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Justiça de Minas bloqueia R$ 7,5 milhões da Fundação Renova

Valor deve ser repassado a municípios como indenização a gastos do rompimento da barragem do Fundão, em 2015

Mariana: Cidade foi destruída por lama após rompimento de barragem (Antonio Cruz/Agência Brasil)

Mariana: Cidade foi destruída por lama após rompimento de barragem (Antonio Cruz/Agência Brasil)

AB

Agência Brasil

Publicado em 14 de fevereiro de 2019 às 21h52.

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) determinou nesta quinta-feira (14) o bloqueio de R$ 7,5 milhões da Fundação Renova, entidade criada para reparar os danos causados pela tragédia de Mariana (MG). A medida tem como objetivo assegurar que os municípios mineiros de Rio Doce, Barra Longa e Santa Cruz do Escalvado possam ter acesso, cada um, ao valor de R$ 2,5 milhões referente aos gastos extraordinários realizados após o rompimento da barragem do Fundão, da mineradora Samarco, em novembro de 2015.

Dezenove pessoas morreram no episódio, que provocou prejuízos em toda a Bacia do Rio Doce. Em março de 2016, um Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC) foi firmado pelo governo federal, pelos governos de Minas Gerais e do Espírito Santo, pela Samarco e por suas acionistas Vale e BHP Billiton. O acordo estabeleceu que as mineradoras deveriam arcar com os custos para reparar todos os danos, que a Fundação Renova ficaria encarregada de gerir as ações a serem desenvolvidas e que todas as atividades seriam fiscalizadas por um comitê interfederativo composto por órgãos públicos.

O ressarcimento dos gastos extraordinários é uma das medidas previstas no TTAC. Incluem-se nas despesas a mobilização de funcionários da prefeitura e da Defesa Civil, além da jornada regular de trabalho, o aluguel de tratores para reabrir estradas, os custos dos alojamentos improvisados para os desalojados, o abastecimento alternativo de água, entre outros serviços emergenciais.

Uma metodologia pactuada entre a Fundação Renova e os 39 municípios considerados impactados levou ao cálculo do valor de R$ 53 milhões, a ser distribuído proporcionalmente conforme os recursos empenhados por cada um deles. A divergência teve início quando foi exigida das prefeituras a assinatura de um acordo que previa, entre outros compromissos, a desistência de uma ação movida no Reino Unido que dava quitação de outros direitos existentes. A entrega do documento foi colocada como pré-requisito para a realização do repasse financeiro.

O processo no Reino Unido foi proposto pelo escritório anglo-americano SPG Law em novembro do ano passado e tem como alvo a mineradora inglesa BHP Billiton, uma das acionistas da Samarco. A ação busca indenização integral pelos prejuízos causados em decorrência da tragédia. Segundo o escritório SPG Law, houve mais de 250 mil adesões, incluindo pessoas atingidas, empresas e municípios, além da Igreja Católica.

Municípios que não concordaram com a exigência da Fundação Renova, entre eles Rio Doce, Barra Longa e Santa Cruz do Escalvado, moveram ações no TJMG para cobrar o ressarcimento dos gastos extraordinários. Os argumentos apresentados pelas prefeituras dessas três cidades foram aceitos pelo juiz Bruno Taveira.

"A exigência de quitação a quaisquer outros direitos eventualmente existentes, inclusive danos futuros, e a impossibilidade de o município nada mais reclamar em tempo e lugar algum, a qualquer pretexto, é uma afronta ao gestor público responsável, que ainda não possui a dimensão de eventuais danos futuros ocasionados pelo desastre", escreveu o magistrado. Em nota, a Fundação Renova disse que segue em negociação com todos os municípios que devem ser ressarcidos pelos gastos extraordinários efetuados.

O juiz Bruno Taveira avaliou que houve abuso do poder econômico no comportamento da Fundação Renova ao exigir a desistência de pleitos judiciais de municípios que passam por extrema dificuldade financeira. Segundo ele, a situação revela a possibilidade de uma utilização disfuncional da entidade, que teria fugido de seu objetivo institucional na tentativa de proteger as mineradoras.

"Verifica-se uma atuação aparentemente disfuncional, na medida em que a Fundação Renova exige a assinatura de cláusulas de ampla quitação, em atitude de inegável defesa da Samarco, Vale e BHP Billiton", escreveu na decisão. Ele também lamenta que, passados mais de três anos, "não houve a devida reparação dos municípios atingidos pelo rejeito de mineração."

A observação de Bruno Taveira vai ao encontro de colocações feitas à Agência Brasil pelo procurador do Ministério Público Federal, Helder Magno da Silva, integrante da força-tarefa que atua nos desdobramentos da tragédia de Mariana e foi também recém-nomeado apara atuar no caso do rompimento da mina da Barragem Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG). "A Fundação Renova no papel é uma entidade independente. Mas na nossa visão, ela não tem mostrado essa independência diante das empresas."

Helder avalia que será preciso debater se há a necessidade ou não de se fundar uma instituição similar para atuar em Brumadinho. "Se pensou na criação de uma entidade privada baseada naquela ideia que sempre associa o público à morosidade. Mas a Fundação Renova tem se mostrado excessivamente burocrática", acrescentou.

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