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Incêndios fortalecem debate sobre o valor da Amazônia, dizem especialistas

“Com esse governo, nunca se falou tanto de Amazônia, mas também nunca vi tamanha mobilização", diz Caetano Scannavino

Amazônia (Paulo Amorim/Getty Images)

Amazônia (Paulo Amorim/Getty Images)

Karin Salomão

Karin Salomão

Publicado em 3 de novembro de 2019 às 08h00.

Última atualização em 4 de novembro de 2019 às 17h20.

Alter do Chão (PA) -- O desmatamento crescente e o aumento de incêndios na Amazônia brasileira jogaram a região no centro do debate público, no Brasil e internacionalmente. Para organizações, ativistas e líderes de comunidades locais, o país está em um momento chave para impulsionar as discussões sobre a preservação da região - e mostrar que a floresta vale mais em pé que derrubada.

“Nunca se falou tanto de Amazônia, e também nunca vi tamanha mobilização em torno do tema", diz Caetano Scannavino, do Projeto Saúde e Alegria (PSA), ONG criada na década de 1980 na no Pará, durante o evento Floresta de Valor em Alter do Chão, PA. 

De acordo com ele, é necessário aproveitar o momento para discutir ações de preservação, antes que as atenções nacionais e internacionais se voltem a outros assuntos. "É uma oportunidade para refletir e reunir pessoas e instituições que estavam dispersas, entre ONGs, indígenas, ribeirinhos, quilombolas e assentados", diz. 

Mais do que intensificar o debate sobre a proteção da floresta amazônica, é essencial ampliar o valor da mata de pé, avaliam especialistas ouvidos por EXAME. No entanto, a maior parte das receitas da região vêm de atividades que causam impacto no ambiente.

Cerca de 98% do faturamento vem de pecuária, mineração, produção de soja e extração de madeira. Segundo pesquisas do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), as receitas de produtos florestais não madeireiros representam apenas 0,03% do PIB brasileiro.

Porém, de acordo com o biólogo Ismael Nobre, pós-doutor em estudos sobre a Amazônia pela Unicamp, o crescimento do PIB da Amazônia não está relacionado ao desmatamento. O açaí, uma das maiores produções da região, gera oito vezes mais receitas por hectare que a produção de soja. Já a produção de cacau vale cerca de sete vezes mais por área que a pecuária, diz ele. Por isso, ele acredita que é essencial desenvolver a economia da região e aumentar o valor das produções locais.

Valorizar a origem

Uma das maneiras de valorizar os produtos é a criação de um selo de origem. Assim como o champanhe designa apenas espumantes produzidos numa região da França e o presunto de parma se refere ao que é fabricado em uma cidade na Itália, o objetivo é dar o mesmo tratamento a produtos amazônicos. "A marca mais conhecida fora do Brasil é a Amazônia", diz Tasso Azevedo, engenheiro florestal e conselheiro do Imaflora e do Origens Brasil.

O selo Origens Brasil, um dos projetos do instituto, foi criado em 2016 para ligar empresas a produtores locais e instituições sociais. Fortalece a cadeia de produtos como a castanha-do-Pará, semente de cumaru, borracha natural, óleo de copaíba e de andiroba e artesanatos.

O projeto reúne mais de 1.500 produtores de 36 etnias, 40 organizações de apoio e organizações comunitárias e 15 empresas-membro, como Wickbold, Lush, Mercur e Pão de Açúcar. Entre as empresas se preparando para entrar na rede estão Natura, Osklen e Mercado Livre. Desde sua criação, já transacionou 5 milhões de reais - 2 milhões de reais apenas este ano. Por meio de um código QR impresso na embalagem, o consumidor consegue ter acesso a informações sobre o artesão ou comunidade responsável pelo item. 

Pimentas requisitadas

Um exemplo de item com selo de origem é a venda da pimenta em pó Baniwa, originária do povo Baniwa que vive na região do Rio Negro, AM, na fronteira do Brasil com a Colômbia e Venezuela.

De acordo com André Baniwa, líder indígena e empreendedor, a pimenta é um produto tradicional do seu povo e há quase 80 variedades diferentes mapeadas. O ingrediente é visto como um item de proteção e é manejado principalmente por mulheres. Há várias maneiras de preparar ou consumir a pimenta, mas o pó é a forma tradicional de troca, pela facilidade de conservação e transporte. 

Pimenta Baniwa, produzida por comunidades indígenas no Amazonas e vendida através do selo Origens Brasil (Karin Salomão/Exame)

Por isso, a região formalizou a produção da pimenta em pó e vende potes do tempero para cerca de 40 distribuidores em Manaus, São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, disponíveis inclusive em lojas da varejista de temperos Bombay Herbs & Spices. A receita adaptada leva 10% de sal, para deixar o pó mais pesado e impedir que voe - para os olhos ou nariz - assim que o frasco é aberto.

Para Baniwa, "quando alguém compra uma pimenta, ajuda a superar a imagem negativa que ser indígena tem no Brasil".

Exame viajou a Alter do Chão, PA, a convite do Imaflora.

André Baniwa, líder indígena e empreendedor (Karin Salomão/Exame)

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