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Isolamento menor pode agravar pico de covid-19 previsto para maio

Especialista da USP criticou o que aponta ser uma falta de coordenação do governo federal, que tem atrapalhado o combate ao coronavírus

São Paulo: taxa de isolamento na cidade tem diminuído (Germano Lüders/Exame)

São Paulo: taxa de isolamento na cidade tem diminuído (Germano Lüders/Exame)

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Reuters

Publicado em 30 de abril de 2020 às 20h30.

Última atualização em 30 de abril de 2020 às 20h30.

A pandemia de covid-19, doença respiratória provocada pelo novo coronavírus, deve chegar ao seu pico no Brasil no dia 10 de maio e há possibilidade de se agravar após esta data devido à queda no isolamento social registrada na maior parte do país, disse à Reuters o professor da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP) e ex-presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) Gonzalo Vecina Neto.

O especialista, que já atuou como secretário de Saúde da cidade de São Paulo e como secretário de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde, criticou o que aponta ser uma falta de coordenação do governo federal, o que, em sua avaliação, tem atrapalhado os esforços de combate ao coronavírus.

"Nós ainda estamos na fase ascendente da curva", disse Vecina Neto à Reuters na quarta-feira ao comentar o atual estágio da pandemia no país, acrescentando que modelos matemáticos baseados no comportamento da doença na Europa e na Ásia indicam que o pico no Brasil se dará no dia 10 de maio.

"Pode ser que chegue lá (no pico) e continue, pode ser que chegue lá e comece a cair", acrescentou. "Tudo pode acontecer, principalmente com essa liberalidade pela população, que não está respeitando o isolamento social. Minha expectativa é que vamos continuar subindo depois do dia 10", afirmou.

Diante de um cenário de expansão no crescimento dos números de casos e mortes confirmadas pela Covid-19 no país, Vecina Neto criticou o que vê como falta de uma coordenação por parte do governo federal e a ausência de uma orientação nacional no combate à pandemia.

"No momento nós estamos sem autoridade federal de saúde. Não tem mais o que dizer", afirmou o ex-presidente da Anvisa.

O ministro da Saúde, Nelson Teich, tem insistido que é necessário primeiro colher a maior quantidade possível de informações sobre o vírus para atuar com base nesses dados. O ministro afirmou na quarta-feira, em audiência virtual no Senado, que ninguém sabe quando será o pico de contaminação, uma vez que ainda são necessários mais dados.

"Não sei e ninguém sabe", disse Teich, ressaltando que as projeções são feitas a partir de suposições com base em modelos, mas que ainda há muitas incertezas.

Teich tomou posse no dia 17 de abril em plena pandemia, após o presidente Jair Bolsonaro demitir Luiz Henrique Mandetta do cargo por divergências entre os dois sobre o distanciamento social. Mandetta defendia que todas as pessoas que não atuam em serviços considerados essenciais ficassem isoladas, enquanto Bolsonaro advoga pelo isolamento apenas dos integrantes do grupo de risco --idosos e pessoas com comorbidade.

Vecina Neto apontou para uma falta de comando do governo federal no combate à doença.

"Não estamos tendo orientação nacional", disse. "Essa falta de coordenação do ministério é muito ruim. Estados que estão entrando em falência estão ficando órfãos, como Amazonas, Ceará e o Pará", avaliou.

"Desastre"

Para Vecina Neto, o ministério deveria estar concentrado na distribuição de equipamentos de proteção individual (EPIs) para os profissionais de saúde de Estados e municípios e elaborando uma política de testagem eficiente, que levasse em conta desafios logísticos e de processamento da grande quantidade de kits de exame de detecção de Covid-19 recentemente adquiridos.

Ele também criticou o papel que Bolsonaro tem desempenhado na crise causada pela pandemia, classificando-o de "um desastre" e afirmando que o presidente não só não tem ajudado, como ainda tem atrapalhado com declarações e gestos que minimizam a gravidade da situação.

"As pessoas acham que o que elas falam não tem consequência", criticou. "Qual a consequência das pessoas acreditarem nele (Bolsonaro)? Vão deixar de fazer isolamento social, vão adotar o comportamento de risco que ele está tendo", disse.

Além de criticar constantemente o distanciamento social, apontando que ele terá fortes impactos no emprego e no desempenho da economia, Bolsonaro também tem provocado aglomerações em passeios que faz por Brasília aos fins de semana e essas voltas que dá pela capital foram um dos principais pontos de atrito com Mandetta. Ele também costuma minimizar a pandemia e já se referiu à Covid-19 como uma "gripezinha", além de nesta semana desdenhar a alta diária recorde no número de mortos pela doença.

Segundo dados do Ministério da Saúde, divulgados na quarta-feira, o país tem 78.162 casos confirmados da doença --6.276 novos casos em relação ao dia anterior, um recorde diário-- com 5.466 mortes --acréscimo de 449 na comparação com a terça-feira, quando o país registrou recorde no número de óbitos provocados pela doença em 24 horas.

Outro fator que preocupa Vecina Neto é o fato de muitas pessoas ainda caminharem pelas ruas sem máscaras de proteção. O uso do equipamento ajuda a evitar a contaminação.

"Está havendo muito contato e o contato é a forma de transmissão", disse.

Algumas cidades tornaram obrigatório o uso de máscaras nas ruas e, na quarta-feira, os governos estadual e municipal de São Paulo anunciaram que as pessoas terão que usar no transporte público, nos táxis e nos transportes por aplicativo a partir de 4 de maio.

Procurados, o Ministério da Saúde e o Palácio do Planalto não responderam imediatamente a pedidos de comentários sobre as declarações de Vecina Neto.

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