O apoio da indústria do álcool às estratégias de prevenção é contestado por alguns pesquisadores que estudam os malefícios da bebida (Christopher Furlong/Getty Images)
Da Redação
Publicado em 19 de novembro de 2012 às 13h33.
São Paulo - São Paulo recebeu, há duas semanas, um encontro internacional para discutir políticas de controle do consumo abusivo de álcool que reuniu representantes do governo estadual, de universidades brasileiras e estrangeiras e da indústria da bebida. O evento ocorreu logo após a conferência Ações Globais: Iniciativa para Reduzir o Consumo Nocivo de Álcool, em Washington, na qual a indústria do álcool firmou novos compromissos na área de prevenção.
Um dos principais desafios discutidos na reunião foi a necessidade de mudar os padrões de consumo de bebida alcoólica entre os jovens. O crescente abuso do álcool entre mulheres e garotas, situação que demanda estratégias específicas, também foi tópico importante na pauta de discussões.
"Foi a primeira vez que colocamos no mesmo ambiente diferentes atores - governo, ONGs, universidade e indústria - para debater e entender os diferentes ângulos dessa questão", diz o psiquiatra Arthur Guerra, presidente executivo do Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (Cisa). O evento foi organizado pelo Cisa junto com o International Center for Alcohol Policies (Icap), entidade financiada pelos maiores produtores mundiais de álcool.
"A indústria se tornou muito pró-ativa em monitorar sua própria publicidade e no Brasil, particularmente, tem um exemplo forte de mecanismo autorregulatório, que é o Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar)", diz a vice-presidente do Icap, Marjana Martinic.
Em Washington, os cinco compromissos firmados pela indústria do álcool foram reduzir o consumo de bebidas por menores de idade, tornar mais rígidas as regras de marketing, providenciar informações para consumidores, impedir que as pessoas bebam e dirijam e pedir o apoio de quem vende a bebida no varejo. "Existe uma grande diferença entre aqueles que produzem e aqueles que vendem. É preciso ter certeza que eles saibam o que a conduta responsável significa", diz Marjana.
Ela acrescenta que, nos próximos anos, os produtores querem "desempenhar um papel cada vez maior de liderança em providenciar informações para consumidores" e ainda "fazer produtos inovadores de maneira responsável".
O apoio da indústria do álcool às estratégias de prevenção é contestado por alguns pesquisadores que estudam os malefícios da bebida. Recentemente, o assunto veio à tona em audiência pública realizada na sede do Ministério Público do Estado de São Paulo a respeito da proposta de alteração da lei para restringir a publicidade da cerveja.
Na ocasião, o psiquiatra Ronaldo Laranjeira, professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e diretor da Unidade de Pesquisas em Álcool e Drogas (Uniad), lembrou que 6% de todo o consumo de álcool no Brasil é feito por menores de 18 anos e 40% é feito por jovens de 18 a 29 anos, de acordo com levantamento nacional domiciliar. "Não acredito que a Ambev seja um parceiro legítimo para desestimular os jovens a beber. Pergunta se a Ambev daria 6% de seu faturamento para investir em saúde pública?"
Ele também criticou o fato de a indústria financiar programas de educação sobre álcool nas escolas. "Onde se discute a saúde pública, interesses privados não têm lugar. Não podemos cair nessa armadilha."
A psicóloga Ilana Pinsky, também professora da Unifesp e vice-presidente da Associação Brasileira de Estudos em Álcool e outras Drogas (Abead), alertou sobre o papel nocivo da publicidade em incentivar a iniciação precoce ao álcool. "A influência da publicidade é indireta, sutil e cumulativa", diz.