiu o dinheiro.
Escudo. O juiz anotou: "Há indícios da prática de delitos afetos à competência desta vara (crimes financeiros e lavagem de dinheiro), tendo em vista a informação de que o representado teria supostamente movimentado conta no exterior, razão pela qual se mostram pertinentes os pleitos (da PF)."
"Patente a necessidade-utilidade e a pertinência da quebra dos sigilos bancário e fiscal de Adilson Primo", destaca o juiz.
Müzel pondera que "direitos fundamentais não podem servir de escudo protetor para empreitadas criminosas e, existindo indícios concretos de ocorrência de atividades ilícitas, é razoável que se autorize o sacrifício do direito/garantia individual em prol do legítimo interesse da repressão estatal".
Sediada no Banco Itaú Europa Luxemburgo, no Grão Ducado de Luxemburgo, a conta tinha como titular a offshore Singel Canal Services CV, com 99,99% das suas cotas em mãos da fundação privada Suparolo Private Foundation - formada por Primo e três sócios.
Em agosto, Primo afirmou que a conta de Luxemburgo era uma "conta de compensação" criada e operacionalizada pelo diretor financeiro da Siemens Brasil com aval da matriz alemã, o que, segundo ele, era praxe na empresa em todo o mundo até 2007.
A Siemens diz que não pode comentar o assunto porque há um processo sobre o caso que corre sob segredo - Primo questiona na Justiça do Trabalho sua demissão por justa causa. Na ação, advogados da multi declaram que a conta não pertencia a ela e nem a nenhuma de suas afiliadas e indicam que o repasse de dinheiro para o paraíso fiscal não era autorizado.
Advogado vê 'oportunidade' para defesa de executivo
O criminalista Antonio Cláudio Mariz de Oliveira, que representa Adilson Primo, disse que o executivo "recebeu a notícia do pedido de quebra de seus sigilos fiscal e bancário pela autoridade policial, bem como seu deferimento judicial, como uma oportunidade de demonstrar a correção de sua conduta como presidente da Siemens do Brasil". "Ficará provado que Adilson jamais praticou ou soube da existência de ilícitos durante a sua gestão", afirma.
Mariz observou que só agora Primo "tomou conhecimento de que alguns dirigentes da empresa teriam praticado irregularidades, todas à sua revelia". Ele é enfático. "Aliás, o nome de Adilson jamais foi mencionado como participante das apontadas irregularidades. Sobre as movimentações constantes do relatório do Coaf, serão tranquilamente explicadas quando Adilson tiver oportunidade para tanto."