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As duas fabricantes das vacinas mais utilizadas no Brasil correm o risco de ter que parar produção (Erasmo Salomao/Ministério da Saúde/Divulgação)
Bloomberg
Publicado em 12 de maio de 2021 às 16h19.
Os insumos usados para produzir a vacina contra a covid-19 da AstraZeneca no Brasil podem se esgotar até o final desta semana, agravando a já precária campanha de vacinação, diante das dificuldades para o aumento da produção local.
A Fiocruz, que tem parceria com a Astra para produzir o imunizante no país, possui quantidade suficiente de Ingrediente Farmacêutico Ativo (IFA) para sustentar a fabricação até o início da próxima semana e talvez tenha que interrompê-la se um novo lote de insumos não chegar até este sábado, disse o diretor de Bio-Manguinhos, Mauricio Zuma, em entrevista.
“Estamos aguardando a AstraZeneca confirmar se o lote chega nesta semana ou na próxima”, afirmou Zuma, que chefia a unidade da Fiocruz responsável por pesquisas e produção de vacinas. “Se chegar na semana que vem, talvez tenhamos que parar a produção por alguns dias.”
Ao mesmo tempo, o Instituto Butantan, que se associou à Sinovac Biotech para produzir a vacina CoronaVac, também está ficando sem matéria-prima, já que milhares de litros de insumos estão retidos na China, aguardando a liberação do governo. O Butantan, que fabrica a maior parte das vacinas usadas no Brasil, tem IFA suficiente para durar até sexta-feira – depois disso, vai interromper a produção, disse o governador João Doria, nesta quarta-feira.
Os atrasos na produção da Fiocruz devem ter impacto nas entregas de junho, já que os lotes que estão sendo feitos agora ainda precisam passar pelo controle de qualidade e pelo processo de validação antes de serem entregues ao sistema público de saúde.
A campanha de vacinação em massa do Brasil tem sido afetada por atrasos de insumos e escassez de doses desde que começou. Estados e municípios tiveram de interromper a imunização várias vezes pela falta de vacinas, e o Ministério da Saúde reduziu o número estimado de doses disponíveis.
O país aplicou cerca de 54 milhões de doses até agora, ocupando o quinto lugar no ranking global em termos absolutos. Mas com 212 milhões de pessoas, isso foi o suficiente para cobrir apenas 17% da população com a primeira dose, enquanto 8,7% já estão totalmente vacinados.
Apesar de ter saído do pico de 4 mil mortes da segunda onda no mês passado, o Brasil registrou já 425 mil mortes pelo vírus, atrás apenas dos EUA em todo o mundo.
Embora o imunizante da Pfizer já tenha começado a ser aplicado no país, as vacinas da Astra e da Sinovac são de longe as mais utilizadas.
Zuma, da Fiocruz, afirma que a burocracia é o principal motivo da escassez de insumos, embora outros citem um relacionamento político tenso com a China.
“Tem as questões políticas, mas a gente não se envolve muito nisso. Quando começaram as demoras na liberação do IFA que envolvem as autoridades chinesas, envolvemos a diplomacia brasileira”, disse. “Nosso foco é produzir.”
A Fiocruz entrega de 4 milhões a 6 milhões de doses por semana ao Sistema Único de Saúde (SUS), bem abaixo do 1,4 milhão de doses por dia previstas no início deste ano. Zuma disse que os atrasos na entrega de insumos e o ajuste fino do processo de produção contribuíram para a redução da oferta.
O plano do Brasil de depender exclusivamente da produção local para suas vacinas foi adiado.
A previsão era que a Fiocruz começasse a produzir o IFA localmente em abril, mas a fundação ainda não assinou o acordo de transferência de tecnologia que permitirá isso. Agora, Zuma disse que a produção local começará em modo de teste esta semana, com entrega prevista apenas em outubro.
“Estamos fazendo um grande esforço para assinar o contrato. Se não nesta semana, na outra, e não pode passar disso, porque senão isso vai interferir no cronograma que traçamos”, afirmou.
O atraso para assiná-lo pode ser explicado pelas complexidades comerciais e financeiras, bem como por questões tecnológicas e jurídicas, segundo ele.
Para diminuir a diferença de meses entre a produção com insumos chineses e nacionais, a Fiocruz está discutindo três alternativas, disse Zuma.
A primeira é a aquisição de 8 milhões de doses prontas da Índia, que deveriam chegar em março, o que não ocorreu devido ao avanço do vírus no país asiático. A segunda é a entrega de doses do consórcio Covax Facility. E a terceira é buscar matéria-prima para mais 50 milhões de doses da AstraZeneca, mas as primeiras negociações sinalizaram que só chegaria no final do ano.