LGBT: de acordo com a norma, "os psicólogos não exercerão qualquer ação que favoreça a patologização de comportamentos ou práticas homoeróticas" (Gleb Garanich/Reuters)
Estadão Conteúdo
Publicado em 19 de setembro de 2017 às 10h32.
São Paulo - Ao proibir que o Conselho Federal de Psicologia "censure" a reversão sexual, conhecida como "cura gay", o juiz federal da 14ª Vara de Brasília Waldemar Cláudio de Carvalho afirmou que a proibição do tratamento afeta a "liberdade científica do país".
O magistrado acolheu, parcialmente, ação movida pela psicóloga Rozângela Alves Justino, que foi censurada em 2009 pelo Conselho Federal de Medicina em razão de oferecer a terapia de reversão sexual aos seus pacientes.
A defesa da psicóloga e de outros apoiadores da ação pedia para que fosse suspensa a Resolução nº 001/1999 do Conselho Nacional de Psicologia.
De acordo com a norma do colegiado, "os psicólogos não exercerão qualquer ação que favoreça a patologização de comportamentos ou práticas homoeróticas, nem adotarão ação coercitiva tendente a orientar homossexuais para tratamentos não solicitados". "Os psicólogos não exercerão com eventos e serviços que proponham tratamento e cura das homossexualidades".
O magistrado não considerou a norma que proíbe a "cura gay" como inconstitucional, mas disse entender que os profissionais não podem ser censurados de promover a terapia a pacientes que a solicitarem.
"Por todo o exposto, vislumbro a presença dos pressupostos necessários à concessão parcial da liminar vindicada, visto que: a aparência do bom direito resta evidenciada pela interpretação dada à Resolução nº 001/1990 pelo C.F.P., no sentido de proibir o aprofundamento dos estudos científicos relacionados à (re) orientação sexual, afetando, assim, a liberdade científica do País e, por consequência, seu patrimônio cultural, na medida em que impede e inviabiliza a investigação de aspecto importantíssimo da psicologia, qual seja, a sexualidade humana".
O Conselho Federal de Psicologia de manifestou: "A Justiça Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal acatou parcialmente o pedido liminar numa ação popular contra a Resolução 01/99 do Conselho Federal de Psicologia (CFP) que orienta os profissionais da área a atuar nas questões relativas à orientação sexual. A decisão liminar, proferida nesta sexta-feira (15/9), abre a perigosa possibilidade de uso de terapias de reversão sexual", diz o texto.
"A ação foi movida por um grupo de psicólogas (os) defensores dessa prática, que representa uma violação dos direitos humanos e não tem qualquer embasamento científico. Na audiência de justificativa prévia para análise do pedido de liminar, o Conselho Federal de Psicologia se posicionou contrário à ação, apresentando evidências jurídicas, científicas e técnicas que refutavam o pedido liminar".
"Os representantes do CFP destacaram que a homossexualidade não é considerada patologia, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) - entendimento reconhecimento internacionalmente. Também alertaram que as terapias de reversão sexual não têm resolutividade, como apontam estudos feitos pelas comunidades científicas nacional e internacional, além de provocarem sequelas e agravos ao sofrimento psíquico".
"O CFP lembrou, ainda, os impactos positivos que a Resolução 01/99 produz no enfrentamento aos preconceitos e na proteção dos direitos da população LGBT no contexto social brasileiro, que apresenta altos índices de violência e mortes por LGBTfobia. Demonstrou, também, que não há qualquer cerceamento da liberdade profissional e de pesquisas na área de sexualidade decorrentes dos pressupostos da resolução".
"A decisão liminar do juiz federal Waldemar Cláudio de Carvalho mantém a integralidade do texto da Resolução 01/99, mas determina que o CFP a interprete de modo a não proibir que psicólogas (os) façam atendimento buscando reorientação sexual. Ressalta, ainda, o caráter reservado do atendimento e veda a propaganda e a publicidade".
"Interpretação - O que está em jogo é o enfraquecimento da Resolução 01/99 pela disputa de sua interpretação, já que até agora outras tentativas de sustar a norma, inclusive por meio de lei federal, não obtiveram sucesso. O Judiciário se equivoca, neste caso, ao desconsiderar a diretriz ética que embasa a resolução, que é reconhecer como legítimas as orientações sexuais não heteronormativas, sem as criminalizar ou patologizar. A decisão do juiz, valendo-se dos manuais psiquiátricos, reintroduz a perspectiva patologizante, ferindo o cerne da Resolução 01/99".
"O Conselho Federal de Psicologia informa que o processo está em sua fase inicial e afirma que vai recorrer da decisão liminar, bem como lutará em todas as instâncias possíveis para a manutenção da Resolução 01/99, motivo de orgulho de defensoras e defensores dos direitos humanos no Brasil", finaliza o texto.